domingo, fevereiro 12, 2012

ALEMANHA, ACALMA-TE"

Germania, rilassati” (Alemanha, acalma-te): achei interessante este título, tema do dia, de um programa diário de RAI TRE.
Efectivamente, chegou a altura de elevar a voz e aconselhar as figuras representativas ou de maior vulto político daquele país a acalmar-se, descer do pedestal e retomar a aprendizagem sobre os imperativos da diplomacia, do respeito pela soberania de outros países e dignidade humana.

Este é um assunto sobre o qual decidira virar página. No entanto, não corre dia que não se deva assistir à ebriedade de quem se auto-elegeu representante de um país superior e, consequentemente, distribui comentários ou opiniões que poderemos classificar como diplomacia de baixa qualidade e, obviamente, arrogante.

Já muito foi dito sobre as críticas da Chanceler sobre o modo como a Madeira usou os fundos estruturais. Não faltou à verdade e devemos reconhecê-lo. Não obstante, plagiou a grosseria do soba madeirense, exprimindo opiniões que um verdadeiro estadista evitaria.

Quanto a Martin Schultz, surpreendeu-me o estranho comentário sobre a visita de Passos Coelho a Luanda “em busca de investimentos do governo angolano em Portugal”. Grosso modo, aventou que se tratava de uma política errada, pois só no quadro da UE haveria hipóteses de evitar o declínio.

Li e ouvi algumas entrevistas de Martin Schulz e admirei o equilíbrio e objectividade como enfrentava os actuais problemas europeus, sobretudo os dos países mais atingidos.
Qual a razão, agora, destas considerações tão incongruentes como impróprias de um presidente do Parlamento Europeu?
Que se passa com estes ilustres cidadãos alemães? É um vírus ou existem miasmas que lhes envenenam o bom senso?

Criticando estes comportamentos, certamente que não se procuram justificações para o despesismo incontrolado da nossa dívida soberana.

Mas o principal motivo que me levou a adoptar o título “Alemanha, acalma-te” e voltar a este assunto foi uma execrável iniciativa do Deutsche Bank.

Quando li a notícia - de quarta-feira passada - nos jornais portugueses e um editorial italiano que relatava e comentava esta iniciativa, tive de reler tudo com redobrada atenção, pois temi não ter compreendido, tal a infâmia que a revestia.
Mas deixo falar o autor do editorial.

Se os Bancos Lançam os Bond da Morte”.
Na frenética busca de novos “produtos financeiros”, com os quais continuar a intoxicar os mercados, o reverenciado Deutsche Bank superou todos os limites, tornando a própria vida das pessoas num objecto de especulação.

O caso pode resumir-se deste modo: individua-se, nos Estados Unidos, um grupo de cinquenta pessoas entre os 72 e os 85 anos; recolhem-se, com o consentimento destas pessoas, as informações sobre as suas condições de saúde; propõe-se de investir sobre a duração destas vidas.
Quanto mais rápido forem os falecimentos, maior é o lucro dos investidores. O lucro do banco, pelo contrário, cresce com a sobrevivência das pessoas que fazem parte do grupo seleccionado.
Assim nasceu aquilo a que alguém já definiu como “Os bond da morte”.

Foram muitas as reacções. A própria Associação dos bancos alemães disse que “o modelo financeiro deste fundo é contrário à nossa moral e à dignidade humana”.
Mas o facto permanece, sinal inquietante do que está a acontecer nos nossos tempos.
[…] Não quero evocar, com uma culpável superficialidade, tragédias do passado. Mas a decidida reacção da Associação dos bancos germânicos não se compreende se ignorarmos que precisamente ali, nos anos do nazismo, a formalização jurídica das “não pessoas” - os judeus em primeiro lugar - levou a considerar vidas e corpos como objectos disponíveis para o poder político e médico.
Hoje, o supremo poder da finança pensa de ter título para de tal se apoderar, num modo imediatamente menos destrutivo, mas que traz consigo a insídia da vida como mercadoria. […] – Stefano Rodotà; jornal “La Repubblica”.

Tudo isto não é somente contrário à moral e à dignidade humana: é repelente, é revoltante, é digno de uma intervenção judiciária imediata, de uma sentença severíssima e sem quaisquer atenuantes.

Uma pergunta, todavia, impõe-se: entre os membros dos órgãos administrativos do Deutsche Bank, não houve ninguém, não houve um único elemento que se opusesse a esta indecência?

Alemanha, acalma-te; mas, sobretudo, acorda, reflecte e não permitas que, em teu nome, alguns dos teus representantes e certas instituições te desacreditem.