domingo, outubro 28, 2007

BIRMÂNIA
( Do site do Pontifício Instituto das Missões: www.asianews.it)

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AS FOTOS DA VERGONHA
Caríssimos: as palavras são inúteis. Estas fotos de um monge budista assassinado foram tiradas, em segredo, numa morgue. Imaginai quantos muitos outros tiveram o mesmo destino. Peço-vos que difundais estas fotos (entendi publicar apenas uma das duas fotos: a segunda é horripilante!) pelo maior número de pessoas, a fim que o mundo saiba que há necessidade de muito mais que uma simples condenação destes "bastardos" da junta.
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Com palavras de dor e ira, através de refugiados birmaneses chegaram-nos estas duas fotos que decidimos publicar, mas com uma advertência: são fotos muito cruas e violentas; talvez não aconselháveis a todos os leitores.
Mas essas são fotos da vergonha:
1 - Vergonha da junta que, precisamente hoje, deu a conhecer às televisões de todo o mundo a sua grotesca tentativa de reconciliar-se com os monges budistas, constringindo-os a aceitar ofertas. Porém, como as autoridades dos mosteiros budistas proibiram os respectivos monges de as aceitar, os militares encenaram uma farsa, com falsos monges, para uma falsa reconciliação. A junta procura fazer "compreender" às autoridades budistas a "necessidade" da repressão. (...)
Segundo fontes diplomáticas, esta nova repressão do governo militar de Myanmar - que se define socialista e laico, mas procura o apoio dos monges para continuar o seu domínio - custou a vida a centenas de pessoas e a prisão de mais de 6 mil.
2 - Vergonha para nós, que para além de qualquer vibração de escândalo contra a violência dos militares, pensámos que, no fundo, consistia apenas na supressão de algumas manifestações, quando, pelo contrário, se trata de um sistema que elimina, assassina, escraviza uma população de quase 50 milhões de habitantes.
3 - Vergonha para a ONU e a comunidade internacional que não encontram instrumentos eficazes para garantir a democracia a um povo que a escolheu de há muito tempo. O problema é que se trata com a junta só com o minuete diplomático, quando ocorre dar voz à sociedade mundial para enfrentar o que é um emergência humanitária.
Ocorre que a Cruz Vermelha internacional possa visitar, na Birmânia, os prisioneiros; que o Departamento ONU do trabalho visite os escravos dos trabalhos forçados; que as ONG possam desenvolver esforços a favor das populações empobrecidas pelo domínio e pelo comércio da junta com a China, Índia e Tailândia.
(...)
26/10/2007
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Alda M. Maia

segunda-feira, outubro 22, 2007

O PODER DE UM VOTO LIVRE E CONSCIENTE

Se cada um de nós, sem excepção, quando se dirige à cabine de voto, ponderasse bem a importância do acto, portanto da escolha que exprimirá, haveria menos incompetentes, demagogos ou oportunistas à frente dos destinos de uma democracia, isto é, de um país democrático?

Ponderar bem significa a preocupação de saber escolher aquela parte política, ou personagem, que mais se esforce por dar respostas sérias, honestas e realistas aos problemas do país.

Nunca me impressionaram os tribunos; desprezo os demagogos e, muito mais ainda, os oportunistas; repugnam-me os populistas que usam tons confidenciais, piscando o olho às massas: “vedes, eu sou um como vós; votai-me e dar-vos-ei prosperidade” - estou a pensar em Berlusconi. Unfit!

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Pensando no poder de um voto consciencioso, não posso deixar de reflectir na situação do Iraque.
Considero-a uma tremenda consequência de uma péssima escolha eleitoral – opinião minha, obviamente.

Um presidente americano responsável, inteligente, menos claramente comprometido com poderes económicos, jamais se lançaria na estúpida e obscena invasão do Iraque.
Sempre entendi que havia muitos outros meios, correctos e menos trágicos, para neutralizar um déspota sanguinário.

Mais grave que o ataque, todavia, foi a impreparação e leviandade como o Presidente Bush e compadres geriram o resultado. Torna-se quase inacreditável que tivessem reduzido a zero toda a organização militar e civil daquele desgraçado país sem nenhum plano que aproveitasse o que deveria ser aproveitado e substituir, para melhor, o que deveria ser substituído.
Assim, foi inevitável o caos e a origem de uma tragédia infinita no viver quotidiano dos iraquianos!

Os meios de comunicação deram mais atenção às provas falsas de que se serviram para justificar essa guerra. Certamente que é um factor relevante. No entanto, considero mais criminoso, se tal é possível, o desmantelamento de todas aquelas instituições e estruturas que organizam e harmonizam a convivência civil de um país normal.

Descrédito da América: mais outra pesada consequência!
Todo o Ocidente necessita de uma América moralmente forte e livre de lastros que não equilibram, mas só afundam o seu prestígio. Ora, o prestígio americano, presentemente, é desastroso.
E tanto assim, que o Irão talvez não ostentasse toda aquela intransigência e fanfarronada, na questão nuclear, se os Estados Unidos não estivessem enterrados até ao pescoço, no atoleiro em que se meteram; que seria mais cauto no descarado apoio que dá aos extremistas islâmicos.
Pela mesma razão, não creio que o Sr. Vladimir Putin falasse com tanta arrogância e alimentasse desejos de uma nova guerra fria, que me parece tão inoportuna quanto imbecil.
Se é táctica de política interna, que deite às ortigas os tiques de ex-KGB e tente comportar-se como estadista sério. Que pense na Chechénia e no modo abjecto como tem tratado esse problema.

Se Mr. Bush tivesse mais dignidade e não tivesse o péssimo hábito de ameaçar e aviar guerras, saberia dar uma resposta adequada às pretensões arrogantes e ridículas da China, relativamente à visita e concessão de uma medalha ao Dalai Lama. E a resposta seria esta: “Na minha casa faço o que muito bem entender. Não tenho que dar explicações, sobretudo a quem se apoderou do Tibete com a força bruta e quase aniquilou a cultura e o povo tibetanos”. Mas falta-lhe estatura moral e política para dar essa resposta.


Em tudo isto, há uma circunstância que dá um certo alívio: Bush não pode ser reeleito.
Paralelamente, surgirá uma dúvida: saberão ponderar bem o voto e eleger um presidente americano à altura da importância daquele país?
Ainda outra dúvida: os candidatos, actualmente em liça, serão os mais bem dotados – em coragem, sageza e equilíbrio - para corrigir o que Bush escaqueirou?
Alda M. Maia

segunda-feira, outubro 15, 2007

RITA LEVI-MONTALCINI
PRÉMIO NOBEL DA MEDICINA EM 1986

Uma grande cientista e uma grande Senhora.
Nasceu em Turim em 22 de Abril de 1909, formou-se em Medicina na universidade de Turim e dedicou-se à investigação no campo da neurologia.
Não somente é digna de grande respeito e admiração como mulher laureada com um prémio Nobel, como também pela sua acção benemérita a favor dos jovens e pelas campanhas de interesse social.

Não desejo, todavia, escrever sobre a grande cientista, membro das mais prestigiosas academias científicas internacionais ou do seu empenho social. Quero, sim, falar da actividade de Rita Levi-Montalcini como senadora vitalícia do Senado da República Italiana e do comportamento repulsivo de um outro senador, pertencente a um minúsculo partido de extrema-direita de recente formação (“La Destra”), contra esta grande Senhora. E não me canso de repetir esta expressão: Grande Senhora, referida a Rita Levi-Montalcini.

Foi nomeada senadora vitalícia – justa e meritoriamente nomeada - pelo Presidente da República, Carlo Azeglio Ciampi, em 2001.

Este novo governo de centro-esquerda – “L’Unione” - tem uma maioria de apenas um ou dois votos, no Senado. Os votos de alguns senadores vitalícios, frequentemente, reforçam essa estreitíssima maioria. Ora, Rita Levi-Montalcini nunca deixou de, com o seu voto, apoiar “L’Unione”.

A oposição - cujo único fim é derrubar o governo e não controlar a sua correcta actuação - quando este passa indemne com os votos de senadores vitalícios, dá lugar a cenas comparáveis às das piores tabernas.
O argumento a que recorrem é que o voto dos senadores vitalícios é imoral, porque não foram eleitos. Assim, “Imoral” – termo tão estúpido quanto revelador de má-fé - são os que votam este governo que, segundo a sua lógica, lhe “roubou” o poder. Bela concepção de alternância democrática!...

Certamente que L’Unione – coligação de governo formada por nove partidos – não raramente merece severas críticas pelo protagonismo doentio e um irritante corporativismo de alguns componentes.
Mas confesso, e desapaixonadamente, que nunca vi uma oposição tão incivilizada, e direi mesmo ordinária, como a actual.

Mas vamos ao caso: triste e indecente.
O vilão da cena (e não metaforicamente), o senador Francesco Storace, decidiu enviar a Rita Levi-Montalcini (98 anos) umas muletas. Alguns jovens militantes, sequazes de Storace, tentaram a entrega a domicílio.
Se o governo não cai, porque senadores vitalícios o votam, portanto resiste com estas “muletas”, insulta-se Rita Levi-Montalcini – “culpada de ser democrática, antifascista e judia” - com uma iniciativa digna do personagem que a lançou.
Wikipedia, em italiano, dá um retrato fiel deste indivíduo.

O Presidente da República Italiana, numa cerimónia onde estava presente a senadora vitalícia, entre várias frases de enaltecimento, afirmou: “Faltar ao respeito, importunar, tentar intimidar a senadora Rita Levi-Montalcini, que é motivo de honra para a Itália, é indigno”.

Não se fez esperar a arrogância de Storace… A propósito, estou a recordar-me, neste momento, do famigerado “Secretário Nacional do Partido Fascista” (1933/ 1939): Achille Starace. Devemos convir que estes dois parónimos foram mesmo predestinados!...
Ia a dizer, então, que não se fez esperar a reacção arrogante e grosseira de Storace (este tem só um a), insultando o Presidente sem o mínimo respeito, nem responsabilidade nos comentários proferidos.

Os seus simpatizantes, quer em entrevistas, quer online, demonstraram a mesma grosseria, chegando a apreciações próximas do anti-semitismo. Storace, então, aludiu aos milhões que o Estado deve pagar a Rita Levi-Montalcini. A quais milhões se refere, gostaria eu de saber!
Que género de políticos miserável!

Rita Levi-Montalcini respondeu a todo este lixo com uma carta, publicada na primeira página do jornal La Repubblica, em 10/10/2007:

Caro Director
Li, em La Repubblica de ontem, que Storace desejaria entregar-me, levando-as directamente a casa, um par de muletas. A este respeito, desejaria expor algumas considerações.

Eu, abaixo assinada, em pleno poder das minhas faculdades mentais e físicas, continuo a minha actividade científica e social, completamente indiferente aos ataques ignóbeis que me dirigem alguns sectores do Parlamento Italiano.

Na qualidade de senadora vitalícia e em base ao artigo 59 da Constituição Italiana, cumprirei as minhas funções de voto até que o Parlamento não aponha relativas modificações. Portanto, exerço tal direito segundo a minha inteira consciência e coerência.

Dirijo-me a quem tem a ideia de entregar-me as muletas, a fim de amparar a minha “deambulação”, assim como a do actual Governo, para informar que de tal coisa não existe nenhuma necessidade. Além disso, quero que fique bem esclarecido que não possuo “os milhões”, visto que sempre destinei os meus modestos recursos a favor, não somente das pessoas necessitadas, mas também para apoiar causas sociais de importância prioritária.

A quantos demonstraram não possuir as minhas mesmas “faculdades”, mentais e de comportamento, exprimo o mais profundo desdém, não pelos ataques pessoais, mas porque as suas manifestações reconduzem a sistemas totalitários de triste memória
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Concebendo um parlamento, na vida democrática de um país, como uma instituição dotada de grandeza e profundo significado, fico literalmente furibunda quando o vejo ocupado por pessoas indignas de serem classificadas como senadores ou deputados.
Mas, desgraçadamente, há quem as proponha e quem as vote, e isto também é democracia. Aguentemos, portanto, os cretinos eleitos; mas não é justo.
Alda M. Maia

domingo, outubro 07, 2007

O CONSELHO DA EUROPA E O CRIACIONISMO

Reatemos a conversa.
Novamente tenho tempo, ocasião, disposição e tantas ideias a atropelar-me o cérebro, isto é, os tais pensamentos vagabundos que giram à volta de vários assuntos sobre os quais me apetece divagar.
Quis escrever sobre tantos argumentos actuais, mas um artigo sobre uma decisão do Conselho da Europa impôs-se à minha atenção.

Já de há muito que a polémica criacionismo versus evolucionismo me interessava… e divertia. Escrevo: “divertia” (e diverte), pois que aquela quota de inteligência que me foi reservada recusa-se, muito simplesmente, a aceitar o criacionismo como um facto científico. Metaforicamente, pode ser considerado como acto de fé; cientificamente, não se pode aceitar.

Traduzo do jornal “L’Unità online” um artigo – 06/10/2007 - sobre a resolução, em sessão plenária, do Conselho da Europa. Vem ao encontro do que eu penso e diz tudo o que eu gostaria de escrever.

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Eis o artigo:

O CONSELHO DA EUROPA SOBRE O CRIACIONISMO: “NÃO O ENSINEM”

Os parlamentares dos 47 países do Conselho de Europa convidaram os próprios governos a “opor-se firmemente” ao ensino do “Criacionismo” (nega a evolução das espécies por meio da selecção natural) como disciplina científica, equivalente à teoria da evolução.

O Conselho de Europa, instituído em 5 de Maio de 1949, com o escopo de favorecer a criação de um espaço democrático e jurídico comum na Europa, tem, entre os seus fins institucionais, o de tutelar os direitos do homem e a democracia pluralista; o de garantir a supremacia do direito; o de estimular e encorajar a consciência da identidade cultural europeia e da sua diversidade.

Precisamente no respeito destes princípios, a Assembleia do Conselho da Europa declarou (resolução aprovada, na sessão plenária de quinta-feira, em Estrasburgo, com 48 votos a favor e 25 contrários): “Se não estamos atentos, o Criacionismo pode tornar-se numa ameaça para os direitos humanos”.

Ao apresentar o seu relatório, Anne Brasseur (Luxemburgo, ADLE), ex- ministro da Educação, declarou: “ Não se trata de opor a fé à ciência, mas evitar que a fé se oponha à ciência”.

Segundo os parlamentares, “o primeiro objectivo dos criacionistas hodiernos - a maior parte dos quais são, prevalentemente, cristãos e muçulmanos – é o ensino. Batem-se a fim de integrar as próprias teses nos programas científicos escolares. Todavia, o criacionismo não pode pretender ser admitido como disciplina científica”.

Os mesmos parlamentares afirmam que existe um “perigo real de uma grande confusão” entre convicção, fé e ciência, nas ideias das nossas crianças. “A teoria da evolução não tem nada que ver com a revelação divina, mas é fundada sobre os factos”

“O intelligent design, apresentado numa forma muito subtil, tenta acreditar a sua aproximação como científica. Ora, é precisamente nisto que está o perigo”.

Foi sublinhado que o criacionismo permaneceu, durante largo tempo, como um fenómeno exclusivamente americano. Hoje, as teses criacionistas dirigem-se para a Europa e a sua difusão interessa já um número, não negligenciável, de Estados membros do Conselho da Europa.
No relatório, há referências a exemplos na Bélgica, França, Alemanha, Grécia, Itália, Países Baixos, Polónia, Rússia, Sérvia, Espanha, Suécia, Suíça, Turquia e Reino Unido.

O ex-ministro da Instrução, Letizia Moratti, (Itália, governo Berlusconi) foi um dos mais estrénuos adversários do darwinismo. Com a circular n. 29 de 5/3/2004, nas “Indicações nacionais para os planos de estudo personalizados”, no segundo e terceiro ciclos (scuola secondaria di primo grado) fez desaparecer qualquer aceno à teoria da evolução de Darwin. Não foi um lapso ou esquecimento. No seu plano, Darwin deixaria, definitivamente, de ser estudado.
Além disso, baseando-se num acordo de 23/10/2003, entre o Ministro da Instrução e a Conferência Episcopal Italiana, procurou que fosse explicada a origem do homem, na aula de religião, onde os programas tresandam a criacionismo.
Felizmente, a mobilização de intelectuais e sindicatos conseguiu bloquear ambos os projectos.

O Criacionismo nasceu na América, nos primeiros anos do século XX, para contrastar a “desestabilizante” Teoria de Darwin. Mantém uma crença absoluta na interpretação literal da narração bíblica das origens: o mundo foi criado por Deus assim como é, em seis dias, cerca de seis mil anos; consequentemente, nega todos os modelos científicos da evoluçã, seja no que concerne o Universo, seja em relação aos seres vivos e ao homem.

www. unita.it - 06/10/2007
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Ainda bem que não vejo Portugal dentro da lista dos países contaminados pelo negativismo da teoria da evolução. Pelo menos, oficialmente!...

Recordo-me da grande polémica que a senhora ministra, Letizia Moratti – hoje Presidente da Câmara de Milão – desencadeou com a sua tentativa de eliminar Darwin dos programas de ensino. Aplaudi fortemente a reacção de intelectuais, cientistas e sindicatos dos professores. Mais aplaudi a batida em retirada da Sra. Moratti.
Mas quem te manda, a ti, sapateiro, tocar rabecão?!
Alda M. Maia