segunda-feira, fevereiro 25, 2013

SUBTILEZAS DA LÍNGUA

Senhores legisladores: procurai interpretar as subtilezas da língua em que vos exprimis, tendo sempre em vista a clareza das leis que discutis e aprovais no Parlamento.

Por exemplo, se não tomais cuidado com o uso da preposição de ou quando é contraída com um determinante – no caso em análise, o artigo definido a – vede até onde pode chegar a vossa distracção!

Assim, relativamente à lei da limitação de mandatos dos órgãos executivos das autarquias locais, reflectistes bem sobre este preciosismo interpretativo em que “presidente da câmara e presidente da junta de freguesia” não é o mesmo que “presidente de câmara” ou “de freguesia”?
Fostes mesmo cabeças no ar, quando não ponderastes o diferença entre o emprego de um de e a contracção desta preposição com artigo definido a!

Ou a culpa é da Imprensa Nacional-Casa da Moeda, a qual se “atreveu” a corrigir a vossa ambiguidade?

É bem certo que não há limites para o ridículo e a impudência!
Todas estas querelas sobre o direito dos candidatos saltimbancos a presidentes de outras câmaras ou juntas de freguesia, após limites de mandatos, tresandam a avidez de instalação no poder: não existem outras interpretações e tenham vergonha.

Não abusem da nossa inteligência, quando invocam “os direitos fundamentais a cargos executivos”. Esses direitos foram contemplados durante três mandatos. Mesmo que a ambiguidade da lei n.º 46/2005 de 29 de Agosto possa admitir a candidatura a outras autarquias, quem tem um mínimo de pudor, de bom senso, equilíbrio e, digamos mais uma vez, observância ética, dedica-se a outras funções e evita desprestigiar ainda mais uma classe já tão desprezada como a classe política actual.

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Impedida a liberdade de expressão do Sr. Relvas no ISCTE. Como se atreveram?!

Francamente, não sei o que é mais estranho nesta peripécia: se o convite da TVI a Miguel Relvas para discursar no ISCTE; se o zelo como foi defendida, em diversos meios de comunicação, a “liberdade de expressão negada” ao ministro Relvas pelos intérpretes de “Grândola Vila Morena” e sequentes vaias.

Primeiro: essa liberdade foi mesmo negada pelos barulhentos ou a Miguel Relvas falhou a qualidade de estadista (olhem a novidade!...) e não soube enfrentar percalços deste género, sempre à espreita dos responsáveis da administração pública? Por que desistiu e bateu em retirada? Por que não soube enfrentar a turbulência dos estudantes pacata, ponderada e pacientemente?

No que concerne o convite da TVI a uma personagem tão discutível e tão limitada intelectualmente para discursar sobre o que deve ser o jornalismo, embora ministro adjunto dos Assuntos Parlamentares e responsável, entre outras incumbências, da comunicação social, deixa-me perplexa. Esse convite não tem nada que ver com uma espécie de cortesania, para não dizer sabujice, ao cargo público da personagem em questão?

Segundo: os vários artigos publicados ou declarações que deploram e condenam o evento que coarctou a liberdade de expressão ao Sr. Relvas no ISCTE, os autores serão mesmo sinceros?
Lidos com atenção, emanam um forte odor de jacobice. E se não é isto, vejamos.

Analisando os factos, estes correspondem, efectivamente, a um real impedimento da liberdade de expressão a quem nunca faltou, nem faltará, como é justo e óbvio, a oportunidade de exprimir-se livremente?
Onde colocam a liberdade de manifestação correcta, isto é, sem violências físicas ou destrutivas?
Que entendem por um quando ou um como se dá acto ao impedimento da liberdade de expressão?
Não o banalizem, por favor, pois é uma coisa séria, e deixem-se de hipocrisias na ostentação de um pretenso fair play. 
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segunda-feira, fevereiro 18, 2013

“COMO VAI SER O JORNALISMO
NOS PRÓXIMOS 20 ANOS?”

Este é o tema da conferência organizada pela TVI - amanhã, 19 de Fevereiro - sobre o jornalismo e em comemoração dos seus vinte anos de existência.
Como vai ser o jornalismo nos vinte anos que se seguem? Para mim bastaria que fosse, sempre e exactamente, como os dois jornalistas, Diana Löbl e Peter Onneken, da ARD, a primeira rede televisiva pública alemã, numa reportagem que estarrece e indigna.
Eis o que escreveram os respectivos correspondentes, em Berlim, de dois bons jornais italianos: Corriere Della Sera e La Repubblica.

Alemanha, os desesperados de Amazon, humilhados por vigilantes neonazis
“São milhares, provém da Espanha ou de outros países da Europa mediterrânica atingidos pela crise, ou então da Roménia, Hungria e outros Estados da União Europeia onde a pobreza de massa conduz à emigração e o baixo custo do trabalho desencadeia os apetites de produção low cost das multinacionais. E os big global players exploram-nos como bestas de carga, como forçados… […]
Amazon, o maior comerciante online do mundo, está sob acusação. Construiu um verdadeiro GuLag do trabalho forçado com míseros contratos a prazo para os escravos e os forçados do turbocapitalismo global, neoliberalista e sem escrúpulos ou uma reedição da Organização Todt, aquela com a qual SS e Gestapo recrutavam forçados em toda a Europa ocupada… […]
Contudo, o GuLag de Amazon não está na Sibéria, mas na Alemanha, excelente sede pelos óptimos transportes, infra-estruturas e serviços de expedição. Os forçados e os escravos do século XXI, empurrados pela miséria e fome, vêm para a Alemanha […]
São pagos miseravelmente e trabalham, sobretudo, nos turnos de noite. São alojados, sete em cada dormitório, em velhos hotéis decadentes e vigiados por guardas pertencentes ou próximos da extrema-direita neonazi.”

“Não foram grupos da extrema-esquerda, nem Anonymous ou os “no global” quem denunciou o escândalo. A descoberta dos desesperados de Amazon deve-se a uma equipa de investigative reporters da ARD, a primeira rede televisiva pública alemã que tem o hábito de concentrar-se sobre inquéritos incomodativos, exactamente como cães de guarda da democracia e direitos humanos.
Cinco mil pessoas, pelo menos - disse a ARd na sua reportagem - são empregadas pela Amazon nos seus centros de aviamento e expedição, especialmente em Hessen, o estado central onde surge a metrópole financeira, Frankfurt.”
Nos seus países eram professores ou recém-licenciados, mas o desemprego de massa na Europa do Sul e nos Balcãs torna inútil qualquer qualificação. São contratados pela Amazon com e-mails vagos que prometem um bom salário e um contrato seguro.

“Os desesperados de Amazon chegam à Alemanha pelos próprios meios e são recebidos pelos vigilantes ou por pessoas das agências privadas sem escrúpulos. O tráfico dos desesperados efectua-se, sobretudo, antes de Natal, quando as encomendas à Amazon voam em todo o mundo, obviamente. Ficam então a saber, pela Amazon, que o salário é menor e o horário de trabalho mais longo do que o previsto; quase sempre no extenuante turno de noite.
[…] Alojamento e banhos sujos e perigosos; alimentação de péssima qualidade, devendo pagá-la com parte do mísero salário. Frequentemente, os vigilantes, sádicos, divertem-se a ameaçá-los e assustá-los, a fim de os dissuadir de formular qualquer protesto
Em qualquer momento, estes vigilantes têm o direito de entrar para fazer uma busca e, à mínima suspeita, acusá-los de furto.” […]

“O escândalo provocou grande impressão na Alemanha, a tal ponte que algumas editoras alemãs estão a pensar em pôr em discussão os seus contratos com a empresa de Jeff Bezos (Amazon).
A pátria do capitalismo social, da segurança social e da co-gestão patrões/sindicatos descobre-se, também, como território da mais torpe exploração do capitalismo selvagem, coisa do terceiro mundo.
É um golpe à imagem de Amazon, mas também à seriedade dos controlos das autoridades alemãs.” […]

“Quando os media públicos estão verdadeiramente ao serviço da informação e não dos potentes, contra horrores, crimes e prepotências pode-se, pelo menos, combater.
Mas entre os milhões de pessoas que encomendaram à Amazon prendas de Natal, quem sabe quantos ou quão poucos terão uma crise de consciência!” – Andrea Tarquini – La Repubblica – 16/02/2013

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“Neonazis como guardas dos operários. Escândalo Amazon na Alemanha”

[…] “Naturalmente, Amazon não é, por certo, o único mau num mundo de bons. Continuando na Alemanha, deve ser chamado em causa um grupo como Zelando que vende, online, calçado e vestuário. Fundado em 2008, hoje está presente em doze países e teve um volume de negócios de mil milhões de euros em 2012.
Segundo muitos testemunhos, no estabelecimento de Grossberen, a sul de Berlim, os trabalhadores que vêm da Polónia são constrangidos a ritmos produtivos massacrantes. Contam que chegou um pouco de água para beber gratuita à disposição de todos somente após a intervenção externa do sindicato Ver.Di e, também neste caso, graças a um serviço televisivo.
Dentro, todos têm medo; os outros não sabem ou não querem ver”. – Paolo Lepri - Corriere Della Sera – 16/02/2013

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Há informações que infâmias destas se verificam noutros países. Mas como os dois jornalistas não deixaram de observar, ninguém se apercebe: os que deveriam intervir “não sabem (?) ou não querem ver”.
Portanto, são estes “cães de guarda da democracia e direitos humanos”, em qualquer parte do mundo, que classificam e enaltecem o jornalismo de todas as épocas. 

segunda-feira, fevereiro 11, 2013

PODE SER LEGAL, MAS NÃO ÉTICO

Nem sempre a legalidade está em consonância com a ética. Circunstâncias deste género verificam-se frequentemente, sobretudo nas instituições públicas; precisamente quando ética e legalidade deveriam constituir um todo único e com regras indeclináveis, relativamente à primeira, sobre a clareza, decência e equilíbrio.

Acredito piamente que o novo Secretário de Estado do Empreendedorismo, Competitividade e Inovação, Franquelim Alves, não fosse “responsável pelo buraco no BPN”, quando exercia funções administrativas na Sociedade Lusa de Negócios, proprietária daquele banco.
Porém, dadas as gravíssimas irregularidades que envolveram estes dois organismos e as pesadas consequências económicas para o país, por que aceitou, agora, o cargo de Secretário de Estado? A ética, esta esquecida ou desconhecida, nada lhe sugeriu? A ambição ou a vaidade foram mais fortes do que um raciocínio inteligente que lhe perspectivasse as reacções que se verificaram e verificam? Ou a tal ética não foi esquecida porque, simplesmente, lhe é desconhecida?

Isto no que concerne Franquelim Alves, cujo comportamento, na minha opinião, enquadra-se no domínio ético.
Mas os membros do Governo que concepções alimentam sobre o poder e a administração pública? Que se esconde sob estas nomeações a esmo (aparentemente) de Secretários de Estado que, em alguns casos - bastantes - se identificam mais como tráfico de influências do que a escolha assisada de elementos para uma boa governação?
Alto! Escolha assisada, neste Governo?!! Aqui, a expressão perde sentido. Continuemos, portanto, no elenco das discrepâncias.

Onde está a seriedade de certos currículos vindos a público, como o do recém-nomeado Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural, Francisco Gomes da Silva, cujo conflito de interesses é abissal?
O artigo de José António Cerejo de sexta-feira passada – sempre este excelente jornalista de investigação do jornal Público! - dá um retrato completo sobre as actividades empresariais deste novo “Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural” e das suas precedentes ligações com o ministério da Agricultura. Quais as responsabilidades da titular deste ministério?
Mas já fomos esclarecidos que, no Governo do Senhor Passos Coelho, somente os secretários de Estado são removíveis. Devemo-nos conformar? Eu penso que não.

Não menos estranho, o caso do Secretário de Estado da Alimentação, Nuno Vieira e Brito, “ter sido nomeado director-geral efectivo de Veterinária um dia antes da nomeação para o Governo”. Ademais, era perito na “Comissão de Recrutamento e Selecção para a Administração Pública” (CReSAP).
Admitamos que não fez parte do júri que avaliou a sua nomeação de Secretário de Estado. Todavia, urge admitir que ambiguidades e falta de transparência se sobrepuseram à correcção e inadmissibilidade destes critérios nas citadas nomeações.

Chamemos-lhes compadrios, tráficos de influência, “amiguismos”, favoritismos, enfim, a sólita ocupação do poder, alheia ao respeito pela integridade e transparência que o mesmo deveria impor - ou que os cidadãos deveriam exigir.

Quando está comprovado que, em Portugal, a confiança no Governo, no Parlamento e na democracia é baixíssima – 22%, 23%, e 25%, respectivamente - por que não reflectimos e começamos a aceitar que, afinal, a classe política não é formada por alienígenas, mas provém daquela mesma sociedade que a elege?
Costuma dizer-se que “cada povo tem o governo que merece”. Será assim?

Por que razão protestamos somente quando as deliberações legislativas ou administrativas tocam nos nossos interesses privados?
Já alguma vez assistimos a protestos e manifestações em defesa veemente daqueles valores e princípios que caracterizam uma cidadania evoluída, autenticamente democrática e que apenas admite uma administração pública avessa à corrupção e ineficiência?

Quanto desejaria testemunhar manifestações deste género, justas e no momento oportuno, em vez das habituais – já um pouco estafadas – que apenas clamam pelos consagrados direitos sem contrapartidas! 

segunda-feira, fevereiro 04, 2013

O ADMIRADOR DE MUSSOLINI
SAUDOSISTA OU ESPERTALHÃO?

É as duas coisas, este admirador de Mussolini.
A notícia espalhou-se e, mundialmente, ficou a saber-se que Berlusconi – sempre este indivíduo! – no dia justo para uma gafe imperdoável, isto é, o 27 de Janeiro, Dia da Memória do Holocausto, quis testemunhar que Mussolini “também fez coisas boas”.
Com toda a naturalidade do ignorante, a malícia do espertalhão e comprovadas inclinações de extrema-direita - não é a primeira vez que exprime conceitos deste género - eis o que declarou sobre Mussolini:
“É muito difícil pôr-se no lugar de quem, na altura, teve de decidir. O Governo de então, com receio que a potência alemã vencesse, em vez de opor-se, preferiu ser um aliado da Alemanha de Hitler.
Dentro desta aliança houve a imposição da luta e do extermínio dos judeus, logo, o facto das leis raciais é a pior culpa de Mussolini, visto que em tantos outros aspectos tinha actuado bem. A Itália não tem as mesmas responsabilidades da Alemanha”.

Quanta ignorância sobre o “Pacto de Aço” em 1939 e a promulgação das leis raciais fascistas em 1938, citando apenas duas das piores deliberações do regime fascista! Ademais, também não é desconhecido que, na fase inicial, o nacional-socialismo de triste memória se inspirou na ditadura fascista e que o anti-semitismo já imperava na Itália, antes das infames leis raciais de 1938. Mussolini, em seguida, tudo fez para imitar o nazismo.

“É perigoso arriscar ter novamente um chefe de governo tão ignorante; quero esperar que a gente o compreenda” – Pietro Terracina, sobrevivente de Auschwitz.

Como é óbvio, a indignação - claramente manifestada - foi geral, dentro e fora do país. Mas o homem não se descompôs.
“Sobre o fascismo exprimi o que pensa a grande maioria dos italianos, mas ninguém me pode acusar de anti-semitismo: neste país, eu sou o maior amigo de Israel”.
Não me parece que a Israel, com toda a sua gama de inimigos, convenha amigos deste jaez.

Fiquemo-nos por aqui. Isto é já o suficiente para dar a dimensão de um grosseiro e hábil oportunista, que, infelizmente, continua a convulsionar a política italiana. E o que mais me desconcerta é verificar que há tanta gente que ainda vota neste demagogo, o qual tem subido nas sondagens, desenfornadas quase diariamente.  
 Não restam dúvidas, portanto, que as suas qualidades de histrião nacional são um excelente recurso para atrair ignorantes em boa-fé e oportunistas de baixo calibre.
Gente informada, com sensibilidade cívica e culto da honestidade, certamente que jamais votaria um Berlusconi e acólitos.

Alguns comentadores indicaram a sua dissertação sobre as “boas obras de Mussolini” como uma esperteza eleitoral, a fim de captar votos dos muitos saudosistas que, efectivamente, ainda existem.
Se não vencer as próximas eleições legislativas de 24 e 25 deste mês, o homem luta, pelo menos, para obter um resultado que o catapulte em zona onde possa condicionar as decisões políticas e administrativas e, paralelamente, defender-se, com os habituais “legítimos impedimentos”, dos processos que o envolvem: se possível, obter um salvo-conduto permanente.
É já um clássico: “Berlusconi defende-se dos processos e não nos processos”. E quantas manigâncias para driblar esses processos até que chegue a salvífica prescrição!

Um jornalista conhecido, num artigo onde vibram raiva e indignação, escreveu no título: “Berlusconi fora da Europa” – “fora do PPE, esse impenitente admirador de Mussolini”.

A Europa, melhor, a UE foi submersa pelas preocupações e problemas económico-financeiros. A defesa das normas democráticas e os inalienáveis direitos humanos passaram para segundo plano, se é que os não arrumaram no sótão.
Não se compreende, por exemplo, o silêncio ante o que se passa na Hungria e as atitudes absolutamente fascistas do seu presidente Viktor Orbán. Muito menos se compreende que seja um dos vice-presidentes do “Partido Popular Europeu”, o partido da maioria dos actuais dirigentes da União. Estes sentem-se bem com aquela companhia? Se é assim, compreende-se que Berlusconi, como palhaço, sirva como um fait divers.

Esquecia informar que Berlusconi, na Europa, era e é admirado por todos os líderes – segundo a sua opinião, obviamente. E tanto assim:
Eu era a pessoa mais informada e mais bem preparada sobre economia e sobre o mercado; hoje, pelo contrário, só existem burocratas.
Que fazes, Europa? Assumes como fait divers um elemento tão precioso!?