segunda-feira, junho 29, 2015

IMPOSSÍVEL NÃO FALAR DA GRÉCIA

Sobretudo porque a Grécia muito nos seduziu, quando estudámos a antiguidade clássica. Mantive sempre o sonho de a visitar e pelas duas vezes que estava programado uma minha viagem àquele país, surgiram imprevistos que tudo goraram.

Sexta-feira passada, dia 26, lendo no jornal Público a habitual crónica do Dr. Vasco Pulido Valente, o qual se interroga se a Grécia é um país normal, duvidei se estava a ler correctamente a exposição que o escritor e comentador político desenvolvia sobre o atormentado país de que tanto se fala nestes últimos tempos.

Peremptoriamente, Pulido Valente assevera que não é um país normal: “é um país falhado”.
“Um país de 6000 ilhas (280 meio habitadas), comunicações continentais quase impossíveis, nenhuma fronteira com um Estado desenvolvido e ocidental”. “No princípio do século XIX, a Inglaterra inventou a Grécia; antes do canal (de Suez), ninguém queria saber daquele pedaço pedregoso do império turco”.

E as palavras demolidoras de um país milenário, embora com tantas e variadas ascensões e involuções, prosseguiram até ao final do texto do cronista que me recorda, mas apenas pelo título, a célebre personagem da comédia de Carlo Goldoni: “Sior Todero brontolon”, escrita na língua de Veneza, em 1762.

Certamente que Pulido Valente não é o velho da comédia de Goldoni: um rezingão rico, avaro e prepotente com toda a família e pessoas relacionadas, das quais exige submissão absoluta.
Quando termino a leitura das suas crónicas, a evocação do epíteto brontolon (resmungão, rezingão), é imediata.
Não recordo um único artigo onde Pulido Valente exprima uma opinião positiva sobre o tema escolhido, personagem ou evento. Sempre críticas, ironias, descrédito, enfim, um perfeito rezingão intolerante. Mutatis mutantis, um bom discípulo de “Sor Tódero rabugento”  

Mas voltemos ao que expôs sobre a Grécia e reacções daí derivadas.
No dia seguinte – sábado, 27 de Junho - José Pacheco Pereira, sem jamais citar o autor, com toda a elegância contestou tudo o que de negativo escrevera Pulido Valente.
Defendeu o país que tem direito à dignidade que lhe é devida. Erros são comuns a toda a humanidade e regimes políticos, porém, a dignidade de um povo e do seu próprio país é sacrossanta: assim penso e não mudo de opinião.

Pacheco Pereira inicia o seu artigo – “A Europa que nos envergonha” – com as seguintes palavras: “Bater nos gregos é uma espécie de desporto nacional. Tem várias versões, uma é bater no Syriza, outra é bater nos gregos propriamente ditos e na Grécia como país”.

Começou bem e concordo plenamente com todo o resto do extenso artigo.
Muitos cronistas têm a preocupação de dar maior relevo aos erros do actual Governo grego. Eu reparto esses erros entre as duas partes: Syriza e Eurogrupo. Todavia, atribuo maior responsabilidade, reforçada por uma insensibilidade quase desumana, às instituições europeias.

Mas parece-me que usar o termo insensibilidade não seja bem apropriado. Quando digo que concordo com o que escreveu Pacheco Pereira, já de há muito que via com grande perplexidade a persistência da troika em contrastar as propostas gregas. Era necessário persistir na famigerada austeridade, cega, muda e insensível, para os autênticos e reais dramas do povo grego?

A questão é verdadeiramente económica e financeira ou, como muito bem diz Pacheco Pereira e tantos outros comentadores em Portugal e fora do país, é, acima de tudo, política?
Mais claramente: O conservadorismo que impera na Europa não tolera o Syriza, uma formação de esquerda radical. Portanto, tudo deve ser feito de modo a provocar a queda do governo helénico, auxiliando a subida ao poder dos neoliberais, fiéis alunos que fazem os deveres de casa.

Só espero que haja bom senso, equilíbrio e consciência, sobretudo da parte do Eurogrupo ou do Conselho Europeu. Quanto ao FMI, a Senhora Lagarde que pense menos nas jogadas para ser reeleita e não sufoque a consciência, se é que o mundo da finança não lha apagou.