domingo, dezembro 27, 2009

UM NATAL DE PAULO COELHO
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Rafael Sanzio: La Bella Giardiniera 1507 - Museu do Louvre
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Em exclusivo para os leitores do jornal La Repubblica, Paulo Coelho escreveu um conto de Natal: interessante e fora dos moldes habituais.

Transcrevo-o, traduzindo do italiano.
Na impossibilidade de conhecer a versão em língua portuguesa que, provavelmente, este popularíssimo escritor brasileiro enviou para La Repubblica, devo recorrer à tradução de uma tradução – o que obriga a esforço duplo, pois estas nem sempre brilham por clareza. Mas vale a pena.

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ORAÇÃO DA NOITE DE NATAL

“A fé ainda está viva no coração dos homens”, murmurou o padre, vendo a igreja repleta de fiéis.
Eram todos trabalhadores do bairro mais pobre do Rio de Janeiro e, naquela noite, estavam ali reunidos, a fim de assistir à Missa de Natal.

Partindo deste pensamento e ante aquela visão, o sacerdote experimentou um sentimento de grande alegria.
Com passo solene, dirigiu-se para o centro do altar. Naquele instante, porém, ouviu uma voz que dizia: «A, b, c, d…»
Pareceu-lhe a voz de uma criança. Perturbava a solenidade do acto.
Arreliados, os presentes dirigiam o olhar naquela direcção, mas a voz não se interrompia e continuava a repetir: «A, b, c, d, …»

«Queres acabar com isso?» – admoestou o padre.
Ante estas palavras, o rapazinho saiu do que parecia um estado de transe. Assustado, olhou as pessoas que o rodeavam e corou de vergonha.

«Por que te comportas deste modo? Não compreendes que disturbas a função religiosa?»
A criança baixou a cabeça e os olhos marejaram-se de lágrimas.
«Onde está a tua mãe? Nunca te ensinou como te deves comportar durante a Santa Missa?».

Sempre com a cabeça baixa, o rapazinho respondeu: «Desculpe-me, Padre, mas eu não sei como se reza; nunca aprendi a fazê-lo. Cresci na rua, sem pai nem mãe. Hoje é dia de Natal e eu senti necessidade de falar com Deus. Mas como não sei que língua compreende, decidi pronunciar todas as letras que conheço, uma a seguir à outra.
Disse cá para mim que, lá em Cima, Ele tê-las-ia apanhado e criaria as palavras e frases que mais Lhe agradassem
»

O menino levantou-se: «Agora vou-me embora. Não quero incomodar todas estas pessoas, toda esta gente que sabe conversar muito bem com Deus»

«Não. Vem aqui perto de mim – replicou o sacerdote.
Pegou-lhe na mão e conduziu-o até ao altar. Dirigiu-se, então, aos fiéis: «Antes da missa, esta noite recitaremos uma oração particular. Pediremos a Deus para compor as palavras que deseje ouvir.

Cada letra corresponderá a um momento deste ano, no qual fomos capazes de efectuar uma boa acção, de lutar corajosamente por um sonho ou rezar sem proferir verbo.

Pedir-Lhe-emos que ponha em ordem as letras da nossa vida, anelando que essas letras permitam que Ele crie as palavras e frases que mais Lhe agradem».

O padre semicerrou os olhos e começou a recitar o alfabeto. Imediatamente, todos os fiéis presentes na igreja elevaram as vozes e começaram a dizer: «A, b, c, d…»

Paulo Coelho
La Repubblica - 20 de Dezembro 2009

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Como o final deste conto parece contagioso, até a mim chega o impulso de começar: A, b, c, d, e, f…
Alda M. Maia

domingo, dezembro 20, 2009

DIFÍCIL ENCONTRAR UM PONTO EQUIDISTANTE

Por regra, procuro ler jornais, ou outras publicações, que exprimam tendências opostas e, obviamente, variados pontos de vista.
Desejando informar-me, pretendo que seja o meu raciocínio, assim como a quota de bom senso que fui adquirindo, quem deve definir as conclusões a que vou chegando sobre factos, casos, acontecimentos, personagens.

Sempre me repugna aceitar, ou permitir que se insinue, a influência de quem quer que seja. Portanto, certas ou erradas, são as minhas opiniões.

Na imprensa portuguesa, a procura de tendências esgota-se em pouco tempo; dir-se-ia que se impôs um único diapasão.
Com ligeiras variações, basta-nos ler apenas um quotidiano para nos apercebermos da direcção dos ventos que varrem o território nacional ou do que acontece fora dos confins lusitanos. Não existem grandes saltos.
Mas viremos página e vamos ao ruidoso caso desta última semana.

Parece que é praga (num bom sentido)! Por muito que deseje desviar a atenção ou o pensamento do meu País adoptivo, vejo-me sempre capturada pelos eventos que o convulsionam e impelida a trazer para este blogue o que me surpreende, preocupa, alegra ou desagrada.

Sendo assim, como não escrever sobre um souvenir de pó de mármore lançado contra a face do “melhor primeiro-ministro que a Itália jamais teve nos 150 anos da sua história”!?
Mas ponhamos de lado ironias.

Por todas as razões, não gostei do que aconteceu. Detesto o modo indecente como Berlusconi interpreta a política, o seu desmedido e tentacular conflito de interesses, a sua amoralidade, mas não admito que sucedam factos deste género e em nenhuma circunstância.

Seguindo as fases da agressão, impressionei-me e senti-me humanamente solidária com o agredido, “sem se e sem mas” – a frase da actualidade.

Chego agora à dificuldade de poder encontrar um ponto equidistante das sucessivas reacções dos pasdaran que defendem “o melhor primeiro-ministro da história italiana” e de todos os que se opõem ao seu “populismo anómalo”.

A reacção da oposição – centro-esquerda - pareceu-me correcta. Imediatamente demonstrou ampla e sincera solidariedade ao chefe do Governo. Não me apercebi de tons hipócritas ou solidariedades oportunistas – refiro-me sempre à classe política.
O secretário do maior partido opositor não hesitou em ir visitá-lo ao hospital, o que me agradou.

Houve apenas duas vozes que desafinaram, mas uma delas corrigiu a excessiva sinceridade (Rosy Bindi, presidente do “Partido democrático”).
O ex-juiz António Di Pietro (partido “Itália dos Valores”), pelo contrário, manteve a sua posição: lamentava o sucedido, mas eram as intemperanças de Berlusconi a provocar gestos insanos.
Nos seus excessos, António Di Pietro, embora se exprima sobre argumentos justos, por vezes aproxima-se dos pasdaran da outra parte!

Aprecio uma contraposição política forte e implacável, mas com estilo, usando uma linguagem elegante e bem curada na sua eficácia contundente.
Não suporto os tons exaltados e vocabulário de taberna ou continuamente acusatório e amesquinhador. É degradante!

Ora, na política italiana, com a era berlusconiana, o que mais se impôs foi, precisamente, esse degrado. Não podemos estranhar, portanto, o género de reacção, violento e desabrido, dos apoiantes de Berlusconi, paralelo a uma despudorada instrumentalização do caso.

Ficou bem evidente que se tratou de um gesto isolado de um doente mental. A situação foi clara e nada existe que alimente quaisquer outras suspeitas. De consequência, seria aconselhável, a todas as facções políticas e à imprensa responsável, manter a calma e não exaltar ânimos facciosos.

Mas nada disso se verificou. Após a agressão, esses apoiantes desencadearam reacções de uma agressividade e violência absolutamente impróprias. Não só em debates televisivos - não esqueçamos que quase todos os canais televisivos mais importantes são manobrados por gente de confiança de Berlusconi – como na imprensa de propriedade do mesmo.
No Parlamento, não houve pejo de criminalizar violentamente os adversários políticos, jornais e jornalistas adversos.

Em conclusão, todos os que se opõem ou criticam o Governo; todos os que não aplaudem Berlusconi; todos os magistrados a quem, por desgraça, coube investigar as ilegalidades do grande chefe, são inimigos e devem ser neutralizados.

Perante isto, o meu esforço de encontrar um ponto de equidistância esboroa-se. Impossível apanhá-lo. Afasta-se para horizontes que não atinjo.
Entretanto, o senhor Berlusconi cresceu em popularidade. Era previsível.

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Acima, aludi à linguagem de taberna e que nunca ouvi em qualquer responsável dos partidos de oposição ou nos políticos anteriores à entrada de Berlusconi no Parlamento.
Esses políticos sempre se exprimiram com um italiano decente e controlado, embora aguerrido e mordaz, quando o confronto assim o exigia.

Vejamos agora alguns exemplos do estilo linguístico das chusmas (afora excepções muito decentes) que sustêm ou fazem parte do Governo actual.

Só vota na esquerda quem é um «coglione» (em italiano, é melhor!) – Berlusconi, num comício - asserção repetida.
Na Itália, a esquerda é uma elite de merda; que vá para o raio que a parta” (Che vada morire ammazzata) – Renato Brunetta, ministro da Função Pública, numa manifestação.
“Você é mais bonita que inteligente” – Berlusconi a Rosy Bindi, num telefonema durante um debate televisivo.
Quem segue a carreira de juiz tem uma tara” – Berlusconi - conceito repetido em diversas ocasiões.

Isto é uma pequena amostra do vasto e riquíssimo repertório, no qual, todavia, não entra a fraseologia da “Liga Norte” (partido da coligação de Governo). Esta faz caso à parte. Ali, a grosseria é um status normal.
Alda M. Maia

domingo, dezembro 13, 2009

ESTADO DE DIREITO POSTO EM FRANGALHOS

Congresso do Partido Popular Europeu em Bonn – 9 / 10 de Dezembro - e um discurso onde o Estado de direito foi apresentado como um empecilho à arte de governar um país.
Não entendo referir-me à arte de bem governar, mas à pretensão de manipular a coisa pública.

Após decorridos oito minutos a falar de banalidades sobre a Europa, o orador mudou de registo: “Permitam-me que, agora, fale do meu País.”
Acto contínuo, lançou-se numa catilinária contra tudo e contra todas as instituições desse país democrático a que pertence.
Atacou o Presidente da República, o Tribunal Constitucional, o poder judiciário, a oposição (sempre referida como “a esquerda", quando não “os comunistas”), a imprensa nacional e internacional - na sua opinião, a quase totalidade é da esquerda, obviamente!

O ilustre personagem decidiu expor, aos correligionários europeus, a caterva de motivos que o indignavam e o conduziam a enaltecer as suas “altas qualidades de homem de Estado”, incompreendidas e perseguidas pelo “partido dos juízes”.
Um ataque sem eufemismos, mas servindo-se, como já é seu hábito, de dados irrefutavelmente inventados.

Com um passado cheio de sombras, de desenvolturas ilegais e abusos, a ilustre criatura não admite submeter-se às leis do Estado de direito.
Assim, qual aventureiro da política que é, não teve pejo nem escrúpulos em desacreditar as instituições do País que representa.

Enquanto seguia parte daquela inusitada performance, não pude deixar de reflectir: e se em Bonn, em vez deste indivíduo, falasse um político português, usando o mesmo tom e assunto? Como reagiríamos? Como o receberíamos, quando regressasse a Portugal? À bofetada (nunca aconselhável) ou com gritos de indignação e repúdio?
Podemos conceber muitas críticas em relação aos nossos representantes, mas há algo que devemos reconhecer-lhes: educação, boas maneiras e respeito pelo nosso País.

Vale a pena ler algumas das muitas bacoradas (é o único termo adaptável) que externou no Congresso do EPP, Partido Popular Europeu. Vejamos.

Temos um primeiro-ministro super com mais de 60% de preferências. Há a esquerda que ataca o chefe do Governo, inventando calúnias. Quem em mim acredita, reforça ainda mais a sua confiança. Todos dizem: Mamma mia, onde encontramos um homem forte e duro, com os tomates, como Berlusconi? o tradutor, pudicamente, omitiu esta última expressão.

No nosso País sucede um facto particular. A Constituição italiana diz que a soberania pertence ao povo. O povo elege o Parlamento. O Parlamento faz as leis, mas se estas não agradam ao partido dos juízes da esquerda
a esquerda, para aquele homem, é uma obsessão!estes dirigem-se ao Tribunal Constitucional que é composto por 11 membros da esquerda sobre 15 e ab-rogam (?) as leis feitas.
Em conclusão, a soberania passou do Parlamento para o partido dos juízes. O Tribunal Constitucional transformou-se de órgão de garantia em órgão político, precisamente porque os cinco componentes nomeados pelo Presidente da República são todos de esquerda, já que tivemos, infelizmente, três Presidentes da República consecutivos todos de esquerda.

Temos, todavia, uma grande maioria no Parlamento que trabalhará para mudar este estado de coisas, mesmo com modificações na nossa Constituição.”


Quantas invenções indignas de um primeiro-ministro! Quanta ignorância! Quanta má-fé!

“O Tribunal Constitucional não ab-roga as leis; anula-as. A ab-rogação exprime um juízo político, cuja competência pertence ao Parlamento.
A anulação é um juízo jurídico, nos termos de validade constitucional, e a pronunciá-lo é o Tribunal Constitucional: em ambos os casos reflecte-se uma avaliação negativa sobre as leis
– Michele Ainis, professor de Direito Constitucional.

Somente o digno e actual Presidente da República provém da esquerda e foi eleito pelo Parlamento com o voto geral.
Quanto aos dois precedentes, Óscar Luigi Scalfaro e Carlo Azeglio Ciampi, duas pessoas de alta qualidade moral e política, o primeiro pertencia à Democracia Cristã; Carlo Azeglio Ciampi, ex-governador do Banco de Itália, é um moderado e foi um presidente muito amado pelos italianos.
Os 15 componentes do Tribunal Constitucional são escolhidos entre as personalidades tecnicamente mais competentes e sérias.

Há uma circunstância, em todo este caso, que me deixou escandalizada, e não fui a única: a falta de reacção ou a reacção indiferente - até mesmo de grandes aplausos - à intervenção anómala de Berlusconi, dos congressistas do Partido Popular Europeu.
Que sinais querem enviar estes representantes do centro-direita à Europa?
Admite-se que Peter Hintze, homem de confiança de Angela Merkel, defina o discurso de Berlusconi “verdadeiramente esplêndido”, acrescentando: “Falou como um verdadeiro combatente que luta contra a esquerda europeia”!
Joseph Daul, presidente do PPE: “A intervenção de Berlusconi? Sacrossanta. Fez um óptimo discurso, muito escutado e apreciado.”

Estes senhores aceitariam que as instituições dos próprios países fossem atacadas, enxovalhadas, no modo como o fez Berlusconi, em sede internacional?
Ou a anomalia populista ali demonstrada entra nas suas recônditas preferências?
Eu não creio. E como não creio, só me resta qualificar aqueles congressistas sem um mínimo de dignidade política.

Quanto à Senhora Merkel, também presente, deveria reservar os seus beijinhos a pessoas moralmente límpidas. Um diplomático aperto de mão seria mais oportuno.
Alda M. Maia

domingo, dezembro 06, 2009

DEMOCRACIA E LEGALIDADE

“Hoje em dia, é tacitamente aceite, ou quase, que as democracias vivem no imediato e não forjam medidas para o futuro, para as necessidades e problemas do futuro” – Giovanni Sartori.

Ouvindo parte do debate de sexta-feira passada na Assembleia da República, partindo do que Giovanni Sartori aponta como uma critica, pensei nos nossos problemas e necessidades imediatas, os quais pesam toneladas na suportação do hoje e apresentam negrumes nas incertezas do amanhã.

Assim, o que esperaria dos nossos representantes seria um empenho unânime sobre o que aflige a economia portuguesa, além da existência de um alto índice de desemprego. È normal que expressem essa diligência dentro das mais acesas discussões, das razões mais contrastantes, das argumentações mais variegados.

Afinal, o que se verificou e qual foi esse único e exclusivo empenho?
Toda a oposição, em vez de encalçar o Governo no que crêem não ser justo ou que deve ser de primária importância, entendeu dar lugar a diatribes sobre as escutas telefónicas do Primeiro-Ministro e ao pedido, inquisitorial, de esclarecimentos acerca da “espionagem política” – frase retórica e inoportuna que o ministro da Economia, Vieira da Silva, poderia ter evitado.

Quanto ardor e quanto azedume, numa questão que depende de uma autoridade soberana, independente, qual é a magistratura!
Quando é que despirão as vestes de campanha eleitoral?

No que diz respeito a frases infelizes – sempre concernentes ao processo “Face Oculta” – houve afirmações que me deixaram boquiaberta.

No programa “Prós e Contras”, o professor de Direito Penal, Paulo Pinto Albuquerque, asseriu que essas famosas escutas deveriam ser reveladas: “não por relevância penal, mas por relevância social”.

Decididamente, não aproveitei nada do tanto que li sobre a função do poder judiciário!

A este órgão de soberania cabe-lhe a “relevância penal” e, sobre essa relevância - somente sobre essa - apurar a verdade e aplicar a lei ou também se deve preocupar com problemas sociais?!
Ainda pensei ter confundido a especialização do professor Albuquerque, pensando-o professor de Filosofia do Direito, por exemplo (neste momento, veio-me à ideia Norberto Bobbio). Mas não. É mesmo professor de Direito Penal.

Também ouvi falar que, sempre nas mui citadas escutas, se aventou um possível “crime contra o Estado de direito”. Crime ou crimes?
O Estado de Direito – se também, aqui, não assimilei mal – é toda a estrutura de uma democracia: “liberdade individual, cultura legal, separação de poderes, Constituição”.
Será que temos epónimos de Che Guevara no executivo?

Moral da história: não seria recomendável, aos eleitos do povo, que saibam pensar, sempre, duas ou as vezes necessárias e usando o bom senso, antes de lançar às plateias conceitos reboantes?
Se disso não serão capazes, mudem de actividade. O País apenas necessita de serenidade e firme determinação, da parte de todas as forças políticas, em procurar a solução dos problemas que o apoquentam.

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Democracia e Legalidade
: este foi o tema de uma consistente polémica entre uma grande editorialista italiana (Bárbara Spinelli) e um político, ex-magistrado (Luciano Violante).

O político (centro-esquerda), em resposta a um artigo da editorialista, a qual desenvolvia o princípio que não pode haver alternativa entre democracia e legalidade, pois são sinónimos, Violante defende o seguinte:
“Nas democracias ocidentais, quem é investido pela soberania popular (princípio democrático) tem um estatuto particular.
Enquanto todos os cidadãos são iguais perante a lei (princípio de legalidade), os eleitos para os mais altos cargos do Estado podem ser isentos da responsabilidade penal ou, em modo absoluto, por determinados crimes e a tempo, no período que exercem um específico cargo político”.

E mais uma vez, conhecendo bem os problemas judiciários de Berlusconi e a sua tese funambulesca que, sendo ele o supremo (?) eleito do povo, não pode ser perturbado com processos penais, fiquei desconcertada.

A ambiguidade de Luciano Violante não me surpreende. Aspira à Presidência da República (assim me parece) e estende a mão à maioria berlusconiana. Todavia, acho inaceitável e aberrante a sua concepção de legalidade.

Na minha maneira de ver a política, entendo que os seus representantes devem cultivar uma única ideia de isenção: estar acima de qualquer suspeita sobre a própria integridade. Se têm problemas com a justiça, que os resolvam, antes de pretenderem entrar na arte de administrar a coisa pública.

A senhora Bárbara Spinelli não deixou Violante sem resposta - resposta esta que aplaudo fragorosamente:
O que critiquei, no meu artigo de 29 de Novembro, é a presumível antinomia entre o princípio democrático e o princípio de legalidade.
A antinomia não existe, pelo simples facto que a democracia, a Constituição prescreve-o claramente no artigo 3, tendo como ponto fixo a igualdade dos cidadãos perante a lei. Separar os dois princípios destrói, seja a democracia, seja a legalidade
”.
Alda M. Maia

terça-feira, dezembro 01, 2009

O PODER DOS BLOGUES
Complemento do post precedente
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Este é o cartaz que centenas de milhares de jovens deram a público e que é fruto de uma iniciativa de um blogue: www.noberlusconiday.org
As adesões à organização desta iniciativa chegaram a 350 mil. Na sua maior parte, gente jovem: “estudantes, investigadores, operários, empregados”.

O responsável da organização e presidente da associação, Alessandro Toffu, é bem claro, quando explica: “Somos nós quem decide o percurso do cortejo, somos nós que decidiremos quem falará do palco. Os únicos que tomarão a palavra serão pessoas comuns: nenhuma personagem política, nenhuma personalidade politicamente incómoda”.

A iniciativa obteve a publicidade que merecia, quer na Internet, quer na imprensa escrita, onde se pode ler todo o género de notícias e vários artigos dedicados a esta inédita manifestação do próximo sábado: além de inédita, espero que seja maciça, pesada.

Traduzo o que o cartaz indica como finalidade deste movimento.

Uma Manifestação Nacional para solicitar a demissão de Berlusconi.
Uma mobilização pacífica, independente dos partidos e o primeiro passo na direcção de uma classe dirigente mais digna.
Os cidadãos, estranhos a filiações políticas, fora dos partidos, descem à rua e pedem a demissão de Berlusconi.
Porque, quem:
Nega a igualdade dos cidadãos perante a lei
Ultraja a ética pública e a dignidade da Itália
Espezinha a liberdade de informação
Ataca a Constituição
Não Pode Ser Presidente do Conselho

Na foto de Berlusconi, ao fundo: A política deve ser feita com as mãos limpas – Sandro Pertini, ex Presidente da República italiana.
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Alda M. Maia