segunda-feira, maio 18, 2015

IGNORÂNCIA OU PREPOTÊNCIA?
FALEMOS DE MANIFESTAÇÕES CULTURAIS

A pergunta “Ignorância ou prepotência” tem um motivo: no dia 13 de Maio 2015, em Portugal, “tornou-se obrigatório” o Acordo Ortográfico!
Pergunta-se: obrigatório para quem?
Em base a qual norma legitimamente elaborada e que trâmites legais foram seguidos para ser imposta no dia 13 de Maio? Há muitos esclarecimentos sobre este assunto e por quem, verdadeiramente, sabe o que diz.

Estamos em democracia, assim o cremos, logo, o que impulsionou estes eleitos a ocupar o Parlamento com temas nos quais demonstraram uma ignorância desastrosa, desprezando a opinião dos verdadeiros e profundos conhecedores da matéria e acolhendo iniciativas de quem apenas vê na língua nacional uma base de bons rendimentos?
Somente ignorância ou também a prepotência de quem está no poder e entende que nada deve justificar? Mas é fácil de intuir a realidade. Testemunhámos uma junção dos dois factores: uma atrevida ignorância sobre o que legislaram; uma prepotência, pura e simples, para o impor.

Está em nós não obedecer e opormo-nos, incansavelmente, a este assassínio de um rico património que é de todos nós, portugueses, mas que foi traído por quem seria obrigado, por lei, a defendê-lo. E isto é imperdoável.
Nas próximas eleições saberei como compensá-los. O partido por quem sempre votei, desta vez não terá o meu voto.

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Falemos de outro assunto, oposto à ignorância. Termina hoje o 28.º Salão Internacional do Livro, na cidade de Turim (de 14 a 18 de Maio). O tema condutor foram “As Maravilhas da Itália”, e são abundantes.
O hóspede de honra foi a Alemanha. No próximo ano será a Arábia Saudita. Achei interessante a presença de um stand de Moçambique. Juntamente com o Brasil, são os únicos países de língua portuguesa ali presentes.

O Salão Internacional do Livro de Turim tem obtido sempre um grande sucesso. Este ano, o número de visitantes, sempre elevado, aumentou. Conheço bem esta manifestação literária. Quando agora visito a Itália, procuro ir no mês de Maio, precisamente por estes eventos.

Nos muitos e variados encontros de escritores e outros académicos, sábado passado houve o encontro do escritor Roberto Saviano com o prestigiado jornalista de investigação alemão, Günter Wallraff.
Quando li este nome, recordei o caso em que Wallraff, em 1986, desejando investigar o racismo que quotidianamente atingia os trabalhadores turcos na Alemanha, fez-se passar por um operário turco. A reportagem, obviamente, tornou-se célebre pela autenticidade e originalidade.

O jornal La Stampa descreve-o como “o mestre do jornalismo de investigação europeu e uma das consciências morais da Alemanha contemporânea”.

No dia 16 deste mês, o mesmo jornal, La Stampa, publicou um artigo de Günter Wallraff com o título: “A Alemanha rica? Uma paradoxal mentira”. Vejamos algumas opiniões expressas neste artigo e que merecem ser lidas:

“Quando, há mais de quarenta anos, iniciei o meu trabalho de jornalista de investigação esperava – e provavelmente estava na companhia da maioria da população – num desenvolvimento constante que evolvesse na direcção de um sistema social mais justo e humano. Hoje, ainda estou determinado a contribuir para estas formas de progresso com os meus livros e as minhas reportagens, embora deva confessar um crescente cepticismo. São demasiados os regressos aos quais tivemos de assistir nos últimos anos”.

“A falta de tutela dos trabalhadores vai de pari passo com a desfaçatez com a qual se enriquecem os altos dirigentes e ex-políticos, categorias que se preocupam apenas do próprio bem-estar e do modo melhor para açambarcar dinheiro, capitais e privilégios fiscais. Este «mundo paralelo», profundamente associal, descarado e arrogante, arvora-se em vencedor, enquanto milhões de indivíduos degradados pensam dever-se envergonhar de uma pobreza de que não são culpados. (…)”

“Cerca de um terço da população alemã é quase indigente ou está completamente endividada. O dado que, em média, os alemães nunca estiveram tão ricos não é senão um recurso à estatística para deitar fumo nos olhos e esconder a realidade dos factos. Além disso, é também um achincalhe, porque através destes cálculos, a vergonhosa repartição das riquezas a favor das classes abastadas resulta minimizada. Na Alemanha, o 10% rico da população possui mais de 60% do património total do país. E um por cento dos alemães super-ricos já se apoderou de quase um quarto das riquezas nacionais. Cada ano, a diferença torna-se mais ampla e profunda, a injustiça mais chocante.
Um em cada quatro trabalhadores alemães recebe, hoje em dia, um salário pelo menos dois terços mais baixo do que o ordenado médio e o número dos provisórios elevou-se até às estrelas”.

“Já em 2004, Michael Rogowski, presidente da Confederação da Indústria Alemã, afirmava: «O trabalho não é uma medida invariável, mas uma questão de procura e oferta, portanto, de preço. Não precisamos de salários mínimos, mas, pelo contrário, devemos descer abaixo das tarifas mínimas previstas». Provavelmente também era orgulhoso do cinismo que ostentava. “A força trabalho tem um preço, exactamente como o têm os porcos. No mercado dos porcos, o preço permanece alto se há poucos porcos; se o número de porcos aumenta, o preço desce». (…)”

“A política limitou-se a pôr em prática, uma após outra, todas as solicitações do mundo económico e os maiores partidos não fizeram o mínimo esforço contra a desintegração do estado social por obra das políticas neoliberais”.

“No seu romance “O Novo Mundo”, publicado em 1932, precisamente quando começava uma enorme crise global, Aldous Huxley traçou o retrato de uma moderna sociedade de castas nas quais os «alfa mais» detêm o poder e o resto da sociedade é reduzida a uma única massa indistinta. Na distopia do novo mundo de Huxley, em parte tão inquietantemente similar ao nosso, o consumismo e o divertimento coacto são as cadeias que aprisionam a personalidade individual, a inteligência e a capacidade de resistência dos cidadãos. Hoje, na nossa «sociedade do bem-estar e do divertimento» todos nós portamos dentro coacções deste género e o futuro corre o risco de pertencer a «homens na norma», como produtos em série.
A solidariedade, a reflexão, o pensamento crítico são vistos com suspeita, se não mesmo desprezados ao grito de «a realidade é esta aqui e alternativas não existem»”. (o sublinhado é meu)

“Por este motivo, durante as minhas investigações em todo o território alemão, sempre me confortou o encontro com pessoas que não perderam a esperança num mundo melhor nem a coragem de lutar para realizá-lo”
Günter Wallraff;  La Stampa – 16 / 05 / 2015 

2 Comments:

At 8:29 da tarde, Blogger Miriam de Sales said...

Alda,boa tarde
Sou escritora brasileira e estava no stand do Brasil,em Turim;adoraria conhecê-la!
Descobri este blog por acaso. Parabéns!
Estarei em Lisboa de 9 a 23/6.Gostaria de lhe oferecer um livro.
Meu e-mail:miriamdesales@gmail.com
Abç

 
At 2:57 da tarde, Blogger Alda M. Maia said...

Gentil Senhora Miriam de Sales Oliveira
Estou-lhe muito grata, e lisonjeada, pelo seu comentário.
Muitíssimo obrigada. Mas agradecer-lhe-ei mais completamente via e-mail
Alda Maia

 

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