IMPOSSÍVEL NÃO FALAR DA GRÉCIA
Sobretudo porque a Grécia muito nos seduziu, quando
estudámos a antiguidade clássica. Mantive sempre o sonho de a visitar e pelas
duas vezes que estava programado uma minha viagem àquele país, surgiram
imprevistos que tudo goraram.
Sexta-feira passada, dia 26, lendo no jornal Público a
habitual crónica do Dr. Vasco Pulido Valente, o qual se interroga se a Grécia é
um país normal, duvidei se estava a ler correctamente a exposição que o
escritor e comentador político desenvolvia sobre o atormentado país de que
tanto se fala nestes últimos tempos.
Peremptoriamente, Pulido Valente assevera que não é um
país normal: “é um país falhado”.
“Um país de 6000 ilhas (280 meio habitadas),
comunicações continentais quase impossíveis, nenhuma fronteira com um Estado
desenvolvido e ocidental”. “No princípio do século XIX, a Inglaterra inventou a
Grécia; antes do canal (de Suez), ninguém queria saber daquele pedaço pedregoso do império turco”.
E as palavras demolidoras de um país milenário, embora
com tantas e variadas ascensões e involuções, prosseguiram até ao final do texto
do cronista que me recorda, mas apenas
pelo título, a célebre personagem da comédia de Carlo Goldoni: “Sior Todero brontolon”, escrita na
língua de Veneza, em 1762.
Certamente que Pulido Valente não é o velho da comédia
de Goldoni: um rezingão rico, avaro e prepotente com toda a família e pessoas
relacionadas, das quais exige submissão absoluta.
Quando termino a leitura das suas crónicas, a evocação do epíteto brontolon
(resmungão, rezingão), é imediata.
Não recordo um único artigo onde Pulido Valente exprima
uma opinião positiva sobre o tema escolhido, personagem ou evento. Sempre
críticas, ironias, descrédito, enfim, um perfeito rezingão intolerante. Mutatis mutantis, um bom discípulo de “Sor
Tódero rabugento”
Mas voltemos ao que expôs sobre a Grécia e reacções daí
derivadas.
No dia seguinte – sábado, 27 de Junho - José Pacheco
Pereira, sem jamais citar o autor, com toda a elegância contestou tudo o que de
negativo escrevera Pulido Valente.
Defendeu o país que tem direito à dignidade que lhe é
devida. Erros são comuns a toda a humanidade e regimes políticos, porém, a
dignidade de um povo e do seu próprio país é sacrossanta: assim penso e não
mudo de opinião.
Pacheco Pereira inicia o seu artigo – “A Europa que nos envergonha” – com as
seguintes palavras: “Bater nos gregos é uma espécie de desporto nacional. Tem
várias versões, uma é bater no Syriza, outra é bater nos gregos propriamente
ditos e na Grécia como país”.
Começou bem e concordo plenamente com todo o resto do
extenso artigo.
Muitos cronistas têm a preocupação de dar maior relevo
aos erros do actual Governo grego. Eu reparto esses erros entre as duas partes:
Syriza e Eurogrupo. Todavia, atribuo maior responsabilidade, reforçada por uma
insensibilidade quase desumana, às instituições europeias.
Mas parece-me que usar o termo insensibilidade não seja
bem apropriado. Quando digo que concordo com o que escreveu Pacheco Pereira, já
de há muito que via com grande perplexidade a persistência da troika em
contrastar as propostas gregas. Era necessário persistir na famigerada
austeridade, cega, muda e insensível, para os autênticos e reais dramas do povo grego?
A questão é verdadeiramente económica e financeira ou,
como muito bem diz Pacheco Pereira e tantos outros comentadores em Portugal e
fora do país, é, acima de tudo, política?
Mais claramente: O conservadorismo que impera na Europa
não tolera o Syriza, uma formação de esquerda radical. Portanto, tudo deve ser feito
de modo a provocar a queda do governo helénico, auxiliando a subida ao poder
dos neoliberais, fiéis alunos que fazem os deveres de casa.
Só espero que haja bom senso, equilíbrio e consciência,
sobretudo da parte do Eurogrupo ou do Conselho Europeu. Quanto ao FMI, a
Senhora Lagarde que pense menos nas jogadas para ser reeleita e não sufoque a
consciência, se é que o mundo da finança não lha apagou.
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