segunda-feira, abril 25, 2016

UM PROFESSOR
QUE É EFECTIVAMENTE UM ANJO

O professor Saber Hosseini a distribuir livros ás crianças afegãs

Estamos no Afeganistão e falamos de um professor do primeiro ciclo que lecciona numa escola da cidade de Bamiyan, a famosa cidade das estátuas dos Budas gigantes que os fundamentalistas Talibãs destruíram, em Março de 2001.

O jornalista Massimo Gramellini, vice-director do jornal “La Stampa”, fez referência à história belíssima deste professor afegão, cujo nome é Saber Hosseini, asseverando que “é claramente um anjo”. Concordo plenamente.

Fui em busca de mais informações (bservers.france24.com/04/14/2016). Neste endereço, é o próprio Saber Hosseini que narra a concretização do projecto que ideou e que pôs em prática há cerca de seis meses. Procurarei resumir o que ele descreve.

Aos sábados e domingos, os seus dias livres, montado numa bicicleta, inicia a viagem por caminhos ásperos, quase intransitáveis naquela zona afegã, a fim de distribuir livros de histórias às crianças das aldeias mais remotas, isoladas e com dificuldades de acesso à instrução.
De passagem pelas aldeias, distribui livros e recolhe os que já foram lidos, a fim de os repartir pelas crianças da aldeia seguinte.

Conseguiu recrutar voluntários e, presentemente, são vinte a actuar nesta admirável missão. Embora com poucos meios disponíveis, coleccionaram cerca de 6000 livros, alguns fruto de doações de quem aplaude e encoraja a iniciativa.
Muitos destes livros são importados do Irão, visto que no próprio país as publicações são muito limitadas. Para os adquirir, é necessário viajar até à fronteira com o Irão.

De início, escolhia livros muito simples, mas actualmente a maior parte das crianças mais velhas já são capazes de lerem obras mais sérias. Obtiveram versões simplificadas de livros de Victor Hugo, Jack London, Antoine de Saint-Exupéry, Samad Behrangi (escritor iraniano), Fertdowsi (poeta iraniano).

É interessante a explicação que fornece para a necessidade de usar a bicicleta como único meio de locomoção, ademais sobrecarregado com os pacotes de livros.
“Usamos a bicicleta por várias razões: primeiro, porque não temos dinheiro para um carro. Segundo, porque somente em bicicleta é possível ter acesso a algumas aldeias. Por último, torna-se um pouco simbólica: por vezes, os Talibãs usavam bicicletas nos seus ataques à bomba. Assim, a mensagem que eu desejo transmitir é que nós podemos substituir esta violência pela cultura”.

Este professor muito humano e corajoso, juntamente com os voluntários que o auxiliam, tem sido alvo de ameaças pelo telefone: homens que lhe intimam a distribuir apenas livros islâmicos, de contrário sofrerá as devidas consequências.   
A esposa de Saber Hosseini, também professora, ajudava o marido neste projecto. Teve de abandonar a escola onde leccionava, a longa distância, pois um aluno avisou-a que alguns dos seus familiares, os quais estavam ligados aos Talibãs, tinham planeado assassiná-la.

É esta violência que Saber Hosseini combate com aquelas armas que, no tempo, acredita serem eficazes. Não se limita a distribuir livros. Tenta dialogar com as crianças sobre determinados tópicos: fala-lhes da “importância da paz, do perigo das drogas, da necessidade de tolerância entre pessoas com credos e culturas diferentes”.

A propósito destes diálogos, conta um facto interessante.
Numa aldeia, falando com as crianças sobre armas, insistiu no princípio: “Diz não às armas e sim aos livros”. Quando de novo visitou a mesma aldeia, as crianças tinham recolhido todos os brinquedos de plástico que imitavam armas e entregaram-nas ao professor Hosseini, pondo uma condição: a sua aldeia deveria estar em primeiro lugar na próxima distribuição de livros, para que fossem eles os primeiros a obter a primeira selecção.
“Foi o momento mais alegre da minha vida”- confessa o professor Saber Hosseini.

Tudo isto é uma história linda que todos deviam conhecer. É um exemplo esplêndido de vidas privadas de aridez e riquíssimas de humanidade; de indiferença pelos sacrifícios e riscos que enfrentam para dedicar-se a causas de grande nobreza. Houvesse tantos Saber Hosseini, sobretudo onde se impõem uma enorme força de ânimo e uma persistente coragem.

segunda-feira, abril 18, 2016

POR QUE ESCREVO? EXPLICO

Hã dias perguntaram-me por que razão eu continuo a escrever regularmente neste blogue. Onde encontro tanta paciência. Paciência?!
Explicando-me metaforicamente, digamos que eu não escrevo, mas, como já várias vezes disse, gosto de “conversar com o computador”… e quem não gosta de conversar?

Visto que a leitura, desde criança, sempre foi o meu maior entretenimento; visto que sempre alimentei interesse pelo que decorre e sucede no país e no mundo, nunca faltam temas que capturem a atenção. Logo, serão eventos que, no dia-a-dia, me surpreendem, me desagradam, me indignam, que me provocam satisfação, alegria ou profunda tristeza. É sobre tudo isto que gosto de conversar, escrevendo.

Explodiu o caso mundial dos “Documentos do Panamá”, os tais “Panamá Papers” - abençoado “Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação”, tipo de jornalismo que mais aprecio.
De novo surgiu, em todo o seu esplendor, algo que já conhecemos de há longo tempo e, nesta explosão de notícias, foi bem recalcado que não é ilegal, entenda-se bem isto!...
 Este algo traduz-se por refúgio em paraísos fiscais e offshores de capitais de elite, de grandes empresas, das multinacionais, além da lavagem do que é o fruto da criminalidade organizada, e não só.

Certamente que, em certos aspectos, não serão ilegais, mas são indecentes, altamente incorrectos, traidores dos países a quem sonegam impostos, os quais deverão ser pagos pelos demais cidadãos com rendimentos modestos e por aqueles que nada querem esconder nos paraísos fiscais. Não hesito em dizer que considero essas “legalidades” simplesmente abjectas.

Relativamente ao panorama fiscal, é já um lugar-comum, mas verdadeiro, que onde todos pagam, todos pagam menos e o Estado progride.
Nas proporções correctas, adequadas e objectivas a que devem submeter os seus rendimentos, seria excelente se a totalidade dos cidadãos fizesse disto um ponto de honra, um preceito irrenunciável.

Nos Documentos do Panamá, o mais chocante é a constatação que, naqueles milhares de documentos, não falta nenhum exemplar relevante das mais diversas camadas sociais. Entre os multimilionários que estacionam os seus haveres em paraísos fiscais, há de tudo e em todos os continentes. Asqueroso!

Há quantos anos leio que se deve encetar luta contra tais paraísos! Mas estes bons propósitos são já patéticos. Belos discursos, mas sabem antecipadamente que apenas os dirigem à plateia. Os actores políticos vociferam, esbracejam, e o teatro prossegue. Frequentemente, não conseguem ir além de insultos recíprocos ao respectivo adversário: campanha eleitoral ad infinitum, mas de fachada.

O pior, todavia, é que a política prostrou-se aos pés da finança e da tão citada economia de mercado. Ninguém, impoluto e num regime seriamente democrático, envida esforços para regulamentar um fenómeno que só contribui para o regresso das economias nacionais e a desesperante situação de desemprego que não se atenua.   
  
Nos órgãos de informação é um fenómeno denunciado e amplamente argumentado; a política, nas assembleias onde todos os problemas graves devem ser debatidos com paixão e seriedade, ilude esses problemas, e não saímos disto.
Esperemos que o “Panamá Papers” dê o abanão que todos desejamos àquelas instituições internacionais idóneas para enfrentar e regulamentar, com determinação, esta indecência de Ilhas Virgens – virgens de vergonha e escrúpulos – e demais paraísos deste jaez.

segunda-feira, abril 11, 2016

MAIS UMA VEZ, A “MINHA” CIDADE DE TURIM

Museu Egípcio de Turim. Fila de visitantes - foto de La Stampa, 02/04/2016
     
Chamo-lhe minha, pois o meu grande afecto por aquela esplêndida cidade, Capital do Piemonte, jamais esmoreceu. Sendo assim, quaisquer notícias que a apresentem como actor de relevo, ou mesmo irrelevante, merecem-me o máximo interesse e total atenção.

Mas a boa nova é efectivamente de grande relevância. E eis a razão: concorreu para a classificação de “European Capital of Innovation Award  e ganhou.
A divisa que Turim adoptou, na apresentação da sua candidatura, retrata com objectividade o que é Turim: “O lugar onde as ideias ganham vida”.

Participaram trinta e seis cidades europeias. Na primeira selecção avultaram nove: Amesterdão, Turim, Paris, Berlim, Eindhoven, Glasgow, Milão, Oxford e Viena.
Por último, ficaram três vencedores e na seguinte ordem:
Em 1.º lugar, Amesterdão; em 2.º, Turim; em 3.º lugar, Paris.
Este foi o anúncio da Comissão Europeia, no dia 08 deste mês, sobre os vencedores da “Capital Europeia de Inovação 2016” (Capital Awards).

Ser a segunda Capital europeia da inovação, num painel que compreende metrópoles como Paris, Berlim e Amesterdão, é um resultado extraordinário que premeia a nossa cidade pela sua capacidade de ser ponto de referência, num ecossistema que vê empresas, universidade, centros de investigação e instituições culturais que apostam na inovação…” – Assim se exprimiu Piero Fassino, presidente da Câmara de Turim.

E viva Turim! Só permitiu a Amesterdão que lhe passasse à frente, e com pequena margem, segundo dizem. Todavia, um segundo lugar, num prémio deste género, é já um testemunho de grande distinção. Tem muita razão Piero Fassino.

Ser-me-ia também de grande alegria tomar conhecimento da participação da nossa Capital do Norte, a cidade do Porto, e vê-la nas últimas nove seleccionadas. Seria pedir muito? Não. Força, Porto, e inova, pois tens capacidades para caminhar, expulsar opacidades e engendrar ideias que tomem vida.

****
 Por último, quero ainda acenar, e pondo em evidência, o segundo museu do mundo, depois do museu do Cairo: o bicentenário Museu Egípcio de Turim. Esteve em obras, a fim de aumentar as instalações, com orçamento autofinanciado.

Está classificado como um dos dez museus italianos mais visitados. E muito mais haverá que dizer sobre este prestigiado e riquíssimo museu.  

terça-feira, abril 05, 2016

COMUNICAÇÃO SOCIAL INDIGESTA

Há dias, no quotidiano Público, li com redobrada atenção o editorial “A comunicação social, ela que…” de Fernando d’Oliveira Neves, Embaixador reformado. Veio ao encontro do que eu pensava há longo tempo. Digo também que é um editorial cuja leitura é recomendável.

Diz o Senhor Embaixador reformado: “Uma comunicação social que em geral peca por transmitir maioritariamente uma provinciana ideia deprimente de um Portugal decadente, desordenado, inapto, reles, em constante declínio…”
A auto-estima, nos portugueses, é moeda rara. Dir-se-ia que se crê elegante depreciar o que concerne o país natal. E com qual presunção asseveram que “lá fora”, sim, tudo é superior.
Está-se “lá fora” e verifica-se o quanto esta abençoada terra “à beira-mar plantada” vale e quantas potencialidades estes pedantes críticos não sabem descobrir, fazer emergir, ampliar e contribuir para o progresso do seu país.
  
O autor do artigo não omite o que se passa na TV, “Com telejornais longuíssimos assentes em notícias deletérias onde se insiste na mesma notícia mais de meia hora…”
Deletérias ou não deletérias, por vezes são de uma banalidade exasperante que até um normal tablóide evitaria conceder-lhe grande espaço. Mas nos noticiários televisivos insiste-se no acontecimento, e que jamais falte o testemunho dos populares que assistiram ao caso - aqui, o vocábulo “populares”, se me permitem esta aposição, funciona como substantivo, muito popular nos autóctones da “língua padrão”.
Os minutos decorrem lentíssimos, repisando a mesma notícia; o interesse pela informação dissipa-se.

A propósito, se acontecesse algo na zona de elite em Cascais, ou qualquer outra localidade idêntica, referindo-se aos presentes, os nossos pivôs ou correspondentes televisivos continuariam a usar o termo populares (gente do povo, obviamente) ou, pelo contrário, citá-los-iam como “as pessoas, os senhores/senhoras” que presenciaram o evento? Teríamos de registar um hábito que propende para a diferenciação de classes? Evito pensar nisso.

Outro aspecto que me irrita nos telejornais, sobretudo nas horas de ponta, é o valor e amplitude dedicados ao majestoso futebol.  
Frequentemente, abre as notícias, pois entendem que é tema de primária importância para os cidadãos portugueses. Para todos os portugueses? Mentalidades estreitas, quem concebe tal princípio.
A esfera futebolística é interessante, indubitavelmente, mas reservem-na para as páginas desportivas e dêem primazia às comunicações que informam e educam a sociedade portuguesa: jovem e menos jovem.
Quem não é informado é um perene habitante do mundo da ignorância, e a isto se deve o atraso de um país.

Por último, e sempre no âmbito informativo, sente-se que a equidistância é qualidade ausente de quem deveria cultivá-la com persistência e intransigência. Nota-se esta falha, grave, na comunicação televisiva, a única e predilecta da maior parte dos telespectadores; inadmissível, portanto, em profissionais da comunicação. Aliás, o Senhor ex-Embaixador Oliveira Neves vergasta, sem eufemismos, este aspecto do assunto.

Acrescento que, mesmo em artigos de opinião expressos por personagens com uma certa espessura intelectual ou profissional, entendo que a objectividade é sempre um factor de enriquecimento para quem lê. O contrário conduz a distorções da realidade, e não formam nem informam ninguém.