segunda-feira, janeiro 20, 2014

CONSERVAR AS OBRAS DE JOAN MIRÓ?!
E QUEM SERÁ ESTE MIRÓ?

Do caudal das declarações e justificações sobre a venda em leilão das 85 obras de Joan Miró, provenientes do BPN, citemos duas.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, explicou que “a aquisição da colecção de Joan Miró não é considerada uma prioridade no actual contexto de organização das colecções de Estado”.
A deputada do PSD, Isilda Aguincha, defende que “estas obras não são do Estado, vieram parar às mãos do Estado”.

O Banco Português de Negócios (BPN) foi nacionalizado em 2008, consequentemente, as 85 obras de arte de Miró ficaram a pertencer ao Estado. Que entende dizer o Secretário de Estado da Cultura, quando usa o termo “aquisição”? A quem deveriam adquirir estas preciosidades, se são propriedade nacional? Trata-se de um lapso da língua ou algo a que se foge dar explicações?
Como Secretário de Estado da Cultura, esperar-se-ia que usasse outros argumentos mais consentâneos com a missão para a qual foi nomeado.

A entrega deste considerável património cultural a uma casa de hastas pelo governo do nosso país, não só provoca estupefacção, mas também uma profunda irritação pela aridez cultural de quem defende essa alienação.

Relativamente ao comentário da deputada Isilda Aguincha, aqui entra-se no ridículo. Que me perdoe a gentil deputada, mas a estreiteza de raciocínio também deu o seu jeitinho. E se tivesse acrescentado “mas quem é este pintor Miró?”, não me surpreenderia.
 “As obras não são do Estado, vieram parar às mãos do Estado”.
Surripiou-as? Ocultou-as ilegalmente? Como interpretar esta asserção?

Mas que tipo de linguagem usa esta gentinha que se senta no Parlamento?
Esquecia-me de um facto importante: não fomos nós quem os elegeu; foram nomeados pelos respectivos partidos aos quais, em boa-fé, demos os nossos votos. Resignemo-nos.

Muito naturalmente, aludem ao Estado como se fosse um sector privado dos actuais ocupantes. Sim, porque dado o modo arrogante como se comportam, não servem o Estado, ocupam-no.
O Estado, porém, somos todos nós. Logo, deveríamos ter sido amplamente informados sobre a nacionalização das 85 obras de Miró, além de outras obras de arte - ex-propriedade do BPN e hoje do Estado - que jaziam ocultas nos cofres da Caixa Geral de Depósitos, desde 2008. Cerca de cinco anos sem que a maior parte dos cidadãos portugueses tivesse conhecimento de um facto tão importante para o nosso património artístico.

A pergunta tornou-se comum a muitas pessoas: por que motivo essas maravilhas da arte moderna e contemporânea ficaram escondidas e nunca foram expostas? Qual a razão por que não se procurou obter frutos dessas exposições, quando seria facilmente previsível que haveria grande interesse, curiosidade e muitos visitantes, dado o grande vulto do autor? Que se esconde por detrás de tudo isto?

Põe-se agora em leilão na famosa Christie’s de Londres, esperando obter cerca de 35 milhões de euros.
Considero esta inesperada decisão um acto miserável: sob o ponto de vista de uma grande perda cultural para o nosso país; sob o ponto de vista nacional, porque não sabemos apelar ao bom senso e à generosidade dos nossos concidadãos; sob o ponto de vista monetário, porque 35 milhões de euros são bem pouca coisa, face a um património cultural que, com o tempo, daria compensações muito, mas muito mais consistentes.

O argumento que esta venda é necessária para aliviar os encargos da nacionalização do BPN e os contribuintes é fragilíssimo e descarado. Em todos estes anos, como muito bem especificou o galerista Carlos Cabral Nunes que lançou uma petição on line: “estas obras nunca foram expostas, quando os contribuintes foram chamados a pagar a sua manutenção, a sua guarda e os seus custos de seguro(o sublinhado é meu).

Não seria também uma boa ideia pôr em leilão os Painéis de S. Vicente de Fora? Não façam cerimónias!... O Museu Nacional de Arte Antiga tem por lá coisas apetitosas, visto que, para estes senhores, as obras de arte não passam de coisas que dão dinheiro.

Confesso o meu desencanto e até desgosto face à passividade das nossas elites académicas e intelectuais.
Onde vivem? De que se ocupam, fora das suas normais actividades? Perante um desaforo desta natureza, só os move o próprio interesse profissional e nada os incomoda sobre o que se passa no país onde nasceram? Não pensam que toda esta indiferença só os amesquinha?

Evocar a austeridade, o equilíbrio dos orçamentos, enfrentar a crise económica e financeira que nos avassala, impor sacrifícios, enfim, depois de estas e outras considerações similares, queremos saber dos ilustres representantes do CDS e PSD o seguinte: quanto custará, ao Estado, o oportuníssimo, imprescindibilíssimo referendo que estes senhores aprovaram sobre a co-adopção e adopção por casais do mesmo sexo? Quanto custará? Caso esta perfeita idiotice seja ratificada, não será, por acaso, financiada com a colecção Miró?

2 Comments:

At 6:39 da tarde, Blogger Unknown said...

Alda. Estiye a ler. Dou-lhe toda a razão e é preciso ser muito inconsciente, inculto,indiferente e parvo. eles julgam que o povo não dá por nada.Há forças ocultas.Como combatê-las?

 
At 2:42 da tarde, Blogger Alda M. Maia said...

Beatriz
Bastante atrasada a agradecer o seu comentário. Sabe o motivo,não sabe?

Toda esta indecência pode ser resumida nas duas características mais evidentes: ignorância e arrogância. A Beatriz sabe muito bem que estes dois factores juntos são um desastre.

Um abraço
Alda

 

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