CONSERVAR AS OBRAS DE
JOAN MIRÓ?!
E QUEM SERÁ ESTE
MIRÓ?
Do caudal das
declarações e justificações sobre a venda em leilão das 85 obras de Joan Miró, provenientes
do BPN, citemos duas.
O Sr. Secretário de
Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, explicou que “a aquisição da colecção de
Joan Miró não é considerada uma prioridade no actual contexto de organização
das colecções de Estado”.
A deputada do PSD,
Isilda Aguincha, defende que “estas obras
não são do Estado, vieram parar às mãos do Estado”.
O Banco Português de
Negócios (BPN) foi nacionalizado em 2008, consequentemente, as 85 obras de arte
de Miró ficaram a pertencer ao Estado. Que entende dizer o Secretário de Estado
da Cultura, quando usa o termo “aquisição”?
A quem deveriam adquirir estas preciosidades, se já são propriedade nacional?
Trata-se de um lapso da língua ou algo a que se foge dar explicações?
Como Secretário de
Estado da Cultura, esperar-se-ia que usasse outros argumentos mais consentâneos
com a missão para a qual foi nomeado.
A entrega deste
considerável património cultural a uma casa de hastas pelo governo do nosso
país, não só provoca estupefacção, mas também uma profunda irritação pela aridez
cultural de quem defende essa alienação.
Relativamente ao
comentário da deputada Isilda Aguincha,
aqui entra-se no ridículo. Que me perdoe a gentil deputada, mas a estreiteza de
raciocínio também deu o seu jeitinho. E se tivesse acrescentado “mas quem é
este pintor Miró?”, não me surpreenderia.
“As
obras não são do Estado, vieram parar às mãos do Estado”.
Surripiou-as? Ocultou-as
ilegalmente? Como interpretar esta asserção?
Mas que tipo de linguagem
usa esta gentinha que se senta no Parlamento?
Esquecia-me de um
facto importante: não fomos nós quem os elegeu; foram nomeados pelos
respectivos partidos aos quais, em boa-fé, demos os nossos votos.
Resignemo-nos.
Muito naturalmente,
aludem ao Estado como se fosse um sector privado dos actuais ocupantes. Sim, porque
dado o modo arrogante como se comportam, não servem o Estado, ocupam-no.
O Estado, porém,
somos todos nós. Logo, deveríamos ter sido amplamente informados sobre a nacionalização
das 85 obras de Miró, além de outras obras de arte - ex-propriedade do BPN e
hoje do Estado - que jaziam ocultas nos cofres da Caixa Geral de Depósitos,
desde 2008. Cerca de cinco anos sem que a maior parte dos cidadãos portugueses
tivesse conhecimento de um facto tão importante para o nosso património
artístico.
A pergunta tornou-se
comum a muitas pessoas: por que motivo essas maravilhas da arte moderna e
contemporânea ficaram escondidas e nunca foram expostas? Qual a razão por que
não se procurou obter frutos dessas exposições, quando seria facilmente
previsível que haveria grande interesse, curiosidade e muitos visitantes, dado
o grande vulto do autor? Que se esconde por detrás de tudo isto?
Põe-se agora em
leilão na famosa Christie’s de Londres, esperando obter cerca de 35 milhões de
euros.
Considero esta inesperada
decisão um acto miserável: sob o ponto de vista de uma grande perda cultural
para o nosso país; sob o ponto de vista nacional, porque não sabemos apelar ao
bom senso e à generosidade dos nossos concidadãos; sob o ponto de vista
monetário, porque 35 milhões de euros são bem pouca coisa, face a um património
cultural que, com o tempo, daria compensações muito, mas muito mais
consistentes.
O argumento que esta
venda é necessária para aliviar os encargos da nacionalização do BPN e os
contribuintes é fragilíssimo e descarado. Em todos estes anos, como muito bem
especificou o galerista Carlos Cabral Nunes que lançou uma petição on line: “estas obras nunca foram expostas, quando os contribuintes foram chamados a pagar a
sua manutenção, a sua guarda e os seus custos de seguro” (o sublinhado
é meu).
Não seria também uma
boa ideia pôr em leilão os Painéis de S. Vicente de Fora? Não façam
cerimónias!... O Museu Nacional de Arte Antiga tem por lá coisas apetitosas,
visto que, para estes senhores, as obras de arte não passam de coisas que dão
dinheiro.
Confesso o meu
desencanto e até desgosto face à passividade das nossas elites académicas e
intelectuais.
Onde vivem? De que se
ocupam, fora das suas normais actividades? Perante um desaforo desta natureza,
só os move o próprio interesse profissional e nada os incomoda sobre o que se passa
no país onde nasceram? Não pensam que toda esta indiferença só os amesquinha?
Evocar a austeridade,
o equilíbrio dos orçamentos, enfrentar a crise económica e financeira que nos
avassala, impor sacrifícios, enfim, depois de estas e outras considerações
similares, queremos saber dos ilustres representantes do CDS e PSD o seguinte: quanto
custará, ao Estado, o oportuníssimo, imprescindibilíssimo referendo que
estes senhores aprovaram sobre a co-adopção e adopção por casais do mesmo sexo?
Quanto custará? Caso esta perfeita idiotice seja ratificada, não será, por
acaso, financiada com a colecção Miró?
2 Comments:
Alda. Estiye a ler. Dou-lhe toda a razão e é preciso ser muito inconsciente, inculto,indiferente e parvo. eles julgam que o povo não dá por nada.Há forças ocultas.Como combatê-las?
Beatriz
Bastante atrasada a agradecer o seu comentário. Sabe o motivo,não sabe?
Toda esta indecência pode ser resumida nas duas características mais evidentes: ignorância e arrogância. A Beatriz sabe muito bem que estes dois factores juntos são um desastre.
Um abraço
Alda
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