DESTINO OU COINCIDÊNCIAS PERSECUTÓRIAS?
Acredito pouco na crença de que o destino tudo
justifica, quando as adversidades ou tragédias enegrecem as nossas vidas.
E quando essas tragédias, a distância de anos se
repetem, quase como se fossem programadas, a revolta e insuportabilidade de
quem por elas é atingido denuncia-as como coincidências persecutórias: por que razão estas tragédias se repetem em todas as suas formas?!
Mas concretizemos. Ainda jovem, chega a notícia que o
pai fora atropelado mortalmente na estrada Famalicão / Braga.
Professor primário – ah! modernamente, diz-se professor
do primeiro ciclo -privilegiava deslocar-se até à Direcção Escolar de Braga na
sua motorizada, da qual muito se ufanava. Um taxista, mais atento às efusões de dois amantes que transportava do que à estrada que percorria, embateu naquele motociclista,
atirando-o para longe e dando-lhe morte instantânea. A notícia chegou célere
Passaram os anos. Apesar do ruído do grande trânsito na
avenida onde habitava, ouviu um rumor estranho. Assomou à varanda e viu o corpo
do marido prostrado e alguns automóveis que se desviavam, a fim de prosseguir e
sem um mínimo de sensibilidade por aquele corpo inerte.
Ao atravessar a avenida para o outro lado, também ele foi
vítima de um estúpido rapazote, numa motorizada, que tomara aquela longa avenida
por uma pista de grande velocidade.
Apesar dos socorros imediatos, faleceu poucas horas
depois.
A repetição de uma tragédia que lhe roubava mais um
ente querido, sempre vítima de atropelamento por irresponsáveis, redobrou-lhe a
amargura e desespero. Mas era um desespero misturado com revolta e
inconformação.
Passados uns meses, atravessando um encruzilhada, eis
que surge um automobilista que vira à direita a velocidade proibida e sem
precauções. Não a apanhou porque ela teve a prontidão de parar, dando ao
parvalhão a oportunidade de evitar o choque.
Não lançou nenhum anátema contra o automobilista. Virou
os olhos para as altas esferas e, numa voz irritadíssima, gritou o seu protesto
num português vernáculo: “P….! ainda não
estás contente?”
O lado cómico fez-se sentir, e teve de suster o riso
para não dar uma triste imagem da sua pessoa.
Cinco de Dezembro 2013. Um queridíssimo irmão atravessa
a passadeira da estrada Famalicão / Guimarães. Um automóvel, correctamente, parou.
Veio um segundo e, pela enésima vez, venceu a irresponsabilidade e a maldição.
Este segundo automobilista ignorou a passadeira, o outro veículo parado e o peão
que atravessava a estrada, confiante nas regras do trânsito. Foi apanhado em
cheio. Está nos cuidados intensivos no hospital de Braga. Apesar do seu estado
grave, resiste. Resistirá e vencerá.
É angústia, é desespero, é revolta; porém, tanta fé que,
desta vez, a vida se imporá e afugentará parcas com a tesoura pronta, fados, destinos
e outros fatalismos que não aceita.
Chamar a esta terceira tragédia coincidências persecutórias,
certamente que é retórica vazia. Todavia, considera-as e considerá-las-á sempre
malditas e tremendamente difíceis de aceitar.
A pergunta é insistente: porquê??!!
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