segunda-feira, maio 10, 2010

EUROPA, MERCADOS E POLÍTICA DOS GOVERNOS

Como capítulo final de um tema que tanto tem absorvido e preocupado a minha atenção nestes últimos tempos, não quero deixar de transcrever excertos de opiniões que me agradaram e continuaram a elucidar-me sobre aquela espécie de anaconda que procura estrangular e engolir o euro, atirando para o precipício da insolvência os países de economia frágil.

Mas, cá no nosso Portugal, tenho a impressão que ninguém ande preocupado, pois é mais importante - e não me canso de insistir sobre este triste espectáculo dos nossos parlamentares – perder tempo e dinheiro no inquérito PT/TVI.

Acaso ainda não se aperceberam que já provocam náusea com esses absurdos e inúteis modos inquisitoriais? O essencial é legítimo, mas quem lhes deu o direito ao abuso? Aonde querem chegar?

Neste momento não ponho em causa a cor política do Primeiro-Ministro. De direita, de centro ou de esquerda, apenas me interessaria - mais uma vez o repito - que se verificasse uma preocupação e conversão únicas sobre os graves problemas que nos afectam e que a imprensa estrangeira aponta como o próximo alvo - depois da Grécia, Portugal e sempre Portugal.
Um «máxi-plano» até 750 mil milhões, com a participação do FMI, para blindar a zona euro dos ataques da especulação (…) Solicitados também novos sacrifícios a Espanha e Portugal, os dois Países considerados de maior risco nesta fase” - Corriere Della Sera de hoje, 10/05/2010.

No entanto, qual a tarefa mais urgente imposta ao chefe do Governo, quando este teve de preparar-se explicar bem, em Bruxelas, a nossa situação financeira e económica? Pois neste período de grande empenho e responsabilidade política, deve responder, por escrito e num espaço de dez dias, a setenta (se não erro) ociosas perguntas de deputados sem ideias e irresponsáveis. Penoso!

Há um outro aspecto que me deixa perplexa, se não indignada. A escassa informação, quer escrita, quer falada.
No jornal “Público” de hoje, leio no artigo de Domingos Ferreira (professor e investigador, Universidade do Texas/Universidade Nova): Apesar de desdramatização das autoridades portuguesas e da incompreensível apatia da generalidade da comunicação social portuguesa (à excepção do jornal Público), as notícias para Portugal não poderiam ser piores (…)”

Permito-me discordar do que concerne a “excepção Público”. É jornal que leio diariamente e comporta-se como os demais. A comprová-lo, basta a edição de hoje, dia 10. As primeiras seis páginas internas, além da grande foto da capa, ocupam-se da vitória do Benfica! Dispensam-se comentários.

Certamente que apresentaram na primeira página, em grandes parangonas, a decisão, em Bruxelas, do “pacote de 600 mil milhões para apoiar os Países em dificuldade”; tema, porém, muito pouco desenvolvido numa única página da secção economia, quando haveria tanto para escrever e melhor elucidar os leitores.

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Cai também o Estado na bolsa de valores. Parece que ninguém se apercebe que a situação da Grécia é a síndrome da crise do Estado moderno.
(…) Por um lado, é responsável pela desastrosa situação financeira na qual se encontram outros Países da União Europeia; pelo outro, é incapaz de sair desta situação senão reconfirmando a própria natureza e os próprios limites.
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Se o Estado estivesse, como deveria, ao serviço do cidadão, e não vice-versa, a “cura” do governo grego deveria consistir, sobretudo, na eliminação de entidades inúteis, na redução de desperdícios, na contenção da burocracia, na luta à corrupção e às cumplicidades político-financeiras. Numa palavra: na reforma de si mesmo”.

Piero Ostellino - Corriere Della Sera, 07/05/2010
O negrito é meu, pois vejo este parágrafo muito aplicável a Portugal.

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(…) A novidade das últimas 48 horas é esta: os governos compreenderam que o ataque da especulação já não é somente contra a Grécia. O objectivo é bastante mais alto, a derrocada da economia grega foi apenas o detonador, mas agora é bem claro qual seja o alvo: o euro, a moeda única europeia, a resistência do sistema europeu e a sua necessária evolução política.
(…) A este ponto as perguntas que devemos formular são três: por que motivo a especulação ataca a Europa, as suas Bolsas, a sua moeda? Quais são, técnica e politicamente, os pontos débeis da União Europeia? Quais são as terapias necessárias para defender-nos? Podemos ainda acrescentar uma quarta pergunta: quem são os especuladores? Como é possível que tenham tantos meios e tanta coragem de partir em batalha contra uma estrutura de dimensões continentais que coincide com a área mais rica do mundo?

(…) O conjunto de forças que operam nos mercados, a especulação, sabe de há tempos que o BCE é o único banco central existente que não tem atrás um Estado soberano. Esta situação confere-lhe o máximo de independência, mas, paralelamente, a máximo solidão e fragilidade.

(…) Os Estados membros mantêm o completo domínio das respectivas políticas de orçamento, das respectivas políticas fiscais, da despesa pública, quer nacional, quer local, dos incentivos, das retribuições públicas, do sistema de saúde. Os mecanismos de coordenação são brandos e, na maioria dos casos, resolvem-se em recomendações
”.
Eugénio Scalfari, La Repubblica, 09/05/2010

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Desejo concluir com uma nota cómica. Como a noite avançava e em Bruxelas não havia maneira de tomarem uma decisão, surgiu o homem de acção e intuição aguda: Berlusconi!
Telefonou a Ângela Merkel e tudo se “desbloqueou imediatamente” – comunicado da sede de Governo italiano: “o plano desbloqueou-se, graças à intervenção de Berlusconi”

Barack Obama foi relegado, quanto a importância, para segundo lugar: os seus telefonemas à Senhora Merkel e a Sarkozy já chegaram tarde.
O peso que toda a imprensa atribui à intervenção de Obama, portanto, é absolutamente descabido!
Dá vontade de sorrir, para não rir às gargalhadas.
Alda M. Maia