segunda-feira, dezembro 31, 2007

A PALAVRA MAIS BONITA DO MUNDO

O jornal La Reppublica, de quinta-feira passada, 27 Dezembro, dedicou uma página inteira a um concurso lançado pela revista literária alemã – Kulturaustausch – a fim de classificar a palavra mais bonita do mundo. O critério de escolha baseava-se na musicalidade e significado do termo.

Apenas li o título, pensei imediatamente no nosso vocábulo saudade, pois não seria a primeira vez que entra em tais classificações. Não me enganei: figura nas primeiras sete classificadas, ocupando o sexto lugar.

Provenientes de 58 países de todos os continentes, chegaram milhares de palavras - a Agência Ansa indica 2500 e 60 países.
O júri seleccionou as primeiras sete.

O número um da lista é a palavra turca YAKAMOZ que significa: reflexo da lua na água.
Como significado, é lindo, poético. Quanto a musicalidade, visto que desconheço a pronúncia, não posso exprimir juízos.

Em 2.º lugar: hu lu: dormir, respirando profundamente (ressonar?) – China.

A terceira palavra seleccionada foi volongoto: caótico; língua africana de uma região do Uganda.

Quarto lugar: oppholdsvaer: a luz do dia depois da chuva; Noruega.

Chega-se à 5.ª classificada: madala: graças a Deus; língua africana Hausa.

Em 6.º lugar: saudade: traduziram apenas como nostalgia; BRASIL (!?)

Aqui, fiquei ligeiramente perplexa, mas pensei que, provavelmente, houve muitos participantes brasileiros, e passe a incorrecção.
Porém, continuando a leitura, o jornalista salienta que a “palavra espanhola caracol" (face de carvão), enviada por muitos argentinos, poderia ter entrado nos primeiros lugares.

A este ponto, a minha perplexidade cresceu e começou a azedar-se. Se caracol (enviada por argentinos) faz parte da língua espanhola – língua que se fala na Argentina - surge uma pergunta muito legítima: que língua se fala no Brasil?
Ademais, o lindo termo saudade é qualquer neologismo tipicamente brasileiro ou é património do vernáculo português?
Uso a expressão “património do vernáculo português” que difere um pouco de “património da língua que se fala em Portugal e no Brasil”.

Kulturaustausch, como revista literária, pode ser excelente; como permuta de culturas (conforme o significado do próprio título), seria aconselhável que fosse menos desenvolta, quando indica a língua de origem das palavras eleitas.

Se, pelo contrário, o deslize foi do autor da reportagem – Marco Ansaldo - de La Repubblica, não me surpreende. Nos jornais italianos, relativamente ao nosso País, são useiras e vezeiras estas falhas.

Às vezes sonho que temos um corpo diplomático, em Roma, muito atento a certas incorrecções sobre Portugal. Não passa de sonho.

Embora este caso que hoje comento seja uma questão de lana-caprina, outros há que, por ignorância ou superficialidade, nos diminuem.
Mas os Senhores Diplomatas têm programas sociais que lhes não deixam tempo para dedicar atenção às demais causas; ao fim e ao cabo, trata-se de insignificâncias!...
Paro o prestígio e bom nome de um país, todavia, também concorrem as insignificâncias.

A auto-estima, a nível quase zero, da parte de cá; do outro lado, indiferença: não haverá modo de abanar violentamente a passividade destes lusitanos acomodados e xenófilos sem brio?

Referindo-me ainda à votação da palavra do ano 2007, no sétimo lugar colocaram PEREKOTIPOLE: o corredor do deserto; Ucrânia.

Parece-me que SAUDADE merecia o primeiro lugar: pela complexidade e beleza do significado; pela intensidade poética; pela suavidade do som; por ser palavra intraduzível - aliás, esta também era uma característica necessária para a selecção das palavras. Mas isto é uma opinião muito de parte, claro está!

Saudade sintetiza todos os requisitos, mas ganhou Yakamoz, e talvez acertadamente. Como se pronunciará?

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Últimas horas do fim de 2007: que decorram alegres.
Amanhã, primeiro dia de 2008: que se anuncie esplêndido, mesmo com chuva e vento, e que continue com dias positivos até 31 de Dezembro, se não é pedir de mais.
Alda M. Maia

segunda-feira, dezembro 24, 2007

E COM FLORES, BOAS FESTAS!


Fantin-Latour

Renoir
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Alda M. Maia

terça-feira, dezembro 18, 2007


PRÉMIO A AUNG SAN SUU KYI

Sob proposta do Presidente da Câmara de Roma, a Junta Municipal decidiu atribuir a Aung San Suu Kyi a edição 2007 do prémio “Roma Pela Paz e a Acção Humanitária”, dado o seu empenho pacífico e não violento que, de há anos, desenvolve a favor da liberdade, a democracia e os direitos humanos na Birmânia.

Quinta-feira, 20 Dezembro, às 21 horas, por ocasião do Concerto de Natal da Academia de Santa Cecília, o Presidente da Câmara de Roma, Walter Veltroni, segundo a vontade expressa pela Senhora Aung San Suu Kyi, entregará a Roberto Baggio o prémio “Roma pela Paz e a Acção Humanitária” de 2007, na convicção que a sua grande notoriedade de campeão do desporto, num país onde o futebol é muito popular, possa amplificar a notícia na Birmânia e contribuir para o processo de reconciliação e para a liberdade do povo birmanês
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www. articolo21.info

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Aplausos para a atribuição deste prémio.
Interessante a ideia de entregá-lo a Roberto Baggio, o famoso avançado, muito aplaudido entre os monges birmaneses, sobretudo os mais jovens. Baggio, nos anos oitenta, se não recordo mal a data, converteu-se ao budismo.
Inteligente escolha de Aung S. Suu Kyi, portanto, em delegar em Baggio o retiro do prémio.

Dá gosto ler este género de notícias.
Oxalá que o caso Birmânia mantenha sempre uma chama acesa em todos os meios de informação mundiais. Somente os olhos, permanentemente apontados para aquele desgraçado país, conseguirão atenuar a crueldade dominadora de generais sem alma nem honra.

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A Assembleia Geral das Nações Unidas votou sim a favor da moratória sobre a pena de morte.
Outra boa notícia que se lê com total satisfação e amplo sorriso.
Alda M. Maia

sexta-feira, dezembro 14, 2007

O FRANGO DE TRILUSSA
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No mar de notícias que envolveu a cimeira UE / África, a situação económica deste Continente foi matéria obrigatória, obviamente.
Quando li do crescimento de 8% (se não recordo mal) de Angola, imediatamente me veio à memória um soneto do poeta dialectal italiano, Carlo Alberto Salustri (1871 – 1950), mais conhecido como Trilussa.

É proverbial, na Itália, a citação do «frango de Trilussa», quando as estatísticas apresentam médias incontroversas, mas nem sempre espelham a realidade de uma situação ou de um país.

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La Statistica

Sai ched’è la statistica? È ‘na cosa / Che serve pe’ fa’ un conto in generale / Che la gente che nasce, che sta Male, / Che more, che va in carcere e che sposa.

Ma pe’ me la statistica curiosa / È dove c’entra la percentuale, / Pe’ via che, lì, la media è sempre eguale / Puro co’ la persona bisognosa.

Me spiego: da li conti che se fanno / secondo le statistiche d’adesso / Risurta che te tocca un pollo all’anno:

E, se nun entra ne le spese tue, / t’entra ne la statistica lo stesso / Perché c’è un antro che ne magna due.

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A Estatística

Sabes o que é a estatística? É uma coisa
Que serve para fazer uma conta em geral
Da gente que nasce, que está doente,
Que morre, que vai para a cadeia e que se casa.

Mas para mim, o curioso da estatística
É onde entra a percentagem,
Pelo motivo que, ali, a média é sempre igual
Mesmo com a pessoa necessitada.

Explico-me: das contas que se fazem,
Segundo as estatísticas de agora,
Resulta que te toca um frango por ano:

E, se não entra nas tuas compras,
Entra-te igualmente na estatística
Porque há um outro que manduca dois.

sexta-feira, dezembro 07, 2007

O ACORDO ORTOGRÁFICO SAIU DO LETARGO

Só me pergunto por que não deixaram na gaveta, a dormir in aeternum, o novo acordo ortográfico entre os países de língua oficial portuguesa!
Que benefício traz à nossa língua este contínuo remexer na ortografia? Porventura o acordo luso-brasileiro de 1945 já não merece crédito, talvez porque o acham obsoleto, incompleto, complicado? E quem o diz? Filólogos, Linguistas que se divertem a alterar, periodicamente, a estrutura da língua que falamos e escrevemos (o que não creio)?
É assim tão difícil a escrita do nosso idioma? Como se o francês, italiano ou espanhol fossem mais acessíveis!...

Há uma circunstância que se me antepõe a todas e quaisquer outras considerações.
O estudo acurado e a tenacidade como os técnicos do acordo de 1945 – o grande filólogo e lexicólogo Francisco Rebelo Gonçalves e o filólogo brasileiro, Prof. Sá Nunes - estabeleceram uma certa unidade da língua falada nos dois países, foi um trabalho tão efémero ou superficial que, passados 45 anos, de novo se teve de alterar 1,8% da ortografia do português europeu?
O que estes dois grandes estudiosos fizeram não mereceria uma maior atenção e respeito? A conferência de 1945 foi insignificante, imperfeita? Não, não foi.

É interessante reler o prefácio de Ribeiro Couto (da Academia Brasileira de Letras e da Academia das Ciências de Lisboa), em 1947, do “Tratado de Ortografia da Língua Portuguesa” de Rebelo Gonçalves.
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Lê-se na página XI: Se a língua portuguesa tiver que evoluir no Brasil para variações sintácticas e prosódicas cada vez mais sensíveis, como é possível que suceda ao longo dos anos, o Acordo de 1945 não será de obstáculo a essa evolução”.

É justo que assim seja; mas deve o português de Portugal correr atrás das evoluções brasileiras? Falamos uma língua ou passou a dialecto sem raízes?

Obviamente que as variações são muitas, sobretudo prosódicas. Crescem, então, as perplexidades: por que motivo não devemos manter a nossa ortografia mais próxima da etimologia e menos da “corrente fonética”, ao contrário do que agora pretendem? É premente essa necessidade?

Uns aduzem que é para facilitar a aprendizagem do português. Dou uma sugestão: reduzam-no à linguagem das mensagens dos telemóveis, eliminando regras; a modernidade e facilitismo ficam assegurados.
Outros justificam que não “faz sentido que em instâncias internacionais apareça uma variante da língua que se diga brasileira, quando a língua é a mesma”. Não vejo onde esteja a dificuldade.
Os categóricos afirmam que só manifesta ignorância ou ligeireza quem não aceita esta nova alteração ortográfica.
Os defensores e propulsionadores são os únicos iluminados! Não obstante, apraz-me fazer parte da percentagem dos “ignorantes/superficiais”!
Uma língua viva evolui dentro das leis naturais, não de acordos pro tempore.

Este acordo centra apenas a questão ortográfica, como é óbvio. Porém, a sintaxe brasileira, o modo brasileiro de se exprimir, aproxima-se da sintaxe portuguesa? Não me parece. Em tal caso, da parte nossa, é sobretudo a eliminação de consoantes – consoantes, na sua maioria, com funções ortoépicas – que faz a diferença, contribuindo para a unificação? Não, não faz, e as diferenças sempre existirão.

Não é anormal que haja variações semânticas entre o português de Portugal e o português falado nos demais territórios de língua oficial portuguesa.
A linguagem desses países fatalmente que sofre a influência do meio, costumes e muitos outros factores próprios da situação geográfica em que se encontram; é inevitável. Todavia, por mais voltas que lhe dêem, a base, a cepa donde emana, será sempre o português que os Portugueses deixaram.

Se ao nosso vocabulário chegam novas palavras daí provenientes, bem venham, já que é uma riqueza, como sempre foi, para o léxico português. E aí, sim, a modernização impõe-se.
Não julgo estranho, portanto, que haja as tais variações sintácticas, prosódicas ou semânticas.

O que me parece anómalo e pouco decoroso é a nossa síndrome dos «apenas» “10 milhões de falantes europeus contra 200 milhões na América e em África” (Francisco J. Viegas - dupla identidade?) e, de consequência, o nosso idioma ter de balançar, periodicamente, ao sabor das oscilações do português dessas áreas.
Mais ainda, o receio de ficarmos sufocados ou “orgulhosamente sós”. E daí?!

De novo, pergunto: onde nasceu a língua portuguesa? Não seria mais positivo, e óbvio, que este português da velha Europa representasse um ponto firme de referência?

Como não soubemos ou não quisemos potenciar o ensino do português fora do nosso território, o que foi imperdoável - nisto tem razão Francisco José Viegas - não vejo razão para abdicarmos daquela dignidade – sim, dignidade, digamo-lo sem receios de retórica balofa - que é peculiar de quem sempre curou o prazer de se exprimir e ler o português de Portugal: o português que não quer afastar-se, acossado, das principais raízes donde proveio. E não me perturbará saber se, para defender esse status quo, seremos apenas 10 milhões!
Alda M. Maia