MAS QUE COISA É ESTA CRISE?
Há dias recordei-me de uma daquelas velhas canções popularíssimas, originais e sempre verdes. É uma canção italiana de 1933: “Ma cos’è questa crisi?” - intérprete e autor, Rodolfo De Angelis.
Sugeriu-me um bom título para aquilo que, presentemente, tanto nos preocupa e que tantas incógnitas apresenta. A explicá-las - por vezes criando mais alarme e confusão - surgiram as vedetas do momento, isto é, os economistas.
Nunca deixo de os ler, tentando apreender a sensatez e objectividade das análises; compreender o catastrofismo que algumas apontam e com as quais não quero concordar.
É-me muito difícil perceber e aceitar os vaticínios sobre o afundamento do euro e a fragmentação da União Europeia.
Michael Spence, Nobel Economia 2001, por exemplo, aventou dois cenários, sendo o primeiro o mais provável: “a saída da Grécia da zona euro e talvez a dos dois outros países, Portugal e Irlanda”. Vade retro!...
Aonde querem chegar? Qual o interesse, se a maioria das opiniões, paradoxalmente, indica, como consequência inelutável, um desastre não somente europeu, mas global?
As perplexidades acumulam-se e não me canso de esforçar-me por entender se tudo partiu de uma só causa, de múltiplas causas ou, e insisto sobre esta tecla, da calamidade de vermos uma desoladora mediocridade – frequentemente rasando a estupidez - da liderança política europeia.
Uma das causas principais é bem conhecida e incontrovertível. As dívidas soberanas são a consequência de quem mal governou e não soube manter o equilíbrio entre as receitas e as despesas. E não são necessárias altas teses económicas. Qualquer dona de casa de bom senso aconselharia: cuidado com as dívidas! Há os juros, prazos de pagamento e possíveis anos de mau rendimento. Antes de agravar o débito, haja rigor, equidade e ponderação nos orçamentos.
Rigor! Por onde andará este conceito na cabeça de quem se dedica a administrar dinheiros públicos? Prefiro não entrar na questão, pois tanto se pode cair no populismo e demagogia, como numa indignação legítima.
Crise é palavra que assusta. Todavia, se raciocinarmos com acuidade sobre as conotações que ela sugere, podemos acabar por bendizê-la.
E neste ponto, o que há de negativo numa crise pode ser o impulso para que a sensatez imponha reformas oportunas e inadiáveis e a ocasião de vermos, finalmente, estadistas que demonstrem uma visão ampla, uma ponderação severa, rápidas decisões, acume, inteligência.
Desgraçadamente, quando na Europa tanto necessitaríamos de políticos com estas características, apresenta-se-nos uma Senhora Ângela Merkel, o fac-símile da inteligência em sentido único e mais própria, talvez, para a administração de qualquer autarquia de menor importância. Se inadequada como chanceler de um grande país, com maior razão, jamais líder autoritário da União Europeia!
Contrariamente á onda que vai crescendo, não critico a Alemanha. Existem lá personagens políticas, intelectuais de vulto ou cidadãos informados que censuram asperamente a ortodoxia nacionalista da Senhora Merkel e a obediência à prepotência da Bundesbank: “um Estado dentro do Estado”, segundo o ex-chanceler Helmut Schmidt.
Certamente que Madame Nein tem razão, quando pretende rigor nos orçamentos dos estados-membros da EU - mas comece ela a vigiar melhor as contas em casa própria! Paralelamente, demonstra uma estupidez ilimitada quando opõe, de há dois anos a esta parte, negativa após negativa às soluções para pôr travão ou atenuar a crise que nos sufoca; quando assume atitudes ditatoriais sobre a função do Banco Central Europeu. As consequências estão à vista.
Se o BCE é independente e, por estatuto, pode fornecer dinheiro aos bancos solventes, só me pergunto por que razão não ignora o diktat da chanceler, emite toda a moeda necessária e fornece os bancos da União que, como finalidade primária, deverão financiar o crescimento económico. E não importa que os “bem pensantes” – teóricos, mas longe da realidade – invoquem o perigo da inflação.
A pergunta é fácil: inflação onde a recessão é iminente ou já se instalou, com uma procura claramente decrescente?
Não me parece que, neste caso, inflação e recessão possam caminhar de mãos dadas. Se a inflação subir dois pontos – se em vez de os 2% possa atingir os 4% - os bons economistas confirmam que daí não virá quaisquer problemas, mas uma óptima solução para acalmar os mercados e favorecer a economia real.
Penso que até mesmo os totós nesta matéria (eu incluída, obviamente), podem compreender tudo isto.
Em conclusão, as soluções anticrise existem. Mas sucede que a política europeia, seja por incapacidade, seja por egoísmo, petulância e nacionalismos muito descabidos dentro da União, está miseramente ausente das grandes decisões. Aguardemos. E que Deus ilumine quem deve decidir.
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