segunda-feira, setembro 21, 2015

CORRECTO OU INCORRECTO?
CIVISMO OU INCIVISMO?

 Reflectindo sobre o que se passa neste nosso país, “purificado” pelo actual governo – assim o confirma o Primeiro-ministro - detenho-me sobre dois factos: o primeiro ocorreu nos fins de Agosto e as polémicas, daí derivadas, expandiram-se no presente mês; o segundo permanece como se tratasse de um evento natural.

Como já foi bem noticiado, o eurodeputado do PSD, Paulo Rangel, na sua intervenção na última “Universidade de Verão” do PSD, achou oportuno e original esclarecer: “Alguém acredita que se os socialistas estivessem no poder haveria um primeiro-ministro sob investigação?”

As reacções irromperam, como seria facilmente previsível, quer provindas da Magistratura e do PS, quer de vários comentadores e jornalistas. Foi o que se pode classificar, então, como “A tempestade de verão”, segundo o título do artigo de Paulo Rangel, no jornal Público do passado dia 01 de Setembro, contestando essas reacções.
Artigo muito bem escrito e argumentado, obviamente. “Desde há muito filiado em Montesquieu (…) que incluo o poder judicial no sistema do poder de governo” (…)
E partem os esclarecimentos: “qual é o lugar e o estatuto do poder jurisdicional no quadro do mesmo e quais as relações que entretece com os outros poderes e até com a opinião pública e o eleitorado”.

No sistema de governo devemos saber “quais as relações que o poder jurisdicional entretece com os outros poderes e até com a opinião pública e o eleitorado”? Mais claramente: a Justiça funciona conforme as ondulações da opinião pública e do eleitorado?!!
Paulo Rangel terá razão, mas não aceito isto como admissível, pois sempre me ensinaram e sempre compreendi que se tudo se passa desse modo, condenemos aqueles elementos do poder jurisdicional que traem a sua profissão e os seus mandatos.

Citou o caso italiano das “Mani Pulite” (Mãos Limpas).
A magistratura italiana não agiu impulsionada pala opinião pública. Houve, sim, um conjunto de magistrados corajosos da Procura de Milão que, a partir de um episódio de pagamento de luvas, puseram a nu uma enorme cadeia de corrupção, envolvendo todos os partidos do poder e combateram-na desassombradamente. Só então a opinião pública despertou com todo o clamor que esta batalha suscitou, apercebeu-se da determinação da magistratura e aplaudiu.

Paulo Rangel foi correcto ou incorrecto na frase assertiva se “alguém acredita que se os socialistas estivessem no poder haveria um primeiro-ministro sob investigação”? Para mim, foi incorrecto.
Não ponho em causa a interpretação da mensagem que pretendeu comunicar, pois também se poderia entender da seguinte forma: com o PSD no poder, a magistratura atreve-se a “intervir”, sim, mas sobre os adversários. Foi isso o que pensou?
De qualquer modo, frase muito infeliz, em todos os sentidos. Inoportuna e incorrecta, quando envolveu a magistratura num velado ataque a Sócrates. Mais incorrecta ainda, servindo-se deste caso para atacar o partido adversário.
Entendo que este género de ataques é indigno e de péssimo gosto, sobretudo provindo de uma pessoa culta e educada, seja qual for a facção politica a que pertence.   

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Para finalizar, vamos ao segundo facto. Facto que se mantém silencioso e que, pelos vistos, é “institucional”: jogos de futebol dos “três grandes” no próximo dia 04 de Outubro, precisamente no dia das eleições legislativas!
Estamos num país onde o civismo deve ser arreigado em toda a população ou os comerciantes da bola e os fanáticos do futebol constituem elementos a quem tudo se dedica e oculto do civismo, o “respeito pelos valores da sociedade e pelas suas instituições” – assim rezam os dicionários – arruma-se para um canto?

A Liga Portuguesa de Futebol Profissional, perante um dos mais importantes actos electivo, não tem autoridade nem formação cívica para dispor datas que não choquem com eventos desta natureza?
Informam que agiu por imposição dos clubes, os curadores do lucro financeiro e da “doença” dos adeptos. Logo, os dirigentes dessa Liga não têm voz própria ou existem apenas como títeres manobrados pelos clubes, sobretudo Sporting, Benfica e Porto?

Li apenas a habitual crónica de José Vítor Malheiros - “Quando o futebol é o contrário da democracia”, jornal Público de 15 Setembro – onde exprobrava, com argumentos muito justos, esta indecência que, sobretudo, será o maior aliado da abstenção.
O resto é silêncio. Se houve outras apreciações severamente críticas, disso não me apercebi.
E o incivismo, mais uma vez, alçou aquela bandeira suja e malcheirosa que deveria envergonhar os administradores da coisa pública. Ou será como sugere José Pacheco Pereira: “É também por isso que o amorfismo, o adormecimento, a apatia, o futebol no dia das eleições, o circo todos os dias até lá, são armas decisivas da coligação para ganhar nas eleições”?
Se assim é, eis o exemplo do pior incivismo que um país, o nosso,  pode albergar.