“OS TERRORISTAS NÃO
VÃO PARA O PARAÍSO”
Tahar Ben Jelloun
Já não é a primeira
vez que, neste blogue, dedico o meu texto ao escritor marroquino que vive em
França, Tahar Ben Jelloun.
Se antes aludi ao
livro deste autor, “O racismo explicado à
minha filha”, hoje traduzo a mensagem que Ben Jelloun endereçou às
crianças sobre o terrorismo islâmico (publicada no jornal italiano La Stampa).
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Quero explicar que o
Islão não predica violência e que esta mensagem deve chegar às escolas dos
nossos filhos.
Após o dia 13 de
Novembro 2015, a noite da tragédia do Bataclan que fechou com 130 mortos e 413
feridos, pensei nas famílias que perderam os seus entes queridos. Para além da
dor e do luto, para além do horror, disse a mim mesmo: «um pai como poderá
explicar ao filho que a sua irmã ou o seu irmão morreu, indo a um concerto?
Como enfrentar o tema do terrorismo e dos que o praticam, os terroristas? Como
escolher as palavras adequadas e dizer a verdade?
Reflectindo sobre o
assunto, concluí que o terrorismo não é um fenómeno novo. Existiu desde sempre
e foi utilizado como arma de chantagem para difundir o medo e o pânico. Por
este motivo, contei a história do terrorismo, a partir da revolução francesa
até aos nossos dias.
Os actores e as
motivações mudam, mas os métodos são sempre os mesmos, embora actualmente com
qualquer coisa de novo: o recurso aos media às redes sociais network que fazem
viver os eventos no imediato e em directa.
Às crianças é
necessário dizer a verdade. Mentir, escondendo-lhes a realidade dos factos com
receio de transtorná-las ou de traumatizá-las é uma escolha errada. Cedo ou
tarde, a verdade chegar-lhes-á. Logo, é melhor prepará-las no momento em que as
coisas acontecem. Acabou o tempo no qual as crianças eram protegidas, sinónimo
de doçura e alegria. Hoje, imagens de todos os tipos invadem o nosso espaço,
seja na rua ou em casa, na televisão ou no ecrã do nosso computador. A Internet
vem procurar-nos e encontra-nos. As novas tecnologias abalaram a percepção do
mundo e confundiram-na com o virtual, acabando por tomar o lugar da realidade.
Tudo isto os
terroristas do Estado Islâmico sabem-no bem e exploram-no com eficácia. As
coisas mais difíceis de explicar às crianças, quando se fala de terrorismo, são
as motivações destas pessoas. Como fazer compreender a uma criança que o
instinto de vida e de conservação se transforma em instinto de morte? Como expor-lhes
o famoso «paraíso» que os terroristas apresentam aos jovens que recrutam para a
Jihad?
Apercebi-me que era preciso
recuar às origens do Islão e reconstruir como algumas pessoas interpretam a
palavra de Deus. As crianças, todavia, não podem absorver todas estas
informações históricas. É necessário simplificar, tornar claro o que é
complexo, ir ao essencial. Dizer-lhes, por exemplo, que as religiões,
frequentemente, foram utilizadas pela gente por razões erradas. Pode-se fazer
dizer às religiões o que se quer. No livro, a este propósito, dou alguns
exemplos para cada uma das três religiões monoteístas. Deve-se evitar que as
crianças sobreponham Islão e terrorismo e recordar-lhes um verseto importante
do Corão: «Aquele que mata um inocente
mata a humanidade inteira».
Iniciei a escrever
este livro depois de ter explicado o racismo e, num segundo tempo, o Islão. Fiz
um trabalho pedagógico preciso, feito de verificações e num estilo que
estivesse ao alcance de todos.
Estas experiências
levaram-me a centenas de escolas no mundo, onde estes livros foram traduzidos.
Apercebi-me que todas as crianças se assemelham, seja qual for o lugar de
origem. Mais ou menos, todas formulavam as mesmas perguntas.
Quando sucedeu o
ataque a Charlie Hebdo e, depois, à
loja Kosher em Vincennes, em 07 de Janeiro 2015, não somente senti horror, mas
fiquei mesmo sem palavras. Já não sabia mais que dizer, o que fazer. Perdi dois
amigos entre os humoristas de Charlie: Wolinski e Cabu que conhecia de há 35
anos.
“A perturbação e
depois a impotência das famílias precipitaram-me num desencorajamento que me
desconcertava. Em seguida, novos ataques, em plena Paris, com muitas dezenas de
mortos, alguns dos quais de confissão muçulmana. Compreendi a mensagem: os
terroristas queriam atacar o estilo de vida dos franceses. Depois de ter
«punido» a liberdade de expressão, quiseram matar os que, num sábado à noite,
se divertiam. Foi então que decidi ir escavar na história e na psicologia, a
fim de compreender – ou, pelo menos, procurar compreender – as origens deste
fenómeno que não tem precedentes, nem no Islão nem na história do mundo árabe.
Às crianças que
encontrei nas escolas, disse quanto este terrorismo fosse incompreensível e
absolutamente injustificável. «E então
por que existe?», perguntavam elas.
Sem entrar na
filosofia niilista ou na ideologia do sacrifício, procurei demonstrar quanto o
que sucede seja difícil de compreender. Em seguida, disse que, na história,
frequentemente, houve pessoas que exprimiram a própria revolta contra a
sociedade, provocando pânico e morte entre cidadãos inocentes. Expliquei-lhes
também quanto o mundo árabe (e muçulmano) seja atravessado por crises profundas
e como a maior parte dos governantes não tenha sido democrática nem tenha
respeitado os cidadãos.
“Porquê a França, a
Bélgica, a Alemanha? Porque ali vivem os filhos dos imigrados, vindo do
Magrebe, que não se adaptaram à vida europeia. A cultura escassa, as
fragilidades familiares permitiram aos recrutadores da Jihad convencê-los a
mudar vida e escolher a morte que lhes garante o ingresso no paraíso, onde
serão recompensados pelos seus sacrifícios.
Também lhes dizem:
«No Ocidente, na vossa vida não vos realizastes; com a Jihad realizar-vos-eis
com a morte e tereis uma vida decididamente melhor»- Tahar
Ben Jelloun - La Stampa, 16 / 02 / 2017
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