“A OUTRA EUROPA”
“A
Outra Europa com Tsipras”
ou, ainda, “A Lista Tsipras” é uma
lista eleitoral lançada por um grupo de intelectuais italianos, entre os quais
Bárbara Spinelli, filha de Altiero Spinelli, um dos sonhadores e promotores da
União Europeia.
Alexis Tsipras, como
todos sabem, é um jovem político – 39 anos - da esquerda radical grega e líder
do partido Syriza. Tornou-se muito popular na Europa e, pelos vistos, “seduziu
a nova esquerda europeia” que o propõe como candidato à presidência da Comissão
Europeia.
Ontem, no programa dominical
“Em Meia Hora” de RAI 3 (horas 14,30), onde a conhecida
jornalista Lucia Annunziata entrevista personagens públicas, sobretudo do mundo
político, assisti precisamente a uma entrevista a Tsipras.
Em Janeiro passado já
tinha lido o prefácio que Tsipras escrevera no livro “O Que Quer a Europa?” (What Does Europe Want?) dos autores Slavoj
Zizek (filósofo esloveno) e Sreck Horvat (filósofo croato). Surpreendeu-me, pois
esperava a consueta retórica extremista e deparei com uma análise do próprio
país e da crise que o estrangulou muito semelhante à de tantos outros
analistas objectivamente equilibrados.
Seguindo-o na
entrevista de ontem, não resta dúvida que Alexis Tsipras, além da afabilidade
como se exprime, possui o grande dom de saber comunicar e defender as suas
ideias.
Para quem não aprecia
radicalismos, torna-se difícil subtrair-se aos argumentos que Tsipras sabe
expor com uma certa objectividade, especificamente no que concerne a UE. Certamente
que não se pode classificar como antieuropeu. Oxalá seja sincero.
O semanário alemão Der Spiegel definiu-o como “o inimigo n.º 1 da Europa”. Comentário de
Tsipras, na entrevista: “Sinto-me muito honrado por merecer esse
título, se isso significa ser perigoso para os banqueiros e para o grande
capital”.
E prossegue: “A nossa escolha de ter esta lista de uma “Outra Europa para a Itália”
significa que estamos convencidos de conseguir mudar os equilíbrios nestas
Eleições Europeias. Com estas eleições não se escolhem eurodeputados, mas
escolhe-se a nossa vida.
Por
um lado, existe o populismo, culpável de querer desagregar a União Europeia;
pelo outro, existem as políticas de austeridade que só tem feito mal ao
projecto europeu.
Não
devemos perder esta ocasião. A política da austeridade e da desagregação social
conduz a becos sem saída. Chegou o momento de dizer basta”.
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Do prefácio no livro
atrás citado, traduzo alguns parágrafos cujas observações não se afastam do que
tantos outros, sem radicalismos, testemunharam.
“Desde
meados dos anos noventa, e durante quase todo o decénio de 2000, a Grécia
estava em pleno crescimento. Esta expansão económica tinha duas características
principais: um gigantesco acréscimo dos lucros não tributáveis para os ricos;
um sobreendividamento e um aumento do desemprego para os pobres. O dinheiro
público foi depredado em muitos modos diversos; o sistema económico limitou-se,
essencialmente, a favorecer o consumo de bens importados dos países europeus
ricos.
O
modelo “dinheiro barato, mão-de-obra a baixo custo” foi apresentado pelas
agências de rating como um exemplo a seguir por cada economia emergente
dinâmica.”
"A
realidade é que a crise da economia grega não é o que interessa à Europa nem ao
FMI. O objectivo principal é fazer do programa imposto à Grécia o modelo para
todas as economias europeias em crise.
Este
programa põe um fim definitivo ao que, na Europa do pós-guerra, era conhecido
como «contrato social».
Não
importa se a Grécia, por fim, entra em falência ou afunda na miséria. O que
conta é que, num país da zona euro, agora se discuta abertamente de salários à
chinesa, de abolição do direito ao trabalho, da dissolução da segurança social
e do Estado social, da completa privatização dos bens públicos.
Com
o pretexto de combater a crise, o sonho neoliberalista das mentes mais perversas –
que, depois dos anos noventa, teve de enfrentar uma forte resistência por parte
das sociedades europeias – tornou-se, finalmente, realidade.
"A
experiência dos anos precedentes leva-nos à seguinte conclusão: existe uma
ética da política e uma ética da economia. Depois de 1989, a ética da economia
começou a dominar a ética da política e da democracia. Tudo o que era de
interesse para dois, cinco, dez grupos económicos potentes foi considerado como
legítimo, embora se demonstrasse contrário aos direitos humanos mais
elementares. Hoje, o nosso dever é repor a hegemonia dos princípios éticos
políticos e sociais contra a lógica dos lucros.”
"O
futuro não pertence ao neoliberalismo nem aos banqueiros nem a qualquer dúzia
de potentes multinacionais. O futuro pertence aos povos e às sociedades. É o
momento de abrir a estrada a uma Europa democrática, social e livre, porque
esta é a única solução sustentável, realística e realizável para sair da crise
actual."
Tudo o que acabo de
transcrever não nos diz nada, a nós, portugueses?
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