segunda-feira, fevereiro 02, 2015

A ELEIÇÃO DE UM PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Eleger, isto é, escolher através de um voto é o prosseguimento de uma prévia selecção de candidatos que se presume reúnam uma indiscutível idoneidade moral e a necessária competência para o cargo em causa.
Muito frequentemente, todavia, nessa selecção são apresentadas personagens muito populares, mas mais de aparências que possuidoras de sólidas qualidades. Haja bom senso, portanto, e muita ponderação, a fim de que o voto seja destinado a um óptimo e justo candidato.

Sábado passado foi eleito o 12.º Presidente da República italiana. Houve quatro escrutínios. Visto que os franco-atiradores costumam ser a praga habitual em tais eleições, a maioria de Governo decidiu o voto em branco nos primeiros três escrutínios; no quarto, votar-se-ia o candidato escolhido, indicado nos últimos instantes: Sérgio Matarella.

Os elogios à táctica política do Primeiro-ministro, Mattia Renzi, são unânimes. Conseguiu vencer resistências dentro do próprio partido, desaparelhou as estratégias de Berlusconi, escolheu uma excelente figura política como candidato e à qual ninguém poderia opor qualquer tipo de objecções. Acertou. O quarto escrutínio deu uma ampla vitória a Sérgio Matarella.
É sobre este candidato, hoje presidente eleito, que desejo concentrar a minha atenção.

Segui com interesse todos os percursos e ziguezagues dos diversos partidos e seus representantes. Os programas televisivos superabundaram em debates, opiniões e alvitres sobre os vários nomes propostos ou prováveis e, como é normal, tinha as minhas simpatias.
Quando se falou em Sérgio Matarella, aguardei. Conhecia o nome, sabia que era um juiz do Tribunal Constitucional, ocupara várias vezes o cargo de ministro, tivera um irmão - presidente da região Sicília - que fora assassinado pela máfia em 1980, e pouco mais.

Quando a sua eleição se apresentou como quase certa, as informações e descrições de Sérgio Matarella foram exaustivas. Assim, avultou a figura moral, ética, política e intelectual do que seria, e é, o novo Presidente da República.
No que descrevem, sobre a sua personalidade, o seu passado, não existem contradições nem senãos: pessoa muito reservada, honestidade rigorosa, competência institucional – “um cavalheiro das instituições”, assim o classificaramesquivo, “evita as telecâmaras, fala em voz baixa e cultiva as virtudes da pacatez, do equilíbrio e da prudência”
Resumindo: um perfeito cavalheiro sobre qualquer aspecto seja avaliado.

Após conhecer todos estes dados e ter observado a forma simples como o novo presidente se apresentou, fiquei encantada e muito satisfeita por os 665 grandes eleitores que o votaram terem dado um exemplo de seriedade e perfeita cognição das qualidades de quem deverá ocupar o mais alto cargo do Estado, logo, a importância das competências e honorabilidade de um presidente da República.

Como sempre, não posso deixar de estabelecer confrontos com o nosso país. A um ano de distância, mais ou menos, também em Portugal se efectuará a eleição do Presidente da República. Já se fala de candidatos. Deprimente! E nada mais quero acrescentar.

O Sr. Berlusconi e companheiros decidiram votar em branco - não todos, pois alguns traíram o partido e votaram o candidato eleito – visto que Matarella não entrava nas simpatias de Berlusconi. Tem motivos.

Anos atrás, Sérgio Matarella demitiu-se de ministro da Educação por discordar de uma medida do respectivo Governo que garantia o monopólio das frequências televisivas do império Berlusconi.
Ademais, Matarella, com toda a naturalidade, nunca poupou críticas ao Berlusconi político, pois soube compreender quais interesses se escondiam atrás das actividades políticas daquele indivíduo.

Em 1998, aquando do ingresso de Força Itália (partido de Berlusconi) no Partido Popular Europeu, eis a opinião de Matarella: “Parece-me um pesadelo irracional. …Berlusconi pense na história: quando os Hunos e os Vândalos invadiram o império romano, que não era a casa deles, experimentaram ser romanos, mas sendo bárbaros, não conseguiram”.

Berlusconi autoproclamou-se herdeiro político de Alcide De Gasperi. Comentário de Matarella: “De Gasperi pertence a todos aqueles que tomam muito a peito a democracia. Isto não significa que quem quer que seja se possa intitular um seu sequaz ou herdeiro”.

Termino com uma frase que exprime bem o equilíbrio de Matarella.
Nas instituições, um partido, um político deve sentir-se como um hóspede, mesmo se protagonista”.
Seria muito oportuno que este pensamento fosse insuflado na inteligência e insistentemente inculcado na memória de quem nos governa. Refiro-me ao actual Governo português, obviamente.