segunda-feira, julho 28, 2014

A BELEZA DA EQUIDISTÂNCIA

Concentrando a nossa atenção na Faixa de Gaza, ouvindo as notícias e lendo tudo o que é possível ler sobre esta tragédia infinita, cada um reage conforme o que lhe dita o seu sentimento de humanidade ou ausência dele; neste último caso, são os facciosismos no seu máximo esplendor.
Desenvolvem-se muitas outras tragédias que mereceriam igual atenção, desde o Iraque à Síria, Nigéria, Sudão, etc. A indiferença com a actual perseguição aos cristãos nestes países, por exemplo, não é só indecente, mas desconfortante.

Mas voltemos aos facciosismos que explodiram em todas as direcções e países, no que concerne a Faixa de Gaza. 
Dou sempre o máximo valor a quem sabe observar e procura a equidistância nos seus valores de apreciação. Por esta razão, transcrevo um editorial publicado, ontem, no jornal La Stampa. Excluí apenas um parágrafo que em nada diminui este editorial.

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“O ANTI-SEMITISMO E O PRETEXTO DO CONFLITO
Bastaria o estilicídio de perdas humanas para considerar a crise de Gaza como uma calamidade, seja política, seja moral. Mas não basta. Não somente a dita comunidade internacional não parece estar em condições de assumir-se uma estratégia que seja capaz de pôr fim a um conflito claramente sem saída para nenhuma das partes em causa, como, ao mesmo tempo, as toxinas do conflito, postas em circulação, transmitem-se, inevitavelmente, muito para além do território onde o mesmo se verifica.

Na França, as manifestações anti-israelitas degeneraram, em alguns casos, em ataques anti-semitas, enquanto os pais das crianças nas escolas hebraicas exprimiam preocupação pela sua segurança.
Na Alemanha – o país que jamais negou a existência de campos de extermínio, como também assumiu o peso da culpa histórica do Holocausto - um grupo de manifestantes em marcha ia acentuando o slogan «Hamas, Hamas, Juden ins gas» (judeus para o gás).

Estará crescendo na Europa o anti-semitismo? E que ligação existe entre o anti-semitismo e o conflito israelo-palestiniano?
Poder-se-ia responder que o anti-semitismo, na Europa, nunca desapareceu totalmente, não obstante a trágica lição da história. Aliás, como demonstra o caso de alguns países da Europa centro-oriental, pode existir anti-semitismo mesmo onde já não existem judeus.

De igual forma, a aberrante mixórdia entre um certo radicalismo anti-imperialista e anti-semita filonazi não é nova. (…)
Precisamente porque o bicho do anti-semitismo nunca desapareceu, mas, pelo contrário, sobreviveu aninhado nos esgotos da incultura e da violência, é urgente traçar, sem ambiguidades, um confim intransponível entre anti-semitismo e críticas à política e às acções e Israel.

São imensas as vozes que, em Israel, exprimem dúvidas, críticas, condenações: os jornalistas de Haaretz que denunciam o bombardeamento indiscriminado de Gaza; os movimentos pacifistas e para os direitos humanos; Avraham Burg, ex-presidente da Agência Hebraica e durante alguns meses Presidente da República, é de opinião que o sionismo – nato para proporcionar aos judeus, com a criação de um Estado Hebraico, uma protecção contra as seculares perseguições a que estiveram sujeitos – actualmente acabou injusta e paradoxalmente por fazer recair sobre os judeus, em qualquer parte do mundo, as consequências da política seguida pelo Estado de Israel em relação aos palestinianos.

E isto não acontece somente em Israel, mas também nos Estados Unidos e na Europa, onde certamente não faltam judeus que exprimem críticas, mesmo duras, ao drama de Gaza e, em geral, à questão palestiniana. Tantas vozes hebraicas que se torna ridículo procurar desqualificá-las com a tortuosa definição de “judeus que se odeiam a si mesmos”, inventada pela direita hebraica nos Estados Unidos. Em nós, pelo contrário, surge a suspeita que sejam precisamente estas vozes críticas que tomam mais a peito o destino do hebraísmo e dos judeus em Israel e no mundo.

No momento em que, sem indulgência, declaramos inadmissível passar da crítica e também da condenação a tudo o que está a acontecer em Gaza ao anti-semitismo, devemos, no entanto, condenar com igual clareza a operação desonesta de quem anula aquele confim intransponível, partindo da parte oposta.

É logicamente insustentável e politicamente indecente definir anti-semita quem quer seja que se oponha a uma ocupação que dura desde 1967; quem considera que a expansão dos colonatos torne absolutamente fraudulenta a proposta dos dois Estados; quem faz notar que, quando em Gaza as mortes entre a população civil são 80% do total das perdas humanas, é um absurdo defini-las «danos colaterais»; quem se preocupa que, sob o ponto de vista político, o único resultado desta operação apresentada como anti-Hamas acabe, inevitavelmente, por produzir, não somente em Gaza, mas também no West Bank, o reforço dos fundamentalistas de Hamas e, paralelamente, o enfraquecimento de Abu Mazen.

Com efeito, as críticas a Israel não nos deveriam fazer esquecer o extremismo de Hamas, o qual insiste nos seus insensatos lançamentos de mísseis; que continua a negar o direito de existência de Israel, até mesmo quando aceita um compromisso com os moderados da Autoridade Palestiniana, o que prefigura, no seu exercício do poder em Gaza, um regime que certamente não desejamos ao povo palestiniano.
Devemos então recordar que não são os moderados que prevalecem quando se combate, sobretudo em presença de uma macroscópica assimetria de potência militar e de um conflito com angustiantes perdas civis.

Por este motivo, se não se é sensível a considerações humanitárias, dever-se-ia, pelo menos, ser sensível ao realismo: a operação militar contra Gaza concluir-se-á, provavelmente, com uma vitória táctica de Israel, mas com uma sua derrota estratégica, além de uma perda de apoio e consensos, mesmo da parte de quem, na Europa e também na América, seria difícil definir como inimigo de Israel ou até mesmo anti-semita.

O problema ultrapassa Gaza e a dimensão militar do confronto, além da problemática humanitária. Confirma-o o facto que o secretário de Estado americano, Kerry, disse ontem que, se não se encontrará uma saída política para o conflito israelo-palestiniano, Israel tornar-se-á num «Estado de apartheid». 
A sua, e a nossa, é uma preocupação por Israel, não contra Israel.

Seria interessante reler-se o que escreveu Annah Arendt, no momento da fundação do Estado de Israel: que sem um acordo com os árabes, Israel seria destinado a depender, para a sua sobrevivência, da protecção, inevitavelmente aleatória, dos Estados Unidos e a converter-se em «uma Esparta» obrigada a dar prioridade absoluta às exigências de autodefesa.

É verdade que uma solução política é extremamente problemática, e não exclusivamente por responsabilidade de Israel. Todavia, partindo dos factos, torna-se difícil negar que a ideia de uma solução militar seja absolutamente ilusória.  -  Roberto Toscano; La Stampa - 27 / 07 / 2014

segunda-feira, julho 21, 2014

UMA TRAGÉDIA NA TRAGÉDIA

O abate do avião MH17 da Malaysia Airlines, em território ucraniano e com 298 passageiros a bordo, é já uma grande tragédia: uma tragédia absurda e totalmente injustificada.
Porém, dentro de tão grave acontecimento, despontou um drama ainda mais absurdo e que atingiu todos os cumes a que pode chegar a barbárie humana. Chamar-lhe-ia uma tragédia na tragédia.

Para além do conhecimento de tantas vidas violentamente eliminadas, entre as quais dezenas de crianças, impressionou-me a descrição da queda dos corpos (ou parte deles), os quais choviam do céu e se dispersavam naqueles campos de papoilas e de milho já com espigas - alguns corpos ainda ligados aos cintos de segurança.  

Para qualquer povo civilizado, um espaço de tanto horror tornar-se-ia sacro e fechar-se-ia imediatamente, a fim de evitar a invasão de pessoas sem qualificação para enfrentar e resolver todas as circunstâncias que urge resolver com seriedade e sensibilidade.  
Pelo contrário, naquela parte da Ucrânia e perante uma tragédia sem fim, a falta de civismo, a falta de piedade por aqueles corpos, o respeito que mereceriam, tudo isto foi completamente ignorado. 
Não ousem a justificação que é espaço de guerra civil. Não há querelas que não contemplem pausas, sobretudo quando foram imoladas vítimas que voavam a 10 mil metros de altitude e nada tinham que ver com as politiquices sujas da Rússia, provenientes, na sua maior parte, de países europeus.

É incrível o panorama que muitos jornalistas puderam observar e descrever. Os habitantes da zona, e não só, moviam-se à vontade no meio das vítimas e destroços, semeados por vários quilómetros.
Os chacais aproveitaram a situação e trataram de aligeirar aqueles cadáveres de dinheiro, jóias, cartas de crédito. Os corpos, à semelhança de peças metálicos, metidos em sacos de plástico e colocados nas margens... Prefiro ficar-me por aqui. Demasiado horror e barbárie. Tudo já bem documentado, aliás.
O que é inegável é o tacticismo dos separatistas ucranianos e da Rússia em tudo dificultar para mais facilmente fazer desaparecer provas que os incriminem. Tiveram todo o tempo e oportunidades.  

Mas à barbárie explícita e a estas tácticas correspondeu uma reacção não menos grave: a reacção indolente, indecisa, mercantil da União Europeia. Não se pode comprometer os interesses económicos, obviamente!

Por que não reagiu imediatamente, exigindo medidas adequadas e requerendo energicamente a entrada de técnicos, indispensáveis num caso de tal importância internacional? Como conseguiram digerir o espectáculo triste e deprimente, prolongado no tempo, daquelas pobres vítimas expostas a uma decomposição, inevitável, à vista de quem por ali passasse e, mais tarde, encerrados num comboio de mercadorias com uma alegada refrigeração?

A Holanda perdeu 193 cidadãos. Sendo o país mais lesado, por que não gritou, bem alto e em todas as direcções, o seu direito a acorrer, de imediato, ao local do desastre, isto é, do crime? Por que razão somente agora foi permitida, e tolerada, a entrada dos seus técnicos?
Onde se viu, na União Europeia, uma forte indignação e reacção adequada contra actos absolutamente inaceitáveis em países civilizados como os que se verificaram no Leste da Ucrânia?

Os cadáveres dos nossos concidadãos, saqueados, emporcalhados, derrubados por mercenários agrupados em nome de uma causa violenta hoje e perdedora amanhã, tentando ocultar, sacrílegos, as provas da sua intenção criminoso, estarão nos livros de história de amanhã como acusação feroz a esta Europa, a qual, fingindo detestar a guerra e falar de paz para fazer negócios, estupidamente semeia a cizânia da próxima guerra nos confins da União. Que chegará e será cruel” – Gianni Riotta; La Stampa, 21/07/2014.

Terá razão? No que se refere à Europa, plenamente de acordo. No que concerne a “próxima guerra nos confins da União”, prefiro ser optimista. Mas poderemos ser optimistas? Regressam as dúvidas.

segunda-feira, julho 14, 2014

VOZES COM ESTE EQUILÍBRIO DEVERIAM SER
MAIORIA ESMAGADORA 

Transcrevo um artigo do conhecido escritor e dramaturgo israelita, Abraham B. Yehoshua, publicado ontem no jornal “La Stampa” com o seguinte título: "Não são terroristas, mas somente inimigos". 
Sempre admirei o equilíbrio e bom senso deste escritor. Só lamento que não haja, em todo o Médio Oriente, uma maioria esmagadora de vozes como esta a iluminar definitivamente aqueles cérebros embrutecidos por guerras e guerrilhas - de ambos os lados - que nada mais compreendem senão violência, represálias, intransigências.
Há uma grande percentagem de israelianos pacifistas e cansados de guerras. Uma renovação dos próprios dirigentes seria mais que oportuna.    


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“NÃO SÃO TERRORISTAS, MAS SOMENTE INIMIGOS”
Quando o Estado de Israel foi fundado em 1948, os jordanos bombardearam Jerusalém, puseram-na sob assédio e mataram centenas dos seus cidadãos. Os combatentes da Legião Árabe conquistaram os centros hebraicos de Gush Etzion, na Judeia, trucidaram muitos israelitas e assassinaram, a sangue frio, numerosos prisioneiros.
Mas durante todos aqueles meses de guerra, dura e brutal, ninguém definiu os jordanos “terroristas”. Eram “inimigos”.
E apesar do derramamento de sangue, houve contactos entre oficiais israelitas e jordanos para chegar a um acordo de um cessar-fogo e a assinatura de uma trégua precária, obtida em 1949, graças à mediação das Nações Unidas.

Antes da “Guerra dos Seis Dias”, em 1967, os sírios bombardearam os centros habitados da alta Galileia, mataram e feriram não poucas pessoas. Todavia, ninguém definiu a Síria “Estado terrorista”, mas sim “Estado inimigo”. E não obstante o Egipto e Síria declarassem abertamente a sua intenção de destruir Israel, o Primeiro-Ministro israelita, em cada abertura do ano parlamentar, lançava um apelo aos seus líderes para que aviassem colóquios, a fim de restabelecer a calma e atingir um acordo de paz.

Que sucedeu, portanto, depois do retiro de Israel da Faixa de Gaza, a evacuação dos colonatos hebraicos e a transferência do controle de Gaza para o Hamas, que nos impeça de definir o seu governo “inimigo” em vez de “terrorista”?

Porque este adjectivo é mais incisivo do que o adjectivo “inimigo”? Ou sugere que, lá no fundo do coração, ainda vemos a Faixa de Gaza como parte da Terra de Israel, um lugar onde tentáramos, sem sucesso, de nos instalarmos e ao qual talvez esperemos regressar e, portanto, não consideramos os seus habitantes como cidadãos de um Estado inimigo, mas como árabes israelianos entre os quais operam células terroristas?

Ou talvez nos apercebamos de um sentido de responsabilidade para com a população de Gaza - contrariamente ao que se passava com os habitantes da Síria ou Egipto - e, por esse motivo, continuamos a fornecer-lhe carburante, electricidade, alimentos e, ao mesmo tempo – e esta é a coisa mais importante – recusamo-nos propor ao Governo de Hamas de negociar connosco, exactamente como o fizemos, no passado, com sírios, jordanos e egípcios?

É possível que todas estas perplexidades e complicações derivem do temor que eventuais colóquios com Hamas para um cessar-fogo e uma trégua estável possam “enfraquecer” Abu Mazen. Mas, provavelmente, os mortos em Gaza enfraquecem ainda mais aquele que se considera o líder do povo palestiniano. E também supondo que seja esta a nossa preocupação, resta a pergunta: por que razão não soubemos aproveitar o Governo de Unidade Nacional palestiniana, recentemente instituído, e do qual Hamas é membro, a fim de aviar um diálogo com esta organização?

A intensa frustração de Hamas deriva, na minha opinião, de uma substancial falta de reconhecimento da sua legitimidade aos olhos de Israel e de grande parte do mundo. Uma frustração que o leva a cometer devastantes actos de desespero. Por esta razão, é importante considerar Hamas, pelo menos como um inimigo legítimo com o qual poder chegar a um acordo ou contra o qual combater, num embate armado frontal, e com tudo o que isto comporta. Foi assim que agimos no passado com os países árabes.

Enquanto definiremos Hamas um bando de terroristas que se sobrepôs a uma população inocente, não poderemos parar os bombardeamentos no Sul de Israel com uma adequada reacção militar. Mais importante ainda, não poderemos negociar abertamente com o seu Governo para chegar a um acordo gradual que compreenda uma supervisão internacional da remoção dos mísseis da parte de Hamas e do bloco aéreo, marítimo e terrestre de Gaza por parte de Israel, além de abrir passagens na fronteira para permitir o trânsito de trabalhadores, assim como eventuais corredores de trânsito seguro entre Gaza e a Cisjordânia.

Mas se, dirão os mais cépticos, Hamas não desejará negociar connosco? Neste caso, propor-lhes-emos de o fazer no âmbito do Governo de Unidade Palestiniana. E se mesmo assim continuasse a recusar, então combateremos em forma legítima, segundo as regras da guerra.

Não esqueçamos, todavia, que os palestinianos de Gaza são nossos vizinhos para a eternidade, como nós o seremos para eles. Não sanaremos este abcesso sangrento com discursos sobre terrorismo, mas com o diálogo ou com a guerra, lutando contra um inimigo legítimo para o qual não  temos reivindicações territoriais nem qualquer outra pretensão que não seja a de um cessar-fogo. – Abraham B. Yehoshua; 13 /07/2014 -  La Stampa

segunda-feira, julho 07, 2014

EXTREMISMOS OPOSTOS

Iniciemos com o primeiro caso. Segundo o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), a lei francesa que proíbe o uso do véu integral islâmico em lugares públicos é legítima. "Não viola o direito à liberdade de religião nem o direito à vida privada".

Aprovada em 2010 e posta em vigor em Abril de 2011, essa lei proíbe “a dissimulação do rosto em lugares públicos”, isto é, o uso do burqa ou niqab em ruas e praças, lugares abertos ao público ou destinados a serviços públicos. Às mulheres que não respeitem a lei, será aplicada uma multa de 150 euros (ou um estágio de “educação cívica”).
As pessoas que obriguem as mulheres a cobrir-se completamente incorrem numa pena de um ano de prisão e 30.000 euros de multa.
A lei persegue o objectivo legítimo de proteger os direitos e as liberdades de outrem e de garantir o respeito pelos mínimos requisitos do viver em comum”.   

Em 2011, uma rapariga francesa de 24 anos que usava o burqa recorreu para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, alegando que a lei antiburqa fosse “discriminatória e contrária à liberdade de religião”.
 O Tribunal não lhe deu razão e penso que tenha emitido uma sentença justa e oportuna.

Em Turim, tive ocasião de observar, na rua, mulheres (não sei se jovens adolescentes, pessoas adultas ou idosas) empacotadas num vestuário que me deixava atónita e, paralelamente, triste.  
Dizem que o burqa deixa descoberto apenas os olhos naquele “túmulo móvel”. O que eu via, à altura da vista, era um buraco ornamentado por uma rede e seria bem difícil descortinar os olhos daquelas mulheres. Não sei como conseguiam ver com clareza o caminho que percorriam.
E também não sei como vêem a vida que lhes corre ao lado e onde não lhes é consentido integrar-se.

Apresentar como regras religiosas o que são puras tradições discriminatórias e oprimentes, penso que seja um insulto à própria religião. A religião muçulmana não o merece, assim como qualquer religião com a mesma dignidade.

Quanto ao fundamentalismo da rapariguinha de 24 anos que apelou para o TEDH, só lamento que a frescura própria da sua idade se tivesse transformado em água rançosa e bafienta.
E quando asseriu que nunca foi submetida a imposições familiares sobre o uso do véu integral, demonstra que não desconhece que a maioria das suas coetâneas sofre essa imposição. Por vezes, com o uso da violência.

Quase anedótico é o argumento dos seus advogados, perante a sentença do Tribunal: “Obrigá-la a destapar o rosto em público é um tratamento degradante”. Donde vêm estes trogloditas? Eu vejo, precisamente, o contrário.
Degradante é a imposição destas tradições - e somente às mulheres - por fanáticos e ignorantes que deturpam os verdadeiros princípios da própria religião. Quem o afirma são tantos e tantos muçulmanos que, obviamente, têm uma visão mais esclarecida da religião que professam.

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E falemos agora de um caso oposto: stop a mini-saias, vestuário excessivamente decotado ou transparente, etc., etc.

Palácio de Justiça da cidade de Bríndisi, importante cidade do sul da Itália e porto do mar Adriático.
O presidente do Tribunal desta cidade, Francesco Giardino, com a finalidade de pôr cobro a certos exageros, assinou uma nota protocolar e, no passado dia 30 de Junho, mandou afixar no ingresso do tribunal a seguinte disposição:
Para evitar a reiteração de situações deploráveis no ingresso do Palácio de Justiça, informa-se que a entrada não é permitida às pessoas vestidas em modo não decoroso”.

E para que não haja equívocos, o “modo não decoroso” é bem especificado:
Proibição de mini-saias ou calções, salvo se estes constituem elementos de divisa das forças armadas; não são permitidos vestuários excessivamente decotados ou transparentes, assim como chinelas de tira “entre-dedos”.

Certamente que o aviso é válido para advogadas, magistradas ou qualquer outra categoria de profissionais que trabalha ou frequenta o Palácio de Justiça. E entende-se perfeitamente que o mesmo aviso se dirige mais às senhoras. E tanto assim, que os vigilantes encarregados de fazer respeitar esta disposição tiveram de recusar a entrada a uma advogada.

O Sr. Presidente do Tribunal exagera? Não em demasia, dado o local onde se move.
Ponho de lado puritanismos e conformismos, pois sempre me foram antipáticos e, em muitas circunstâncias, simplesmente detestáveis.
O que me orienta, todavia, e em casos semelhantes, é a interpretação do bom gosto e do sentido estético, além do natural respeito por ambientes onde predomina uma certa formalidade.

Vejo muitas senhoras que teriam toda a vantagem estética se soubessem adequar e equilibrar o próprio vestuário, a fim de que este, pelo menos, melhorasse um aspecto físico que a natureza nem sempre beneficia. Todavia, ei-las, por exemplo, de calções que apenas cobrem as nádegas ou mini-saias vertiginosas que, pura e simplesmente, lhes dão um aspecto grosseiro.
Desejando seguir modernidades sem quaisquer filtros, não se apercebem dessa homenagem à chamboíce. Mas viva a liberdade… ou abaixo o mau gosto?