segunda-feira, abril 02, 2012

CASOS TRISTES
CASOS INQUIETANTES

As reformas dos contratos de trabalho, em alguns países da União Europeia, têm dado lugar a fortes reacções dos sindicatos e dos partidos de esquerda; greves e revoltas nas praças.
Segundo informam, a Comissão Europeia, nos últimos meses, elaborou um projecto com a finalidade de reformar o mercado laboral na Europa, “muito menos esquemático e bastante articulado”.
Diz o relatório da Comissão que o mercado europeu sofre de “segmentação”, devida à existência de trabalhadores temporários e trabalhadores a tempo indeterminado, isto é, excessiva protecção a quem tem emprego garantido. “O fenómeno provoca preocupações sobre o ponto de vista social e económico”.

Sintetizando, a solução europeia alvitra a existência de um contrato único que equilibre, nas devidas proporções, o cuidado entre quem usufrui de um emprego fixo e quem o não encontra ou trabalha temporariamente, visto que, nesta crise, o desemprego atinge o grau mais elevado nos trabalhadores precários e nos de baixas qualificações.

Mercê destas contracções económicas e laborais, a Itália está a atravessar um período de amplas controvérsias, acesas polémicas e consuetas tácticas partidárias sobre a reforma do mercado do trabalho.
O motivo da discórdia é o famigerado "Artigo 18 do Estatuto dos Trabalhadores". Grosso modo, os despedimentos podem ser declarados ineficazes ou nulos, quando “intimados sem justa causa ou motivo justificado”, nas empresas com mais de 15 trabalhadores; nas agrícolas, com mais de cinco.

Até hoje tem sido considerado um Artigo intocável. Num passado recente, as várias tentativas de anulação ou modificações ficaram goradas: intocável era, intocável ficou. Porém, urgem reestruturações, enquadradas na grande onda de desemprego e na era global.
O Governo de Mário Monti entende que esta reforma deve ser levada a bom fim e não desiste. Oxalá que os partidos, sindicatos e Governo consigam pôr o bom senso a funcionar, encontrem uma fórmula comparticipada, consentânea – acima de tudo que não desproteja quem trabalha - e que, finalmente, seja aprovada no Parlamento. Penso na Itália e no que se está a passar em Portugal a este respeito, obviamente.

Contratos de trabalho e desemprego; crise e dramas, sobretudo nas pequenas empresas. E eis-nos chegados aos casos tristes, à tragédia.

A maldita crise tem sido causa de uma cadeia de suicídios. Não somente entre pessoas sem emprego, que deslizam para a miséria e sem um horizonte de esperança, mas também de pequenos empresários e artesãos que não aguentam o peso das dificuldades económicas; a angústia de não encontrarem uma solução; o desespero de fechar e despedir trabalhadores com quem partilharam o êxito da própria actividade e que estimam.

Nada tenho lido sobre casos deste género no nosso país, mas na Itália são chocantes, comoventes - já no campo das dezenas - os factos narrados de pequenos empresários que põem termo à vida.
Uns, porque não conseguindo encaixar créditos de uma certa consistência, precipitam na falência e a solidão em que se vêem esmaga-os; outros, porque a crise os sufoca impiedosamente; outros ainda, porque têm problemas fiscais e não conseguem enfrentar o emaranhado da questão: foi este o caso de um artesão de Bolonha, na semana passada. Regou o carro de gasolina, incendiou-o e quis imolar-se dentro da viatura. Socorreram-no; está em estado gravíssimo. Pobre homem!

Continuo a reflectir sobre “a política do rigor e austeridade” e a considerar o comprazimento dos líderes de países bem nutridos que a impuseram sem considerar, além dos factores de crescimento económico que não são irrelevantes, o lado social e humano.
Concluo que não é a crise a única culpada de todos estes dramas; espero que se imponham à consciência, se a advertem, desses politicantes desprovidos da qualidade dos estadistas indiferentes a cálculos sem alma.

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Relativamente aos casos inquietantes, limitar-me-ei a poucas observações.
Que noção tem de democracia o Governo de Passos Coelho? É um governo de marca liberal equilibrado ou inspira-se no “liberismo” e na ebriedade do poder?
Será que Berlusconi fez escola? Dar-se-á o caso que o respeito pelos valores e regras democráticas apenas serve para discursos de ocasião e uma nova espécie de berlusconismo está a despontar nas Terras Lusas?
Se observarmos com atenção, há já modos comportamentais que para aí caminham.

É suficiente um caso que nos leve a meditar e a reagir. O comportamento agressivo e arrogante da polícia, na manifestação de Lisboa e onde foram agredidos dois jornalista - em 22 do mês passado - decididamente, não é compreensível nem tolerável. Quem lhes sugeriu caminho livre?
Não consta que a nossa polícia, anteriormente, se tivesse assinalado por atitudes desse género. Quem lhes inspirou esse desrespeito por quem manifesta ou participa numa greve, esquecendo o único papel de contenção que lhes é devido?