segunda-feira, março 27, 2017

IR AOS COPOS OU TOMAR UMA BEBIDA?

Na primeira variante e a mais banal, já sabemos que se trata de ir beber o normal copo de vinho ou qualquer outra bebida alcoólica em recipiente idêntico; na segunda, a mais elegante, vai-se ingerir qualquer outra bebida, alcoólica ou não, quer seja num copo ou em cálice.

O caso da falta de educação, ou boas maneiras, do presidente do Eurogrupo (ministro das Finanças na Holanda), Jeroen Dijsselbloem, foi muito discutido na semana passada. O sul da Europa não achou graça nenhuma ao comentário desastrado daquele senhor, numa entrevista concedida ao quotidiano alemão Frankfurter Allgemein Zeitung. Vejamos o que afirmou:
Durante a crise do euro, os países do Norte demonstraram solidariedade para com os países mais atingidos. Como social-democrata, dou muita importância à solidariedade, mas também há obrigações: não se pode gastar todo o dinheiro em álcool e mulheres e, depois, pedir ajuda. Este princípio é válido a nível pessoal, local, nacional e até a nível europeu.”

Uma belíssima ocasião para estar calado, como imediatamente comentou Matteo Renzi, exigindo a sua demissão da presidência do Eurogrupo. O nosso Primeiro-ministro exigiu o mesmo, assim como houve protestos de políticos espanhóis, mas o homem entende que é indispensável.

Face à indignação dos países visados, recusou-se a pedir desculpa. “Não, certamente que não. Referia-me a todos os países do Eurogrupo que pedem ajudas e não a qualquer país em particular. Lamento se alguém se sentiu ofendido com as minhas observações”.
Tentou ignorar que se referia, sobretudo, aos países do Sul da Europa e o que disse era aquilo que, na sua confirmada arrogância, sentia verdadeiramente.

Uma observação: Traduzir “gastar todo o dinheiro em copos e mulheres”, como pudemos ouvir nas notícias televisivas e alguns jornais escreveram, confesso que me soou mal. Aqueles “copos” ali expressos pareceu-me mais linguagem de taberna do que uma tradução mais cuidada. Mas continuemos.

Os despropósitos de Dijsselbloem já são conhecidos e têm causado problemas. Porém, continua impertérrito pela sua estrada sem tentar corrigir esta qualidade de trapalhão e mentiroso.
Asseriu que tinha o mestrado em Business Economics da Universidade de Cork, na Irlanda. Uma mentira descarada, pois um mestrado desta natureza não existe naquela universidade.
Jeroen Dijsselbloem esteve apenas dois meses na Irlanda para estudar “Food Business”, que é um curso, não um mestrado.

Tem uma forte ligação com a Alemanha, a qual sempre o apoiou e encorajou a proclamar o rigor orçamental: “A austeridade não é a causa do crescimento débil, mas são necessários orçamentos em ordem”.

O mais interessante, porém, na qualidade de Presidente do Eurogrupo, declarou guerra às multinacionais que eludem o fisco; como Ministro das Finanças holandesas, “competiu com outros países europeus a fim de proporcionar as melhores condições às multinacionais que desejam poupar nas questões fiscais”. E viva a coerência!

Mas o sentido da palavra coerência não é para aqui chamado. É a esperteza destes senhores que driblam, por vezes descaradamente, quaisquer normas ou princípios, sempre que o interesse próprio, do grupo ou país a que pertencem estejam em jogo.

segunda-feira, março 20, 2017

UMA SENTENÇA QUE CRIMINALIZA A FILATELIA

Coleccionam-se selos, possuem-se colecções temáticas ou gerais de um certo valor e de grande interesse. Enfim, a paixão pela coleccionação de selos abrange milhões de pessoas. Na Itália, por exemplo, o valor das transacções comerciais filatélicas anda à volta de 120 milhões de euros por ano.

No dia 18/03/2017, o jornal La Stampa informou que a um comerciante filatélico dos arrabaldes de Turim “foi sequestrada a inteira provisão de correspondência em depósito”.
“Os carabineiros do Núcleo Tutela Património Cultural devem identificar os documentos, um por um, e estabelecer em qual arquivo colocá-los”.
Qual a razão?

Numa sentença do tribunal de Turim, o Sr. Dr. Juiz Roberto Arata, baseado no Decreto-lei que, grosso modo, estabelece o princípio que os documentos endereçados a uma qualquer entidade pública, incluindo entidades eclesiásticas, são bens culturais inalienáveis. Logo, os envelopes devidamente selados, desde 1840, e dentro dos quais esses documentos viajaram, embora descartáveis e atirados para o cesto dos papéis destinados ao lixo, permanecem inalienáveis

Precisamente para melhor esclarecer esta abstrusidade, um ministro dos Bens Culturais, com uma circular da Direcção-geral para os arquivos, esclarecia que os envelopes, contrariamente aos documentos que encerravam, não podem ser considerados documentos merecedores de tutela.

O tribunal de Turim, porém, mandou para as urtigas esta interpretação e defendeu que tudo o que é posto de lado, ou melhor, deitado fora, tem de ser destruído imediatamente; não o sendo, mas colocado igualmente no cesto do lixo, é sempre um bem público.
Pergunta-se: Neste caso, é um bem público porque os selos foram valorizados?
Se não valessem nada e os envelopes tivessem sido recolhidos apenas por atracção das figurinhas aí coladas, o Sr. Dr. Juiz dar-lhes-ia a mesma atenção, ordenando o sequestro? Acho que são perguntas aceitáveis.

Certamente que existem documentos necessariamente conservados nos envelopes de origem e estes sobrescritos, como é óbvio, têm a mesma oficialidade que os documentos que encerram. Todavia, se estes mesmos envelopes merecerem a atenção da justiça, devem existir provas que são objecto de um furto.

Conselho (irónico?) do jornal La Repubblica: “Restituí os selos ao Estado, se o envelope onde estão colados era dirigido a uma entidade pública”.
Quantas colecções, organizadas em boa-fé com paciência, paixão e altos investimentos, seriam lesadas? O Estado, em tais situações, não se sentiria um larápio do coleccionador desinformado deste autêntico disparate ou ambiguamente informado?
O bom senso tem muita dificuldade a compreender estas e outras situações similares. As perplexidades aumentam, perante uma sentença deste género.  

Transcrevo o que o senador Carlo Giovanardi, apaixonado filatelista, declarou sobre este facto:
“Uma burocracia obtusa e arrogante, juntamente com intervenções abruptas da Magistratura, restringem, vergonhosamente, os espaços de liberdade no nosso País, mesmo as que dizem respeito às mais inocentes paixões de milhões de cidadãos coleccionadores. Peço ao Ministro Franceschini (Ministro dos Bens e Actividades Culturais e de Turismo) que intervenha com urgência, a fim de evitar perquisições, sequestros e procedimentos penais aos quais, baseados na sentença de Turim, pode estar exposta qualquer pessoa que possua uma colecção da história postal”.
Perfeitamente de acordo, senador Giovanardi.

segunda-feira, março 13, 2017

CASOS DA SEMANA

Através do que lemos e o que as notícias audiovisuais nos vão transmitindo, o conhecimento dos eventos diários, como de norma, avoluma-se: uns de características normais; outros que escapam à normalidade.

Olho para a Turquia e, mais uma vez, avalio com antipatia e uma certa repulsa a actividade política, nacional e internacional, do seu presidente, Recep Erdogan.
Aspirante a presidente incontestado de uma nova espécie de sultanado, não se conforma nem aceita os obstáculos que se interpõem às suas ambições totalitárias. Porém, esqueceu-se que não lhe é permitido interferir, sobretudo com sobranceria, nos países europeus, apesar de aqui residirem cerca de cinco milhões e meio de cidadãos turcos.

O Sr. Erdogan convocou um referendo para o próximo 16 de Abril cujo “sim” reforçará os poderes presidenciais. Obviamente, quer que a comunidade turca na Europa vote a favor, portanto, enviou ministros para comícios eleitorais onde essas comunidades são maiores. Alemanha, Áustria, Suíça e Holanda não os permitiram, “por questões de segurança”.

 O ministro dos Negócios Estrangeiros turco, Cavusoglu, todavia, decidiu ir a Roterdão, apesar de proibição do comício pelo Governo holandês. Com arrogância, advertiu: “Se não me permitirem aterrar, as sanções contra a Holanda serão duras”.
Mas a aterragem do voo de Estado do Ministro Cavusoglu não foi permitida.
De Ancara, a reacção do presidente Erdogan foi imediata. Além de proferir ameaças, classificou os holandeses como “resíduos nazis e fascistas”, acrescentando: “Agora não se pode considerar a Holanda como um aliado”.

Normalmente, certos atritos ou incompreensões entre países procuram resolver-se através das normas diplomáticas, o que é sempre aconselhável. Tais normas, porém, tornam-se difíceis ou nulas, quando predomina a arrogância. Mas Erdogan, com certeza, nunca aprendeu que a soberania de um outro Estado deve ser, sempre, respeitada.
Mas deixemos a arrogância de estadistas desprovidos de inteligência crítica e passemos a temas que enternecem.

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“Cão regressa ao canil com uma carta de recomendação da menina que tanto o tinha amado” – título da história, verdadeira.

Um bóxer de três anos, em Setembro passado foi adoptado por uma família com quatro filhos ainda crianças. Decorridos alguns meses, o cão, a quem deram o nome de Rhino, regressou ao refúgio (Humane Sociaety of Utah). Como motivo da restituição, o cão era demasiado barulhento para os filhos pequenos.

Para a filha mais novinha, todavia, não foi uma decisão fácil de aceitar. Junto com Rhino, a menina entregou um pequeno caderno de molas. Ficaram surpreendidos, mas a surpresa foi ainda maior quando leram a carta que a menina ali escrevera:
Olá, se estás a ler isto, ficas a saber que é necessário encontrar uma nova casa ao Rhino, imediatamente. Foi o meu cachorro. Espero, sinceramente, que encontre um bom sítio onde estar. Sentirei tantíssimo a sua falta. Queria que soubesses que é verdadeiramente um bonito cachorro”.

A carta continuava, dando uma série de instruções e conselhos para os novos patrões: “Diz-lhes que devem fazê-lo correr pelo menos duas ou três vezes por dia; dar-lhe banho uma vez por mês; dar-lhe um monte de atenção.
Rhino é um cachorro muito inteligente. Ele ama as pessoas, mas odeia as cerimónias. Se começar a ladrar como um tolo, então deves só armar-te de tanta paciência”. Gosta de dormir debaixo das cobertas”. Não lhe mudes o nome. Ele chama-se Rhino Lightning….
Rhino é um sonho às tiras. As suas bochechas fazem um saco de baba. Peço-te para lhe dizeres que o amo e que me faltará todas as noites”

Rhino ficou no canil apenas uma semana. Passado este tempo, foi adoptado por outra família, a qual levou o boxer e o caderno com todas as recomendações da menina que teve de o ceder. A mesma família procura respeitar todas essas recomendações e conselhos e manteve o nome Rhino. Acharam a carta da menina verdadeiramente encantadora.

segunda-feira, março 06, 2017

PRECONCEITOS OU ESCASSEZ DE MASSA CINZENTA?

Aliás, se os preconceitos permanecem, embora a evolução dos tempos ilumine e transforme certas posições sociais atávicas, significa pouca inteligência ou um atraso lamentável sob o ponto de vista educativo e intelectual.
Vem isto a propósito do comentário de um eurodeputado polaco sobre a “inferioridade das mulheres”. O caso foi amplamente noticiado e as palavras deste indivíduo ecoaram em toda a Europa.
Nada de anormal, tratando-se do mesmo sujeito que define os imigrados como “estrume humano que não têm vontade de trabalhar”; mais, querendo absolver o seu herói do passado, afirma que “Hitler não tinha conhecimento do Holocausto”.   

Mas voltando ao que exprimiu, um jornal italiano classificou esse comentário como “palavras delirantes”. E se entramos no domínio do delírio, que mais poderemos dizer?
Ainda podemos dizer muito. Serão palavras delirantes, mas retratam uma maneira de pensar muito comum nos tempos actuais.

Então, delirantemente, diz o Sr. Eurodeputado polaco, Janusz Korwin-Mikke:
É justo que as mulheres ganhem menos do que os homens: porque são mais débeis, mais pequenas e menos inteligentes”.
Pobres mulheres! Débeis, pequenas e pouco inteligentes! E como mulher pouco inteligente, pergunto-me: aonde iremos parar?

Dando livre saída aos meus instintos – portanto, não refreados – iria parar ao Parlamento Europeu, aproximar-me-ia do Janusz Korwin-Mikke e pespegar-lhe-ia um sonoro par de bofetadas.
Nada de violências, ademais tratando-se de uma débil mulher. Somente uma demonstração pública do género, que inferior não é, não tolera que imbecis como este representem, no Parlamento Europeu, um qualquer país-membro da União.

A Polónia deveria envergonhar-se de ser representada por cidadãos eivados de prejulgamentos inadmissíveis em qualquer país civilizado. Ou será que o fundamentalismo religioso revigora os costumes tradicionais, portanto, nada de condenável em tais modos de pensar? Não creio. Aqui trata-se de pura estupidez individual.

Deveriam ponderar bem - polacos e demais europeus - quem devem eleger para aquela instituição. Não somente demonstrariam respeito pela União Europeia como, de consequência, os eleitos, digna e competentemente, melhor saberiam representar e defender, no Parlamento Europeu, os interesses da União e do próprio país.

Nota-se, porém, e não é caso raro, que ser proposto como candidato ao Parlamento Europeu, por vezes significa um prémio ou uma espécie de reparação política. Recordo, nos famigerados tempos de Berlusconi, que este fez eleger, como eurodeputada, uma conhecida cançonetista cuja preparação e competência políticas eram próximas do zero.
Também, frequentemente, vários eurodeputados distinguem-se pelas raras viagens a Bruxelas. Aplausos, todavia, a quem é eleito e ocupa o seu cargo de eurodeputado com consciência, interesse e competência; penso que estes constituam a maioria.