SEMPRE E SOMENTE A AMÉRICA?
Penso que as críticas ao Presidente Obama, apresentado
como um indeciso, desorientado e prisioneiro da famigerada “linha vermelha” não
sejam justas. Vejo-as mais alicerçadas em análises e conclusões de rotina do
que num exame objectivo sobre a relutância deste presidente americano em
envolver-se em novos conflitos armados. Aliás, sempre demonstrou esta aversão.
Qual a razão, portanto, que se pretenda seja sempre a
América a responsabilizar-se, quando as tragédias explodem em qualquer parte do
mundo, os direitos humanos são espezinhados e as populações devem ser
protegidas?
Há quem lhe chame “A maldição da América”. Será. Frequentemente
porque são impelidos a ir em socorro de países aliados; noutras circunstâncias,
por decisões de presidentes irresponsáveis e medíocres: sirva de exemplo a
estúpida e desastrosa invasão do Iraque, péssima herança de George W. Bush.
Todavia, que fazem os demais países, membros da ONU?
Meros espectadores?
Aludo à Organização das Nações Unidas, pois é dali que
deveriam partir as iniciativas e o envolvimento de todas aquelas nações de boa
vontade – ainda haverá? – que procuram a solução dos conflitos entre as nações
e não toleram, e nunca devem tolerar, o uso de armas de destruição maciça,
vetadas por 98 a 99% da comunidade internacional.
E chegamos ao facto concreto: na guerra civil da Síria,
quem dispersou os gases tóxicos nos arredores de Damasco, bem sabendo que as
vítimas contar-se-iam entre a população inocente? Números oficiais referem 1429
pessoas, inclusive 426 crianças. As múltiplas fotografias que testemunham este
drama emocionam e assustam!
Sobre os autores deste cinismo infinito e que nada,
absolutamente nada pode justificar, há lugar para dúvidas, visto que nenhuma
das partes em luta merece credibilidade.
Se Bashar al-Assad e o seu entourage se têm demonstrado implacáveis no uso da violência, os
opositores não são melhores no que concerne actos de pura e injustificada
crueldade. Os documentos comprovativos não escasseiam.
No entanto, tudo aponta para uma iniciativa das forças
governativas, embora incompreensível quanto a eficácia e oportunidade. Mas é
sempre difícil interpretar acções deste género, quando provém de cultores da
violência pela violência.
Insisto: porquê somente a América e o seu Presidente
devem dar uma resposta concreta às arbitrariedades de déspotas que ultrajam e
esmagam os direitos humanos? Por que razão devem sacrificar os seus soldados e
imensos recursos a causas que, afora a defesa de seres inermes que, moralmente,
é uma grande satisfação, materialmente em nada compensam estes sacrifícios?
Que ganhou a América com as duas Guerras Mundiais? E depois de uma Europa em ruínas, quem de novo a levantou com o Plano
Marshall?
Estas observações são directas aos devotos do
antiamericanismo.
Fiquei satisfeita que Obama tivesse entregado ao
Congresso a decisão de intervir na Síria. Evitaram-se precipitações, deu-se
oportunidade a que iniciativas de carácter político possam criar situações mais
racionais e aconselháveis, deu-se tempo a que, na ONU, surjam propostas que
ponham termo a massacres contínuos. Como início, há quem sugira uma condenação dura
e clara ao regime de Assad, na Assembleia Geral daquele organismo. Imediatamente
se veria, nos 22 países da Liga Árabe, por exemplo, quem são os que agem
espontaneamente, pondo de lado certas ambiguidades.
Seria também oportuno que se pusesse a nu,
condenando-os, os fins inconfessados dos países que financiam as várias facções
dos fundamentalistas islâmicos estrangeiras que invadiram a Síria e combatem ao
lado da coligação dos opositores de Bashar al Assad, o Exército Livre da Síria.
Sabe-se quem são esses países, mas não são expostos ao
desprezo de quem não abdica da tolerância e compreensão entre os povos. Sempre
as conveniências económicas, obviamente!...
Quanto à União Europeia, todos aqueles belos princípios
de imposição e defesa dos direitos humanos servirão apenas para os discursos
das grandes solenidades? Aguardemos. Não fazer nada, neste caso, é
inadmissível.
Oxalá que nasça um empenho político amplo e de grande
alcance que exclua intervenções armadas e dê aviamento a negociações, sérias e
persistentes, que abranjam todos os sujeitos em causa: as partes em conflito e
os respectivos apoiantes, como Rússia, China, Irão, Arábia Saudita, Qatar, etc.
Que se evite, acima de tudo, dar azo a uma explosão,
alargada e devastadora, naquela região do Médio Oriente que todos indicam como
uma intensa polvoreira.
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