domingo, outubro 29, 2006

MIGUEL SOUSA TAVARES
PASQUINADAS NA BLOGOSFERA


No Renascimento, os restos de uma estátua (um grupo marmóreo), colocada perto do palácio Braschi, em Roma, tornou-se famosa com o nome popular de Pasquino.
No dorso da estátua, nasceu o costume de aplicar cartazes com versos em latim e em italiano popular, geralmente de pessoas anónimas. Com o passar dos tempos, passou-se à prosa satírica, à denúncia da corrupção e de todos os males que afligiam a sociedade romana: pasquinadas - célebres as de Pietro Aretino.
Nessas sátiras, às vezes violentas e ofensivas, não se poupava ninguém: papas, cardeais, personagens políticas. Era o único meio de expressão “democrático”!
O género começou a declinar, até à extinção completa, com o desaparecimento do poder temporal dos papas.

As pasquinadas originais tinham uma razão de ser, dado que a democracia era palavra inaplicável aos regimes absolutos da época, embora também imperassem, nesses pasquins, as aleivosias privadas.

Viremo-nos para os nossos tempos.
Eleger-se a blogosfera como o moderno Pasquino, mas no pior sentido, ou se trata de pessoas doentes ou dotadas de um forte sentimento de velhacaria.

Explodiu o caso Miguel Sousa Tavares. O que mais me surpreendeu foi o poder do rastilho que activou a explosão!
Criam-se, por dia, talvez centenas de blogues em língua portuguesa; o tal blogue, ad hoc, surgiu na sexta-feira, dia 20 / 10 / 2006. Só pergunto: que tantã portentoso foi esse que ecoou imediatamente em todo o País, dando lugar a que, no dia seguinte, se falasse nos jornais, se conhecesse o blogue e ali convergisse uma chusma de comentadores, em grande maioria também anónimos? Como actuaram, e que ajudas encontraram os autores, ou autor, para a instantânea popularidade desse blogue? Um caso muito estranho!

Que género de espectáculo nos proporcionou? Dois géneros: o miserável e o mesquinho.

Miserável, porque lançaram uma acusa grave, usando o anonimato. Não existe atitude mais vil do que essa, sobretudo quando se enlameia a reputação de quem quer que seja.
Se entendiam que tinham razão, davam a cara, identificavam-se. Não o tendo feito, só merecem desprezo.
Ademais, na denúncia que propalaram, não se vislumbra qualquer aspecto de plágio que mereça crédito; menos ainda um tão barulhento sensacionalismo.

Pode haver tentações de plagiar frases ou trechos literariamente belos (sempre condenáveis, obviamente); ninguém se perde a copiar descrições banalíssimas, corriqueiras e ao alcance do mais modesto escrevinhador. Não penso, aliás, que Miguel Sousa Tavares tivesse disso necessidade.

Mesquinho, porque as centenas de comentadores que afluíram nesse blogue - salvo uma minoria que se atreveu a remar contra a maré e se exprimiu com equilíbrio - dão um real testemunho de quanto é penosa e rasteira a educação, a formação cultural da maioria dessas pessoas.
Alda M. Maia

sábado, outubro 21, 2006

DROGA E IGNORÂNCIA

A notícia chegou cá, provinda da Itália. Na última página do Público, dia 11 deste mês, aparece um título a toda a largura da página: "Proibido programa de TV segundo o qual um em cada três deputados italianos consome droga”.

A Autoridade que protege a privacidade das pessoas fez muito bem em o proibir: não pela denúncia do facto, mas pelo modo como obtiveram as provas.

Um jornalista e uma encarregada da maquilhagem improvisaram entrevistas, a cinquenta deputados, acerca do Orçamento do Estado. A meio da entrevista, a maquilhadora “apercebia-se” que o “onorevole deputato” tinha a testa brilhante e limpava-a com um lenço especial (drug wipe). Pelo suor, detectava-se quem fizera uso de drogas nas últimas trinta e seis horas. Efectuaram as análises e, em 32% dos deputados, deu positivo: em 12 pessoas, acusou cannabis; em oito, cocaína.
Embora ressalvando o nome dos deputados que caíram na armadilha, o método foi incorrecto.

A maior parte dos italianos indignou-se com esta proibição da Autoridade: “O povo deveria conhecer o nome desses parlamentares”: o queixume mais corrente.
Esta é uma indignação que me parece bastante hipócrita. Nunca vi o mesmo zelo em relação aos membros do Parlamento que elegeram, que são “onorevoli” (tratamento reservado aos parlamentares, sobretudo da Câmara Baixa), mas com sérios problemas judiciários: o número é relativamente elevado.

Eis um caso elucidativo e, quanto a mim, absolutamente indecente: Cesare Previti - advogado, conselheiro e amigo de Berlusconi, já ministro da defesa, deputado – foi condenado a seis anos de prisão e interdição perpétua de cargos públicos - sentença definitiva, há cerca de cinco meses, depois de ter percorrido todos os graus de juízo. Com o recente indulto, a pena foi reduzida a metade. Como benefício de uma das várias leis ad personam do governo Berlusconi, descontá-la-á em casa.
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"Cesare Previti, condenado definitivamente há uns meses, é ainda deputado, recebe mensalmente os respectivos emolumentos que nós, cidadãos, lhe pagamos" (Corrado Augias - "La Repubblica", 14 de Outubro 2006).
Nestes últimos dias, está em curso o processo de “decadência do mandato”! Opinam, todavia, que não é certa a inegibilidade.
Se este indivíduo albergasse um mínimo de decência, ter-se-ia demitido já há muito tempo. Melhor ainda, nunca consentiria em fazer parte da lista eleitoral de “Força Itália” enquanto o processo, onde era imputado por corrupção, não obtivesse a sentença final. É lícito pensar que o parlamento, para certas pessoas dadas à política, funciona como uma espécie de valhacouto.
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A IGNORÂNCIA DE ALGUNS PARLAMENTARES

O programa “As Hienas” não pôde fazer uso do material registado, a propósito dos parlamentares que fazem uso de drogas; não lhes foi vetado, todavia, apresentar uma reportagem – aliás, correcta - com entrevistas onde se verifica a ignorância de vários “onorevoli”.
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Este é um dos frutos da última reforma da lei eleitoral italiana: quando escolheram os candidatos, os partidos, todos os partidos, não desperdiçaram tempo em selecções conscienciosas, de qualidade.
Não é que nós, aqui na Casa Lusitana, possamos deitar foguetes: seja quanto às escolhas efectuadas pelos partidos; seja pelas votações dos eleitores. Mas continuemos.

Ao ler as “pérolas do conhecimento” que os entrevistados iam exibindo, não sabemos se rir se indignarmo-nos perante aqueles “representantes do povo” tão ignorantes.

Perguntas sobre Nelson Mandela. Resposta: “É um presidente sul-americano… do Brasil… Ah sim, é da África do Sul … foi um “capsus.” (Quem assim respondeu é um médico!)
Sobre a profissão de Mandela, houve quem asserisse que é um economista. Outros não sabiam a razão por que Mandela recebeu o prémio Nobel. Uma senhora deputada mastigou em seco: “Há diversas opiniões sobre Mandela"… Bateu em retirada, dizendo que tinha de ir votar.

As perguntas sobre a tragédia do Darfur provocaram respostas hilariantes! Alguns não sabiam onde se localiza o Darfur; outros que o Darfur tinha que ver com a questão do Líbano!
Um respondeu que era “Uma moda não italiana, nós somos o povo do estilo, do bem comer. Darfur são coisas feitas à pressa”. Oh valha-nos Deus!

Guantánamo? “Bem, é uma prisão”. Situada onde? “No Afanistão (sic)… No Iraque". Perante a surpresa do entrevistador, corrigiu: Ah! sim, é no Afanistão”.
E como estas, muitas outras demonstrações de "onorevole" ignorância.

Estes assalariados da política alguma vez leram os jornais? Ou prestaram atenção aos noticiários? Ou, pelo menos, conversaram com alguém que os pusesse ao corrente do que se passa por este nosso mundo?!
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Não se poderia, na TV portuguesa, criar um género de programa tipo “As Hienas”? Apresentar umas reportagens parecidas, onde pudéssemos, nós também, avaliar o grau de cultura dos nossos representantes na Assembleia da República?
Pelas calinadas de português que se vai ouvindo!...
Alda M. Maia

segunda-feira, outubro 16, 2006

"O GRANDE PROBLEMA DE ITÁLIA"...
E NOSSO, EM ALGUNS ASPECTOS.

Romano Prodi, Primeiro-Ministro do governo italiano, explicou exaustivamente os problemas que afligem aquele país e por que razão é sempre tão difícil iniciar e concretizar reformas.
Olhem a novidade!.. Aqui em Portugal, se qualquer primeiro-ministro arregaça as mangas e resolve meter mãos à obra: reformando o que deve ser reformado; endireitando o que deve ser endireitado; cortando privilégios onde devem ser cortados... e por aí adiante, todos aceitamos ordeiramente. Se não aplaudimos, civilizadamente acatamos! Cortejos de protestos, por essa razão, é que não existem.
E quando se trata de combater quem evade o fisco? Tudo colabora!
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Às vezes, acreditar em utopias, consola!...
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Como somos todos poliglotas e a língua espanhola para um português é quase sempre acessível (se devesse afirmar o contrário, já o não faria com tanta segurança), é interessante ler a entrevista que Romano Prodi concedeu a Enric Gonzales de El País, ontem, dia 15.
Alda M. Maia

sexta-feira, outubro 13, 2006

TEMA DO DIA: CORRUPÇÃO

É um lugar-comum dizer-se que a prostituição é a mais velha profissão do mundo. A corrupção está no mesmo grau de vetustez e na mesma linha interpretativa: ao fim e ao cabo, não passa de uma prostituição da ética, da decência – e é tão grave ser corrupto como o corruptor.

A persistência de João Cravinho na apresentação de um conjunto de leis que ponha travão à desenvoltura como se rouba – demos o nome aos bois – como se executam falcatruas; como se delapida o erário e os fundos europeus; como se estraga o território nacional e se cometem injustiças e atropelos com fins de utilidade pessoal… o elenco seria do tamanho da légua da Póvoa!... Pois bem, essa persistência é digna de todo, mas todo o apoio.

Reputo-a uma iniciativa própria de um homem político sério, íntegro. Assim, o desinteresse que se notou nos dois maiores partidos em compartilhá-la, dar-lhe toda a relevância a que tem direito, deixa-nos desconcertados! Por que razão essa tibieza ou mesmo indiferença? Porque crêem a corrupção inextirpável? Sê-lo-á, mas, entretanto, aprovem leis bem claras e severas – onde se veja a certeza do castigo - de modo a desencorajar tal praga. Ou receiam abrir esse enorme contentor do lixo moral da coisa pública?

Bem, ponhamos indignações de lado e demos lugar ao riso com uma poesia de Trilussa:
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“Er compagno scompagno”

Un Gatto, che faceva er socialista / solo a lo scopo d’arivà in un posto, / se stava lavoranno un pollo arosto / ne la cucina d’un capitalista.

Quanno da un finestrino su per aria / s’affacciò un antro Gatto:- Amico mio, / pensa – je disse – che ce s’o pur’io / ch’appartengo a la classe proletaria!

Io che conosco bene l’idee tue / so’ certo che quer pollo che te magni, / se vengo giù, sarà diviso in due: / mezzo a te, mezzo a me... Semo compagni!

-sto No, no:- rispose er Gatto senza core / io nun divido gnente co’ nessuno: / fo er socialista quanno a diggiuno, / ma quanno magno s’o conservatore!
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O Camarada “descamarado”

Um Gato que se fazia passar por socialista
Só para chegar aonde queria,
Estava a contas com um frango assado
Na cozinha de um capitalista.

Quando de um postigo lá do alto
Apareceu um outro Gato:- Bom amigo,
Pensa – lhe disse – aqui estou eu também
que pertenço à classe proletária!

Como conheço bem as tuas ideias,
Estou certo que aquele frango que tu comes,
Se eu desço, será dividido em dois:
Metade para ti, metade para mim… Somos camaradas!

-Não, não:- respondeu o Gato sem coração,
Eu não divido nada com ninguém:
Sou socialista quando estou em jejum,
Mas quando manduco sou conservador!
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Alda M. Maia

segunda-feira, outubro 09, 2006

GIOVANNI FALCONE
O CORAJOSO JUIZ QUE ENFRENTOU “COSA NOSTRA” (MÁFIA)


Nos dias um e dois deste mês, a RAI transmitiu, em duas partes, um filme dedicado ao célebre juiz: “Giovanni Falcone, l’uomo che ha sfidato Cosa Nostra”.

Como já esperava, a audiência foi elevada e o filme merecia essa atenção. Óptimos actores, narração fiel à realidade dos factos.

Conforme seguia o desenrolar da revivência do que tinha sido a época Falcone, portanto uma destemida luta contra a máfia, os factos, nomes e as figuras das pessoas assassinadas, tudo me veio à memória.
De novo, se apresentou a nítida impressão da solidão na qual agiam aqueles homens corajosos e da passividade, ou mesmo indiferença, do Estado.

O mesmo já sucedera ao General Carlo Alberto Dalla Chiesa, o qual chegou à Sicília, em Abril de 1982, com o fim de chefiar uma nova estrutura de combate à máfia e nomeado sem as mínimas condições e meios para o cumprimento da missão de que fora incumbido. “Sem poderes e sem poder coordenar os homens das instituições presentes na ilha”.
A poucas semanas da sua chegada à Sicília, numa entrevista ao jornalista e escritor Giorgio Bocca – podemos imaginar com qual amargura – disse: “Desde que aqui estou, ninguém me telefona. Deixaram-me só. Escreva-o, Bocca e faça-o saber”
Foi assassinado, pela máfia, juntamente com a esposa e o agente que lhe servia de escolta, em Setembro de 1982!

O juiz Giovanni Falcone e um outro juiz não menos corajoso, Paolo Borsellino, o qual trabalhou lado a lado do primeiro com a mesma persistência e sentido do dever, ficaram na história do combate àquela “Universidade do Crime Organizado” que é Cosa Nostra, como um símbolo de magistratura integérrima e arrojada - que este último adjectivo não pareça retórico, porque o não é!

O biénio 1982-83 mostrou a Sicília como um sangrento teatro de homicídios em cadeia: não somente lutas entre mafiosos que se contendiam o poder, como assassínios de magistrados e funcionários da polícia.

Em 1983, O alto magistrado Antonino Caponnetto, transferido, a seu pedido, de Procurador-Geral de Florença para o Tribunal de Palermo a fim de substituir Rocco Chinnici, assassinado pela máfia, criou o famoso “pool anti-máfia”: um grupo de quatro ou cinco magistrados que se ocupavam, exclusivamente e a tempo inteiro, dos processos de máfia, mediante subdivisão de tarefas, mas dentro de uma total harmonia de decisão e sob a responsabilidade do “Consigliere Istruttore”, Caponnetto.
Este primeiro grupo de juízes instrutores era formado por Giovanni Falcone, Paolo Borsellino, Giuseppe Di Lello e Leonardo Guarnotta, sendo Falcone o juiz de maior vulto.
Na Itália, a magistratura é mista; não há divisão (espero que assim continue)

Estes juízes foram admiráveis: no empenho tenaz como desenvolveram uma missão perigosíssima – caminhavam num terreno semeado de bombas; na renúncia a uma vida tranquila: para eles e para as próprias famílias. Mas os frutos desse empenho viram-se no que ficou conhecido como maxi-processo: 456 imputados, sob prisão, acusados de pertencerem à organização mafiosa.
Receberam graves ameaças e sabiam que as não deveriam ignorar. O Estado italiano convidou-os, com as respectivas famílias, a transferirem-se para a penitenciária da ilha de Asinara e assim, tranquilamente, terminarem a instrução do grande processo. Aí permaneceram por algumas semanas. O Estado não se esqueceu, depois, de apresentar-lhes a conta… pelas “férias” na ilha! Custou-me a acreditar, mas asseguram que é verdade.

O processo concluir-se-á em 1987: 19 prisões perpétuas ("ergastolo") – todos componentes da cúpula de Cosa Nostra; 338 condenados em vários anos de prisão – um total de 2665 anos de cárcere; 114 arguidos absolvidos. Um destes, apenas foi desencarcerado, caiu debaixo de uma saraivada de balas.
Os dois magistrados que prepararam e tornaram possível o maxi-processo foram Falcone e Borsellino.

Pela primeira vez, tornou-se realidade a figura de um membro da máfia arrependido: Tommaso Buscetta. Extraditado dos Estados Unidos para a Itália, quando se decidiu a contar o que sabia, e sabia muito, só quis falar com Giovanni Falcone. A sua confissão, mais tarde a deposição, foram arrasadoras para a máfia.

As revelações que fez, pormenorizadas e nas quais explicou o que verdadeiramente era e é a organização de Cosa Nostra, constituíram o “abre-te sésamo” para entrar no labirinto, até então impenetrável, dos segredos desse polvo.
Máfia e mafioso são termos literários, jornalísticos, asseverou ele. Os “ilustres” criminosos identificam-se somente como “uomini d’onore” (homens de honra), membros de Cosa Nostra.
Mas sobre a constituição e os rituais de Cosa Nostra, escreverei proximamente.

Quando o juiz Falcone se deslocou a Roma para o interrogatório, que durou vários meses, Buscetta advertiu-o: “Depois destes interrogatórios, Sr. Juiz, tornar-se-á uma celebridade, mas a sua vida ficará marcada. Procurarão destruí-lo, física e profissionalmente. Não esqueça que as contas com Cosa Nostra nunca permanecem fechadas”. Ainda é de opinião que deve interrogar-me?” O juiz Falcone começou a interrogá-lo.

Giovanni Falcone morreu assassinado, em 23 de Maio de 1992, na auto-estrada Trapani-Palermo, zona Capaci. Uma potentíssima bomba, com telecomando a distância, fora ali colocada. Se essa não desse o resultado esperado, outra mais à frente estava pronta para explodir.
Neste atentado, morreu Falcone, a esposa (também magistrado) e três agentes da escolta, além de muitos feridos

O seu amigo e colaborador, o juiz Paolo Borsellino, morreu em 19 de Julho de 1992, 57 dias depois, pela explosão de um automóvel armadilhado, perto da casa onde vivia. Morreu juntamente com os seis agentes da escolta.

Actualmente, o aeroporto da Sicília chama-se Aeroporto Falcone/Borsellino.
Alda M. Maia

segunda-feira, outubro 02, 2006

TRILUSSA

Trilussa é o pseudónimo de Carlo Alberto Salustri (Roma 1871 / 1950).

“É o poeta dialectal mais famoso de Itália, graças a uma linguagem romanesca que lhe concedeu o dom de fazer-se compreender por toda a gente.
Eis os sonetos e as fábulas, em versos, do irónico fustigador da sociedade burguesa e que permanece o poeta mais próximo e caro da alma popular”
(
texto do frontispício do livro de poesias, compilado por Cláudio Rendina)

Ontem, dediquei-me a pôr um pouco de ordem nos livros que existem nesta casa e para os quais já começa a escassear o espaço. Nas prateleiras desarrumadamente dedicadas à poesia, encontrei Trilussa… e acabei por não arrumar coisa nenhuma, porque me perdi a rir na companhia do poeta romano.

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La Dipromazzia

Naturarmente, la Dipromazzia / è una cosa che serve a la nazzione / pe’ conservà le bone relazzione, / co’quarche imbrojo e quarche furberia.

Se dice dipromatico pe’ via / che frega co’ ‘na certa educazzione, / cercanno de nasconne l’opinione / dietro un giochetto de fisonomia.

Pres’empio, s’io te dico chiaramente / ch’ho incontrato tu’ moje con un tale, / sarò sincero, sì, ma so’imprudente.

S’invece dico:- Abbada co’ chi pratica... / Tu resti co’ le corna tale e quale, / ma te l’avviso
in forma dipromatica.

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A Diplomacia

Naturalmente, a Diplomacia
é uma coisa que serve à nação
para conservar as boas relações,
com algum embuste e alguma astúcia.

Diz-se diplomático, por via que
aldraba com uma certa educação,
procurando esconder a opinião
debaixo de uma habilidade de fisionomia.

Por exemplo, se eu te digo claramente
que encontrei a tua mulher com um tal,
serei sincero, sim, mas sou imprudente.

Se, pelo contrário, te digo:- Olha bem com quem pratica…
Tu ficas com os cornos tal e qual,
Mas eu aviso-te em forma diplomática.
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Alda M. Maia