segunda-feira, dezembro 26, 2011

UM PRÓSPERO 2012

Precisamente, um 2012 bafejado, medrado, amplamente envolvido pela prosperidade. Nestes auspícios, porém, acrescentemos a coragem e luta cerrada ao conformismo, apatia, catastrofismo, passividade.
Nada cai do céu e, como vimos, esperar numa normal solidariedade entre os povos é índice de superficialidade, se não a ingenuidade de quem se não quer esforçar.

O que sempre me indispôs foi, e continua a ser, esta aceitação, tácita, de que somos um país pequeno, logo, um dos tais países periféricos (periféricos de que coisa?) que deve acomodar-se na sua pequenez, jamais ter assomos de dignidade e esforçar-se por impor, com o trabalho, inventiva e autoconfiança, as potencialidades desta gente lusitana.

Possuímos essas potencialidades e, como cérebros audazes, não somos inferiores aos demais povos europeus. Por que razão não insurgimos contra um cliché já estafado, mas bem arreigado lá fora, e não procuramos revolucionar este país sob o ponto de vista económico, cívico e intelectual?

Como desejaria que o 2012 nos catapultasse neste género de revolução e Portugal, sem lamúrias pelos sacrifícios inevitáveis, mas equânimes, e sem os egoísmos criminosos de quem põe os seus haveres nos paraísos fiscais, conseguisse afastar-se do atoleiro a que fomos conduzidos!

O fado foi proclamado Património imaterial da Humanidade. Não esqueçamos que também temos o fado corridinho; nem tudo são choradeiras ou lamentos.

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Para este novo ano também tenho tantos outros augúrios para distribuir por alguns personagens que se impuseram à atenção geral.
Mas, primeiro, desejo àqueles poucos que me lêem, isto é, os que têm a paciência e boa vontade de me ler, um Novo Ano sereno e ao arrepio da catástrofe económica e financeira que nos vaticinam dia a dia. Sobre este aspecto, que o Novo Ano traga luz e afaste as trevas.

E agora desejaria, por exemplo, que o 2012 destruísse a blindagem em que ficou encerrado o cérebro - e que nem a queda do muro de Berlim abalou - do nosso PCP e dos seus dirigentes.
Exprimo a Jerónimo de Sousa sinceros votos a fim de que consiga desintoxicar a mente de tanto ranço ideológico e inicie a cultivação de pensamentos mais objectivos, equilibrados e reais. Desperte e renove essas ideias!

Foi caricata e imperdoável a atitude negativa do PCP, perante os votos de condolências, na Assembleia da República, pela morte de Vaclav Havel.
Abstenho-me de aludir à manifestação de pesar enviada à Coreia do Norte pela morte do “querido líder”. Se calhar, encobria um modo de lamentar as condições-lager nas quais vive aquele povo infeliz. Mas será verdade? Duvido. Se vivem num país apelidado comunista, como podem os nossos moicanos do PCP pensar que os norte-coreanos não são felizes?

Desejo a Frau nein, Ângela Merkel, que ponha de lado as atitudes de catequista, relativamente aos Estados-membros da UE com elevadas dívidas soberanas. Não queira ensinar virtudes a ninguém. Não tem classe nem carisma para tanto e pode levantar fantasmas que exponham o próprio país a desconfianças e malquerenças. Além disso, e muito mais importante, não destrua a Europa!

Por último, desejaria - quanto desejaria! – que a classe política portuguesa, europeia, mundial varressem as teias de aranha conservadoras ou oportunistas que as paralisam e se decidissem a impor regras ao “far west” que predomina nos mercados financeiros e  que estrangulam os países que necessitam de créditos.
É inconcebível que se deva exigir sacrifícios e aumento do PIB apenas para se conseguir pagar as altíssimas taxas de juro! Até onde se poderá chegar? 

segunda-feira, dezembro 19, 2011

RACISMO E CERTAS FOBIAS:
VIOLÊNCIA E DESUMANIDADE

E quando o racismo se combina com mentes retrógradas, dominadas por preconceitos anacrónicos e falsos valores, as consequências são sempre explosivas e repugnantes.

Na última semana, as civilizadíssimas cidades de Turim e Florença foram teatro de dois eventos caracterizados por uma violência de enorme gravidade. Mas o vírus dessas violências já de há muito grassava no País. Foram subestimados e as consequências; cedo ou tarde, explodem.

Bairro “Le Vallette”, periferia da cidade de Turim. Uma jovem de dezasseis anos, educada numa família com o culto da virgindade, deveria chegar “pura” ao matrimónio; para maior segurança, era submetida a visitas periódicas ao ginecologista.

Voluntariamente, teve a sua primeira experiência sexual com o namorado. Assustou-se, temendo consequências e a reacção dos pais e demais familiares. De acordo com um irmão, lançou o alarme e denunciou que fora assaltada e violada por dois ciganos. 

A polícia ficou perplexa ante uma denúncia que não brilhava por clareza. Mas entretanto, a indignação dos habitantes do bairro, onde todos se conhecem, explodiu. Houve marcha de protesto.
Um consistente grupo de exaltados, colhendo a oportunidade para exteriorizar o pior racismo e munindo-se de instrumentos eficazes para o efeito, decidiu invadir e atacar um acampamento de ciganos, localizado nas proximidades: absolutamente fora da questão se eram culpados ou inocentes.

Espancaram o primeiro infeliz que viram; incendiaram e destruíram barracas e tudo o mais que havia para destruir, semeando o terror.
Homens, mulheres, crianças fugiram apavorados. Numerosas famílias ficaram sem abrigo e à mercê das inclemências do tempo. Um pogrom em perfeita regra!

A falsa vítima, entretanto, já tinha confessado que inventara a agressão e estupro. Certamente que quando imaginou os agressores, intuía que seria mais credível se os apresentasse como ciganos; o “vírus do ódio étnico” não lhe era estranho.

Envergonhou-se e arrependeu-se amargamente, quando viu na TV as imagens das crianças aterrorizadas e da brutalidade que  sua acusação irreflectida provocou.        

Se fiquei enojada com o culto da violência daqueles energúmenos, pois não tolero quaisquer formas ou manifestações de racismo contra quem quer que seja, a rapariga mereceu-me compaixão.
Vejo esta adolescente mais como vítima de concepções baseadas em valores inconsistentes, arcaicos do que beneficiária de uma educação atenta a inculcar-lhe sentimentos de prudência e equilíbrio, na vida que se lhe abria para novos afectos.

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O segundo facto violento, verificado em dois mercados da cidade de Florença, foi largamente noticiado nos nossos telejornais: o assassínio, a tiro de pistola, no mesmo dia e em períodos sucessivos, de dois imigrantes senegaleses e ferimento de outros três - um dos quais, muito grave - por um nazi-fascista.
Quando se viu perseguido e acossado pela polícia, o assassino suicidou-se.

Inicialmente, quiseram apresentá-lo como um louco descontrolado. Mas Reconsideraram. Não se tratava de um caso patológico, mas a acção de uma mente distorcida, envenenada e instigada pelas doutrinas da extrema-direita.
Enquanto disparava, algumas testemunhas ouviram-no dizer: “Agora toca a vós, negros”.

De há duas décadas que o clima de intolerância contra o diverso vinha a difundir-se na Itália. Não hesito a apontar o dedo à Liga Norte - xenófoba e racista - e o que foi o seu principal aliado de Governo. Há dias, por exemplo, o saudosista Berlusconi declarou que o fascismo de Mussolini “era uma democracia menor”!...

Contra os imigrantes, embora úteis para a economia do país, usaram-se as palavras mais ofensivas e intolerantes e imaginaram toda a espécie de meios legais para afastar e criminalizar esta pobre gente em busca de melhores condições de vida.
A proverbial arrogância do bem instalado, mas de mentalidade árida, para quem necessita de ajuda e integração.

Paralelamente, as facções de extrema-direita quase tiveram campo aberto para organizações e manifestações que proclamam os ideais mais abjectos que um ser humano pode conceber contra um outro ser humano: “Nunca permitiria que os meus filhos brincassem com negros ou judeus. Defendo a integridade da raça, da civilização, dos povos”. O assertor desta cretinice, líder do grupo fascista “Militia”, foi encarcerado recentemente.

A estes imbecis que cultivam o racismo como baluarte de uma imaginária   identidade alheia a contaminações, proporia um decreto-lei que fosse aprovado por unanimidade: ministrar-lhes, obrigatoriamente, amplas lições de história sobre a evolução humana, desde os alvores até ao presente. Em seguida, e em doses maciças, aulas práticas de civismo e solidariedade.

segunda-feira, dezembro 12, 2011

“ILUSÕES E SUPEREUROPA
 
“Supereuropa”! O que vejo de super, no que concerne a União Europeia, são superegoísmos; superdirigismos de dois países sem qualquer mandato institucional; superafasia dos demais Estados-membros, incapazes de formar grupo e impor soluções alternativas.
 
Ilusões e Supereuropa” é o título de um artigo do jornalista Piero Ottone, publicado no jornal La Repubblica de quinta-feira passada, 08 de Dezembro.
 
No mare magnum de opiniões, análises, crónicas e editoriais sobre a crise, euro e União Europeia, e estes são temas que perdurarão por largo tempo, decidi traduzir este artigo, o qual sintetiza o que poderia e deveria ser na UE, mas que, infelizmente, não é.

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“Seguimos as vicissitudes do euro dia a dia e ainda não sabemos como tudo acabará. Todavia, podemos exprimir uma certeza. A longo prazo, o euro não poderá sobreviver se não tiver o suporte de um superbanco europeu. E este superbanco não poderá operar se não tiver, por sua vez, o suporte de um Superestado europeu. Uma Europa comparável, para melhor compreensão, aos Estados Unidos da América.
 
Teremos, portanto, esta Europa federal? Não existem certezas, mas uma Europa federal apresenta-se extremamente improvável, se não impossível.
Mas há ainda quem espere que a Europa se cumpra.
 
Na ilha de Ventotene, uma lápide recorda o nobre manifesto dos intelectuais, aí exilados pelo regime fascista: nos dias tétricos da guerra, exprimiam a esperança que os povos do nosso Continente, berço da civilização, em vez de se combaterem e dessangrar-se, um lindo dia unir-se-iam, a fim de guiar o progresso.
 
Grandes homens políticos - Adenauer, De Gasperi, Schuman, na primeira fila – acreditaram na união do Continente. Hoje, o ideal já não é tão vivo, mas não se apagou e apercebemo-nos que somente uma Europa unida, no mundo globalizado, pode competir com a América, com a China, com a Índia.
Verificaram-se grandes progressos relativamente à união: o euro, que há dez anos substituiu as moedas nacionais, representa uma etapa fundamental.
 
Porém, e como se tem apurado nos últimos dias, o euro não resiste se não se concretiza um outro passo - um passo decisivo - para atingir a união, isto é, uma qualquer forma de federação política.
 
As uniões que implicam uma renúncia definitiva, e não parcial ou revogável, à soberania nacional, fazem-se somente quando há alguém em condições de impô-las.
Unifica-se, por assim dizer, quando há alguém que unifica os outros.
 
Seria magnífico se os representantes dos vários Estados se reunissem à volta de uma mesa, dessem vida a um Superestado federal, brindassem ao grande sucesso.
 
Mas não é assim que se fazem as uniões entre os povos. Ocorre sempre, na realpolitik, que alguém prevaleça: o Piemonte para fazer a Itália; a Prússia para fazer a Alemanha; o Norte, para os Estados Unidos da América.
Na Europa hodierna, não existe um Estado que tenha capacidades para fazer a Europa: e é esta a razão, abstraindo as diferenças de língua, de história, de civilização, que, em última instância, impede a criação dos Estados Unidos da Europa.
 
A Alemanha, embora prevalecendo pelas dimensões e por eficiência, não reúne condições para unificar o Continente: excessivamente grande para ser unificada; demasiado pequena para unificar.
 
Há dez anos, quando se fez o euro, sabia-se que a moeda única, cedo ou tarde, exigiria um passo decisivo para a união política. Esperava-se que as nações europeias, para não perder o euro, o tivessem dado. Mas esta esperança não foi atendida; as consequências estão á vista.

segunda-feira, dezembro 05, 2011

MAS QUE COISA É ESTA CRISE?

Há dias recordei-me de uma daquelas velhas canções popularíssimas, originais e sempre verdes. É uma canção italiana de 1933: “Ma cos’è questa crisi?” - intérprete e autor, Rodolfo De Angelis.

Sugeriu-me um bom título para aquilo que, presentemente, tanto nos preocupa e que tantas incógnitas apresenta. A explicá-las - por vezes criando mais alarme e confusão - surgiram as vedetas do momento, isto é, os economistas.

Nunca deixo de os ler, tentando apreender a sensatez e objectividade das análises; compreender o catastrofismo que algumas apontam e com as quais não quero concordar.
É-me muito difícil perceber e aceitar os vaticínios sobre o afundamento do euro e a fragmentação da União Europeia.
Michael Spence, Nobel Economia 2001, por exemplo, aventou dois cenários, sendo o primeiro o mais provável: “a saída da Grécia da zona euro e talvez a dos dois outros países, Portugal e Irlanda”. Vade retro!...

Aonde querem chegar? Qual o interesse, se a maioria das opiniões, paradoxalmente, indica, como consequência inelutável, um desastre não somente europeu, mas global?

As perplexidades acumulam-se e não me canso de esforçar-me por entender se tudo partiu de uma só causa, de múltiplas causas ou, e insisto sobre esta tecla, da calamidade de vermos uma desoladora mediocridade – frequentemente rasando a estupidez - da liderança política europeia.

Uma das causas principais é bem conhecida e incontrovertível. As dívidas soberanas são a consequência de quem mal governou e não soube manter o equilíbrio entre as receitas e as despesas. E não são necessárias altas teses económicas. Qualquer dona de casa de bom senso aconselharia: cuidado com as dívidas! Há os juros, prazos de pagamento e possíveis anos de mau rendimento. Antes de agravar o débito, haja rigor, equidade e ponderação nos orçamentos.

Rigor! Por onde andará este conceito na cabeça de quem se dedica a administrar dinheiros públicos? Prefiro não entrar na questão, pois tanto se pode cair no populismo e demagogia, como numa indignação legítima.

Crise é palavra que assusta. Todavia, se raciocinarmos com acuidade sobre as conotações que ela sugere, podemos acabar por bendizê-la.
E neste ponto, o que há de negativo numa crise pode ser o impulso para que a sensatez imponha reformas oportunas e inadiáveis e a ocasião de vermos, finalmente, estadistas que demonstrem uma visão ampla, uma ponderação severa, rápidas decisões, acume, inteligência.

Desgraçadamente, quando na Europa tanto necessitaríamos de políticos com estas características, apresenta-se-nos uma Senhora Ângela Merkel, o fac-símile da inteligência em sentido único e mais própria, talvez, para a administração de qualquer autarquia de menor importância. Se inadequada como chanceler de um grande país, com maior razão, jamais líder autoritário da União Europeia!

Contrariamente á onda que vai crescendo, não critico a Alemanha. Existem lá personagens políticas, intelectuais de vulto ou cidadãos informados que censuram asperamente a ortodoxia nacionalista da Senhora Merkel e a obediência à prepotência da Bundesbank: “um Estado dentro do Estado”, segundo o ex-chanceler Helmut Schmidt.

Certamente que Madame Nein tem razão, quando pretende rigor nos orçamentos dos estados-membros da EU - mas comece ela a vigiar melhor as contas em casa própria! Paralelamente, demonstra uma estupidez ilimitada quando opõe, de há dois anos a esta parte, negativa após negativa às soluções para pôr travão ou atenuar a crise que nos sufoca; quando assume atitudes ditatoriais sobre a função do Banco Central Europeu. As consequências estão à vista.

Se o BCE é independente e, por estatuto, pode fornecer dinheiro aos bancos solventes, só me pergunto por que razão não ignora o diktat da chanceler, emite toda a moeda necessária e fornece os bancos da União que, como finalidade primária, deverão financiar o crescimento económico. E não importa que os “bem pensantes” – teóricos, mas longe da realidade – invoquem o perigo da inflação.
A pergunta é fácil: inflação onde a recessão é iminente ou já se instalou, com uma procura claramente decrescente?
Não me parece que, neste caso, inflação e recessão possam caminhar de mãos dadas. Se a inflação subir dois pontos – se em vez de os 2% possa atingir os 4% - os bons economistas confirmam que daí não virá quaisquer problemas, mas uma óptima solução para acalmar os mercados e favorecer a economia real.

Penso que até mesmo os totós nesta matéria (eu incluída, obviamente), podem compreender tudo isto.
Em conclusão, as soluções anticrise existem. Mas sucede que a política europeia, seja por incapacidade, seja por egoísmo, petulância e nacionalismos muito descabidos dentro da União, está miseramente ausente das grandes decisões. Aguardemos. E que Deus ilumine quem deve decidir.