O LEÃO DO DESERTO
“O Leão do Deserto” (Lion of the Desert) é o título de um filme histórico, realizado em 1981 e narra os últimos anos da resistência anti-italiana, na Líbia.
Este filme – com excelentes intérpretes, desde Anthony Queen a Irene Papas, Rod Steiger e outros - nunca foi visto nas salas de cinema italianas; menos ainda através de qualquer canal televisivo.
Em 1982, a comissão de censura bloqueou o filme com a seguinte justificação: “Prejudica a imagem do exército italiano”.
Tinha uma ideia muito superficial sobre estes factos, assim como sobre o homem que, durante vinte anos, foi o líder dessa luta na Cirenaica: Omar al Mukhtar, o “Leão do Deserto”. Os historiadores apresentam-no como um lutador de grande dignidade.
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Em 1930-31, o regime fascista entendeu que deveria esmagar, definitivamente, essa resistência.
Fechou em campos de concentração toda a população nómada e seminómada: marchas de cerca mil km, sem contemplações por velhos, mulheres e crianças. Eliminava-se os que ficavam para trás.
Cem mil internados em dois campos e um único médico. Em pouco tempo, a escassa alimentação, trabalhos forçados, tifo e outras doenças dizimaram mais de metade.
Bombardearam oásis; usaram granadas com pirite, armas já então proibidas. – Giorgio Frasca Polara; libertaegiustizia.it
Nenhum tipo de ataque foi ignorado, além da destruição de cultivações e poços de água envenenados ou destruídos.
O general Rodolfo Graziani, por ordens superiores, pôs em acção todos e quaisquer meios violentos, a fim de atingir o ápice do horror.
Em 1931 capturaram Omar al Mukhtar, já com setenta anos. Processado sumariamente, condenaram-no à morte. Foi enforcado em Setembro desse ano. Motivação da sentença: “Tentou desligar esta Colónia da Pátria Mãe”.
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Estes factos aconteceram nos anos trinta do século passado. Havia a ideologia totalitária fascista, onde era glorificada qualquer violência consolidante dessa ideologia.
Bloquear o filme “O Leão do Deserto”, em 1982, porque danificaria a imagem do exército italiano, é uma justificação não só inaceitável como pueril.
O exército hodierno, de um país democrático, não pode ser responsável pelas atrocidades cometidas pelos membros de um exército que agia dentro do execrável regime ditatorial e ideologicamente plasmado nesse sentido.
Não será um modo de fugir ao acertamento de contas sobre tudo o que se passou nesse período das camisas negras de Mussolini?
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O coronel Muhammar Kadhafi (ou Gheddafi) efectuou uma visita oficial à Itália que durou três dias – de 11 a 13 de Junho: “Estou aqui porque a Itália pediu desculpa à Líbia”.
Como habitualmente, pretendeu um local para instalar a enorme tenda beduína, onde receber as visitas.
Foi montada no lindo parque de Villa Dora Pamphili… e choveram os protestos.
Pretendeu que, a esperá-lo no aeroporto, fosse o primeiro-ministro Berlusconi. Se este ali não estivesse, imediatamente regressaria a Tripoli.
Quando desceu do avião, vestido com uma farda carnavalesca, na lapela ostentava a fotografia emoldurada, em ponto pequeno, de Omar al Mukhtar, o grande herói nacional.
Asseriu que a foto de Al Mukhtar é como o crucifixo para os cristãos.
O Governo italiano quis proporcionar-lhe encontros variados e de alto nível, além de lhe conceder o privilégio de falar nas aulas do Senado da República e da Câmara dos Deputados – os dois ramos do Parlamento.
Qual Parlamento qual carapuça para um ditador de tal jaez!
A decência, na boca de numerosos opositores, bateu o pé e tiveram de encontrar outras salas que não as aulas parlamentares a servir de palco à grosseria e arrogância daquele homem.
Todas estas deferências a uma personagem discutibilíssima, mesmo na veste de actual presidente da União Africana, provocaram um mar de contestações.
Entendem-se as razões da oportunidade de estreitar amplos e recíprocos acordos económicos – aliás, num acordo assinado o ano passado, a Itália comprometeu-se a indemnizar a Líbia, pelo seu passado colonialista, com cinco mil milhões de dólares, no período de 20 anos – financiará obras de infra-estruturas.
Entende-se que a Itália queira procurar a colaboração líbia para a contenção das grandes ondas migratórias – uma colaboração indecente, dado o tipo de brutalidade que a Líbia pratica contra os desgraçados migrantes que passam pelo seu território.
Entende-se a necessidade italiana dos recursos energéticos fornecidos pela Líbia.
No entanto, dada a personagem, o bom gosto e dignidade de Estado deveriam sugerir tons mais discretos, embora sempre correctos para com o hóspede que representava um país vizinho.
As indelicadezas e atropelos ao protocolo foram a jacto contínuo.
Os discursos que proferiu tresandavam a insolência e provocação: “USA como Al Qaeda”; o terrorismo pode ter uma justificação; a pirataria dos somalis, idem; os partidos são um aborto da democracia…
Enumerar todas as bacoradas que emitiu, sem pejo nem respeito pelo lugar onde se encontrava, é tarefa pesada.
Tiveram de esperar longamente, antes que o ilustre hóspede aparecesse nas sedes institucionais onde era esperado.
Quando chegou a vez de ser recebido na Câmara dos Deputados, o Presidente da Câmara esperou uma, duas horas. Passado esse tempo, sem outras contemplações diplomáticas, decidiu anular o encontro, assumindo a responsabilidade de tal acto.
Bravíssimo Presidente! Era mais que tempo que alguém pusesse um freio ao comportamento daquele malcriado.
“O Leão do Deserto” (Lion of the Desert) é o título de um filme histórico, realizado em 1981 e narra os últimos anos da resistência anti-italiana, na Líbia.
Este filme – com excelentes intérpretes, desde Anthony Queen a Irene Papas, Rod Steiger e outros - nunca foi visto nas salas de cinema italianas; menos ainda através de qualquer canal televisivo.
Em 1982, a comissão de censura bloqueou o filme com a seguinte justificação: “Prejudica a imagem do exército italiano”.
Tinha uma ideia muito superficial sobre estes factos, assim como sobre o homem que, durante vinte anos, foi o líder dessa luta na Cirenaica: Omar al Mukhtar, o “Leão do Deserto”. Os historiadores apresentam-no como um lutador de grande dignidade.
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Em 1930-31, o regime fascista entendeu que deveria esmagar, definitivamente, essa resistência.
Fechou em campos de concentração toda a população nómada e seminómada: marchas de cerca mil km, sem contemplações por velhos, mulheres e crianças. Eliminava-se os que ficavam para trás.
Cem mil internados em dois campos e um único médico. Em pouco tempo, a escassa alimentação, trabalhos forçados, tifo e outras doenças dizimaram mais de metade.
Bombardearam oásis; usaram granadas com pirite, armas já então proibidas. – Giorgio Frasca Polara; libertaegiustizia.it
Nenhum tipo de ataque foi ignorado, além da destruição de cultivações e poços de água envenenados ou destruídos.
O general Rodolfo Graziani, por ordens superiores, pôs em acção todos e quaisquer meios violentos, a fim de atingir o ápice do horror.
Em 1931 capturaram Omar al Mukhtar, já com setenta anos. Processado sumariamente, condenaram-no à morte. Foi enforcado em Setembro desse ano. Motivação da sentença: “Tentou desligar esta Colónia da Pátria Mãe”.
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Estes factos aconteceram nos anos trinta do século passado. Havia a ideologia totalitária fascista, onde era glorificada qualquer violência consolidante dessa ideologia.
Bloquear o filme “O Leão do Deserto”, em 1982, porque danificaria a imagem do exército italiano, é uma justificação não só inaceitável como pueril.
O exército hodierno, de um país democrático, não pode ser responsável pelas atrocidades cometidas pelos membros de um exército que agia dentro do execrável regime ditatorial e ideologicamente plasmado nesse sentido.
Não será um modo de fugir ao acertamento de contas sobre tudo o que se passou nesse período das camisas negras de Mussolini?
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O coronel Muhammar Kadhafi (ou Gheddafi) efectuou uma visita oficial à Itália que durou três dias – de 11 a 13 de Junho: “Estou aqui porque a Itália pediu desculpa à Líbia”.
Como habitualmente, pretendeu um local para instalar a enorme tenda beduína, onde receber as visitas.
Foi montada no lindo parque de Villa Dora Pamphili… e choveram os protestos.
Pretendeu que, a esperá-lo no aeroporto, fosse o primeiro-ministro Berlusconi. Se este ali não estivesse, imediatamente regressaria a Tripoli.
Quando desceu do avião, vestido com uma farda carnavalesca, na lapela ostentava a fotografia emoldurada, em ponto pequeno, de Omar al Mukhtar, o grande herói nacional.
Asseriu que a foto de Al Mukhtar é como o crucifixo para os cristãos.
O Governo italiano quis proporcionar-lhe encontros variados e de alto nível, além de lhe conceder o privilégio de falar nas aulas do Senado da República e da Câmara dos Deputados – os dois ramos do Parlamento.
Qual Parlamento qual carapuça para um ditador de tal jaez!
A decência, na boca de numerosos opositores, bateu o pé e tiveram de encontrar outras salas que não as aulas parlamentares a servir de palco à grosseria e arrogância daquele homem.
Todas estas deferências a uma personagem discutibilíssima, mesmo na veste de actual presidente da União Africana, provocaram um mar de contestações.
Entendem-se as razões da oportunidade de estreitar amplos e recíprocos acordos económicos – aliás, num acordo assinado o ano passado, a Itália comprometeu-se a indemnizar a Líbia, pelo seu passado colonialista, com cinco mil milhões de dólares, no período de 20 anos – financiará obras de infra-estruturas.
Entende-se que a Itália queira procurar a colaboração líbia para a contenção das grandes ondas migratórias – uma colaboração indecente, dado o tipo de brutalidade que a Líbia pratica contra os desgraçados migrantes que passam pelo seu território.
Entende-se a necessidade italiana dos recursos energéticos fornecidos pela Líbia.
No entanto, dada a personagem, o bom gosto e dignidade de Estado deveriam sugerir tons mais discretos, embora sempre correctos para com o hóspede que representava um país vizinho.
As indelicadezas e atropelos ao protocolo foram a jacto contínuo.
Os discursos que proferiu tresandavam a insolência e provocação: “USA como Al Qaeda”; o terrorismo pode ter uma justificação; a pirataria dos somalis, idem; os partidos são um aborto da democracia…
Enumerar todas as bacoradas que emitiu, sem pejo nem respeito pelo lugar onde se encontrava, é tarefa pesada.
Tiveram de esperar longamente, antes que o ilustre hóspede aparecesse nas sedes institucionais onde era esperado.
Quando chegou a vez de ser recebido na Câmara dos Deputados, o Presidente da Câmara esperou uma, duas horas. Passado esse tempo, sem outras contemplações diplomáticas, decidiu anular o encontro, assumindo a responsabilidade de tal acto.
Bravíssimo Presidente! Era mais que tempo que alguém pusesse um freio ao comportamento daquele malcriado.
Alda M. Maia
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