QUANDO NÃO HÁ FACCIOSISMO
(ANÁLISE DE AVRAHAM B. YEHOSHUA)
Quero traduzir e deixar neste blogue um esplêndido artigo do escritor israeliano Avraham Yehoshua, publicado no jornal “La Stampa”, em 27 de Novembro 2007.
(ANÁLISE DE AVRAHAM B. YEHOSHUA)
Quero traduzir e deixar neste blogue um esplêndido artigo do escritor israeliano Avraham Yehoshua, publicado no jornal “La Stampa”, em 27 de Novembro 2007.
É uma análise objectiva do conflito israelo-árabe. Vale a pena ser lida e por duas razões: não é escrita por um observador neutral; apresenta os factos com lucidez e honestidade.
Eis o texto traduzido do italiano
****
ANNAPOLIS, A 30 ANOS DA PAZ COM SADAM
Avraham B. Yehoshua
Agora que os olhos de todos, em Israel e talvez no mundo árabe, estão dirigidos com esperança e também grande incerteza para a conferência de Annapolis, recordamos, com saudade, a surpreendente visita do Presidente egípcio Sadat a Israel, em Novembro de 1977, considerada como uma viragem dramática, única na história da diplomacia e que antecipou a assinatura de um tratado de paz entre o Egipto e Israel.
Nestes últimos dias, a televisão israeliana transmite as imagens do avião presidencial egípcio no aeroporto Ben Gurion de Telavive e do Presidente Sadat que desce as escadas, emocionado, ao som do Hino nacional de Israel.
A visita foi organizada com grande rapidez. De surpresa, Sadat anunciou, no Parlamento egípcio, a sua intenção de deslocar-se a Israel. Poucos dias depois, quando israelitas, egípcios e todo o universo árabe ainda digeriam com dificuldade o dramático anúncio, já ele tinha aterrado no Estado Hebraico.
Eu, e todo os meus compatriotas, seguimos a visita deste líder corajoso com sincera emoção e lágrimas de alegria.
Sempre acreditei que chegaria o dia em que os árabes reconheceriam o Estado de Israel e concluído a paz connosco. Não acreditava que isso acontecesse no arco da minha vida; mas aconteceu.
Os pontos principais do acordo tinham sido ajustados antes da visita de Sadat, a qual era destinada, mais que por qualquer outra razão, a forçar um bloco psicológico dos israelitas.
Tais pontos previam a restituição de todo o deserto do Sinai e a sua desmilitarização, em troca de uma normalização das relações entre o Egipto e Israel.
O primeiro-ministro israelita, Menachem Begin, nutria a esperança que o seu País pudesse manter o controlo sobre alguns locais, na região de El Arish, mas Sadat opôs-se categoricamente, e com muita razão. A terra é também identidade e não havia motivo para que o Egipto renunciasse a uma parte do seu território (embora mínima) a favor de Israel.
Não voltarei à história das negociações, que foram árduas e complexas, embora os pontos principais tivessem sido estabelecidos a priori.
Sob a pressão de um movimento popular, fundado em 1978 e denominado “Peace Now”, o Governo israelita recebeu uma mensagem imperativa: negociai até à exaustão as condições de paz, mas não percais, absolutamente, a ocasião de concluí-la agora. Onde a palavra-chave era "agora".
O então ministro dos Negócios Estrangeiros, Moshe Dayan, e o da Defesa, Ezer Weizmann, fizeram própria essa mensagem. A pressão que eles também exerceram convenceu Menachem Begin a renunciar a ocupações israelitas no Sinai e o tratado de paz foi assinado no jardim da Casa Branca.
O acordo com o maior Estado árabe teria podido, já então, dar impulso a um processo de paz com todas as nações árabes. Mas Menachem Begin, que obteve o prémio Nobel da Paz por aquele acordo, cometeu três erros gravíssimos que influíram sobre a dinâmica dos eventos e fizeram precipitar a região em sucessivas guerras e conflitos.
Quer Ezer Weizmann, quer Moshe Dayan, apercebendo-se da perigosa direcção que tomava Begin, demitiram-se do Governo, pouco tempo depois do acordo com o Egipto.
Begin, líder de direita, homem de personalidade complexa e com tendências maníaco-depressivas, nomeou para o ministério da Defesa uma personagem extremista e perigosa, Ariel Sharon.
Decidiu, de imediato, anexar formalmente as Alturas de Golã, qual compensação pela renúncia do Sinai. Deste modo, transformou a Síria, de potencial dialogante, num inimigo total; levou-a a consolidar o seu apoio a Hezbollah, no Líbano, assim como ao movimento palestiniano Hamas.
Além disso, tendo sancionado a anexação do Golã com uma lei que só pode ser revogada por uma maioria relativa do parlamento (Knesset), eis a razão por que qualquer entendimento com a Síria permanece, ainda hoje, extremamente problemático.
Em segundo lugar, disseminou colonatos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, comprometendo qualquer futura possibilidade de criar um Estado palestiniano e tornando complexa uma eventual solução do problema. Se, a seu tempo, os americanos tivessem impedido Begin de levar a cabo o seu grandioso programa de ocupações, ter-se-ia poupado, em trinta anos, o constante vaivém de Secretários de Estado, na tentativa de criar um acordo.
Em terceiro lugar, em Junho de 1982, Begin desencadeou a primeira guerra no Líbano: um conflito desastroso e sangrento que deu origem à organização extremista Hezbollah e empenhou Israel em duros recontros.
A intenção era de expulsar, do Líbano, os milicianos da OLP, mas tal objectivo foi alcançado através de um pesadíssimo custo.
Os milicianos da OLP, refugiados na Tunísia, regressaram aos territórios ocupados da Palestina, depois do acordo de Oslo. Abu Mazen, o actual partner palestiniano para um eventual tratado de paz com Israel, é um deles.
Um ano após a invasão do Líbano, Begin, reconhecendo provavelmente os erros cometidos, demitiu-se do Governo e encerrou-se, deprimido e solitário, na sua casa.
Sadat foi assassinado no Cairo por um fanático muçulmano, devido ao acordo de paz assinado com Israel e pelo processo de modernização que tinha empreendido no seu País. Era um líder audaz, idealista que, assumindo riscos e tomando uma iniciativa de profundo significado histórico, contribuiu para a paz mundial.
Diferentemente de Sadat, Menachem Begin não somente não soube aproveitar o entendimento com o Egipto, a fim de conseguir o apaziguamento de toda aquela região, mas transformou-o num álibi para prosseguir numa política destrutiva e trágica. Os sucessores, no governo, deverão trabalhar arduamente para remediar os seus erros.
Eis o texto traduzido do italiano
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ANNAPOLIS, A 30 ANOS DA PAZ COM SADAM
Avraham B. Yehoshua
Agora que os olhos de todos, em Israel e talvez no mundo árabe, estão dirigidos com esperança e também grande incerteza para a conferência de Annapolis, recordamos, com saudade, a surpreendente visita do Presidente egípcio Sadat a Israel, em Novembro de 1977, considerada como uma viragem dramática, única na história da diplomacia e que antecipou a assinatura de um tratado de paz entre o Egipto e Israel.
Nestes últimos dias, a televisão israeliana transmite as imagens do avião presidencial egípcio no aeroporto Ben Gurion de Telavive e do Presidente Sadat que desce as escadas, emocionado, ao som do Hino nacional de Israel.
A visita foi organizada com grande rapidez. De surpresa, Sadat anunciou, no Parlamento egípcio, a sua intenção de deslocar-se a Israel. Poucos dias depois, quando israelitas, egípcios e todo o universo árabe ainda digeriam com dificuldade o dramático anúncio, já ele tinha aterrado no Estado Hebraico.
Eu, e todo os meus compatriotas, seguimos a visita deste líder corajoso com sincera emoção e lágrimas de alegria.
Sempre acreditei que chegaria o dia em que os árabes reconheceriam o Estado de Israel e concluído a paz connosco. Não acreditava que isso acontecesse no arco da minha vida; mas aconteceu.
Os pontos principais do acordo tinham sido ajustados antes da visita de Sadat, a qual era destinada, mais que por qualquer outra razão, a forçar um bloco psicológico dos israelitas.
Tais pontos previam a restituição de todo o deserto do Sinai e a sua desmilitarização, em troca de uma normalização das relações entre o Egipto e Israel.
O primeiro-ministro israelita, Menachem Begin, nutria a esperança que o seu País pudesse manter o controlo sobre alguns locais, na região de El Arish, mas Sadat opôs-se categoricamente, e com muita razão. A terra é também identidade e não havia motivo para que o Egipto renunciasse a uma parte do seu território (embora mínima) a favor de Israel.
Não voltarei à história das negociações, que foram árduas e complexas, embora os pontos principais tivessem sido estabelecidos a priori.
Sob a pressão de um movimento popular, fundado em 1978 e denominado “Peace Now”, o Governo israelita recebeu uma mensagem imperativa: negociai até à exaustão as condições de paz, mas não percais, absolutamente, a ocasião de concluí-la agora. Onde a palavra-chave era "agora".
O então ministro dos Negócios Estrangeiros, Moshe Dayan, e o da Defesa, Ezer Weizmann, fizeram própria essa mensagem. A pressão que eles também exerceram convenceu Menachem Begin a renunciar a ocupações israelitas no Sinai e o tratado de paz foi assinado no jardim da Casa Branca.
O acordo com o maior Estado árabe teria podido, já então, dar impulso a um processo de paz com todas as nações árabes. Mas Menachem Begin, que obteve o prémio Nobel da Paz por aquele acordo, cometeu três erros gravíssimos que influíram sobre a dinâmica dos eventos e fizeram precipitar a região em sucessivas guerras e conflitos.
Quer Ezer Weizmann, quer Moshe Dayan, apercebendo-se da perigosa direcção que tomava Begin, demitiram-se do Governo, pouco tempo depois do acordo com o Egipto.
Begin, líder de direita, homem de personalidade complexa e com tendências maníaco-depressivas, nomeou para o ministério da Defesa uma personagem extremista e perigosa, Ariel Sharon.
Decidiu, de imediato, anexar formalmente as Alturas de Golã, qual compensação pela renúncia do Sinai. Deste modo, transformou a Síria, de potencial dialogante, num inimigo total; levou-a a consolidar o seu apoio a Hezbollah, no Líbano, assim como ao movimento palestiniano Hamas.
Além disso, tendo sancionado a anexação do Golã com uma lei que só pode ser revogada por uma maioria relativa do parlamento (Knesset), eis a razão por que qualquer entendimento com a Síria permanece, ainda hoje, extremamente problemático.
Em segundo lugar, disseminou colonatos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, comprometendo qualquer futura possibilidade de criar um Estado palestiniano e tornando complexa uma eventual solução do problema. Se, a seu tempo, os americanos tivessem impedido Begin de levar a cabo o seu grandioso programa de ocupações, ter-se-ia poupado, em trinta anos, o constante vaivém de Secretários de Estado, na tentativa de criar um acordo.
Em terceiro lugar, em Junho de 1982, Begin desencadeou a primeira guerra no Líbano: um conflito desastroso e sangrento que deu origem à organização extremista Hezbollah e empenhou Israel em duros recontros.
A intenção era de expulsar, do Líbano, os milicianos da OLP, mas tal objectivo foi alcançado através de um pesadíssimo custo.
Os milicianos da OLP, refugiados na Tunísia, regressaram aos territórios ocupados da Palestina, depois do acordo de Oslo. Abu Mazen, o actual partner palestiniano para um eventual tratado de paz com Israel, é um deles.
Um ano após a invasão do Líbano, Begin, reconhecendo provavelmente os erros cometidos, demitiu-se do Governo e encerrou-se, deprimido e solitário, na sua casa.
Sadat foi assassinado no Cairo por um fanático muçulmano, devido ao acordo de paz assinado com Israel e pelo processo de modernização que tinha empreendido no seu País. Era um líder audaz, idealista que, assumindo riscos e tomando uma iniciativa de profundo significado histórico, contribuiu para a paz mundial.
Diferentemente de Sadat, Menachem Begin não somente não soube aproveitar o entendimento com o Egipto, a fim de conseguir o apaziguamento de toda aquela região, mas transformou-o num álibi para prosseguir numa política destrutiva e trágica. Os sucessores, no governo, deverão trabalhar arduamente para remediar os seus erros.
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