IGNORÂNCIA OU PREPOTÊNCIA?
FALEMOS DE
MANIFESTAÇÕES CULTURAIS
A pergunta
“Ignorância ou prepotência” tem um motivo: no dia 13 de Maio 2015, em Portugal,
“tornou-se obrigatório” o Acordo Ortográfico!
Pergunta-se:
obrigatório para quem?
Em base a qual norma
legitimamente elaborada e que trâmites legais foram seguidos para ser imposta
no dia 13 de Maio? Há muitos esclarecimentos sobre este assunto e por quem,
verdadeiramente, sabe o que diz.
Estamos em
democracia, assim o cremos, logo, o que impulsionou estes eleitos a ocupar o
Parlamento com temas nos quais demonstraram uma ignorância desastrosa,
desprezando a opinião dos verdadeiros e profundos conhecedores da matéria e
acolhendo iniciativas de quem apenas vê na língua nacional uma base de bons
rendimentos?
Somente ignorância ou
também a prepotência de quem está no poder e entende que nada deve justificar? Mas
é fácil de intuir a realidade. Testemunhámos uma junção dos dois factores: uma atrevida
ignorância sobre o que legislaram; uma prepotência, pura e simples, para o
impor.
Está em nós não
obedecer e opormo-nos, incansavelmente, a este assassínio de um rico património
que é de todos nós, portugueses, mas que foi traído por quem seria obrigado,
por lei, a defendê-lo. E isto é imperdoável.
Nas próximas eleições
saberei como compensá-los. O partido por quem sempre votei, desta vez não terá
o meu voto.
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Falemos de outro
assunto, oposto à ignorância. Termina hoje o 28.º Salão Internacional do
Livro, na cidade de Turim (de 14 a 18 de Maio). O tema condutor foram “As Maravilhas
da Itália”, e são abundantes.
O hóspede de honra foi
a Alemanha. No próximo ano será a Arábia Saudita. Achei interessante a presença
de um stand de Moçambique. Juntamente
com o Brasil, são os únicos países de língua portuguesa ali presentes.
O Salão Internacional
do Livro de Turim tem obtido sempre um grande sucesso. Este ano, o número de
visitantes, sempre elevado, aumentou. Conheço bem esta manifestação literária.
Quando agora visito a Itália, procuro ir no mês de Maio, precisamente por estes
eventos.
Nos muitos e variados
encontros de escritores e outros académicos, sábado passado houve o encontro do
escritor Roberto Saviano com o
prestigiado jornalista de investigação alemão, Günter Wallraff.
Quando li este nome, recordei
o caso em que Wallraff, em 1986, desejando investigar o racismo que
quotidianamente atingia os trabalhadores turcos na Alemanha, fez-se passar por
um operário turco. A reportagem, obviamente, tornou-se célebre pela
autenticidade e originalidade.
O jornal La Stampa
descreve-o como “o mestre do jornalismo de investigação europeu e uma das
consciências morais da Alemanha contemporânea”.
No dia 16 deste mês,
o mesmo jornal, La Stampa, publicou um artigo de Günter Wallraff com o título: “A Alemanha rica? Uma paradoxal mentira”.
Vejamos algumas opiniões expressas neste artigo e que merecem ser lidas:
“Quando, há mais de
quarenta anos, iniciei o meu trabalho de jornalista de investigação esperava –
e provavelmente estava na companhia da maioria da população – num
desenvolvimento constante que evolvesse na direcção de um sistema social mais
justo e humano. Hoje, ainda estou determinado a contribuir para estas formas de
progresso com os meus livros e as minhas reportagens, embora deva confessar um
crescente cepticismo. São demasiados os regressos aos quais tivemos de
assistir nos últimos anos”.
“A falta de tutela dos
trabalhadores vai de pari passo com a desfaçatez com a qual se enriquecem os
altos dirigentes e ex-políticos, categorias que se preocupam apenas do próprio
bem-estar e do modo melhor para açambarcar dinheiro, capitais e privilégios
fiscais. Este «mundo paralelo», profundamente associal, descarado e arrogante,
arvora-se em vencedor, enquanto milhões de indivíduos degradados pensam
dever-se envergonhar de uma pobreza de que não são culpados. (…)”
“Cerca de um terço da
população alemã é quase indigente ou está completamente endividada. O dado que,
em média, os alemães nunca estiveram tão ricos não é senão um recurso à
estatística para deitar fumo nos olhos e esconder a realidade dos factos. Além
disso, é também um achincalhe, porque através destes cálculos, a vergonhosa
repartição das riquezas a favor das classes abastadas resulta minimizada. Na
Alemanha, o 10% rico da população possui mais de 60% do património total do
país. E um por cento dos alemães super-ricos já se apoderou de quase um quarto
das riquezas nacionais. Cada ano, a diferença torna-se mais ampla e profunda, a
injustiça mais chocante.
Um em cada quatro trabalhadores
alemães recebe, hoje em dia, um salário pelo menos dois terços mais baixo do
que o ordenado médio e o número dos provisórios elevou-se até às estrelas”.
“Já em 2004, Michael
Rogowski, presidente da Confederação da Indústria Alemã, afirmava: «O trabalho não é uma medida invariável, mas
uma questão de procura e oferta, portanto, de preço. Não precisamos de salários
mínimos, mas, pelo contrário, devemos descer abaixo das tarifas mínimas
previstas». Provavelmente também era orgulhoso do cinismo que ostentava. “A força trabalho tem um preço, exactamente como
o têm os porcos. No mercado dos porcos, o preço permanece alto se há poucos porcos;
se o número de porcos aumenta, o preço desce». (…)”
“A política
limitou-se a pôr em prática, uma após outra, todas as solicitações do mundo
económico e os maiores partidos não fizeram o mínimo esforço contra a
desintegração do estado social por obra das políticas neoliberais”.
“No seu romance “O
Novo Mundo”, publicado em 1932, precisamente quando começava uma enorme
crise global, Aldous Huxley traçou o retrato de uma moderna sociedade de castas
nas quais os «alfa mais» detêm o poder e o resto da sociedade é reduzida a uma
única massa indistinta. Na distopia do novo mundo de Huxley, em parte tão
inquietantemente similar ao nosso, o consumismo e o divertimento coacto são as
cadeias que aprisionam a personalidade individual, a inteligência e a
capacidade de resistência dos cidadãos. Hoje, na nossa «sociedade do bem-estar
e do divertimento» todos nós portamos dentro coacções deste género e o futuro corre
o risco de pertencer a «homens na norma», como produtos em série.
A
solidariedade, a reflexão, o pensamento crítico são vistos com suspeita, se não
mesmo desprezados ao grito de «a realidade é esta aqui e alternativas não
existem»”. (o
sublinhado é meu)
“Por este motivo,
durante as minhas investigações em todo o território alemão, sempre me
confortou o encontro com pessoas que não perderam a esperança num mundo melhor
nem a coragem de lutar para realizá-lo”
Günter
Wallraff; La Stampa – 16 / 05 / 2015
2 Comments:
Alda,boa tarde
Sou escritora brasileira e estava no stand do Brasil,em Turim;adoraria conhecê-la!
Descobri este blog por acaso. Parabéns!
Estarei em Lisboa de 9 a 23/6.Gostaria de lhe oferecer um livro.
Meu e-mail:miriamdesales@gmail.com
Abç
Gentil Senhora Miriam de Sales Oliveira
Estou-lhe muito grata, e lisonjeada, pelo seu comentário.
Muitíssimo obrigada. Mas agradecer-lhe-ei mais completamente via e-mail
Alda Maia
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