O PIOR CRIME CONTRA A HUMANIDADE
NÃO O BANALIZEMOS
Quarta-feira passada, dia 4 de Setembro, o jornal
Público publicou um artigo da historiadora M. Fátima Bonifácio: “A insuportável arrogância da esquerda”.
Partindo do que a Historiadora considera uma “olímpica
indiferença ou um aberto desprezo” que as esquerdas manifestaram, aquando da morte
do economista António Borges (em contraste com a “comoção homérica” reservada a
Miguel Portas), Fátima Bonifácio não reconhece quaisquer especificidades na “esquerda”.
O seu artigo, onde desenvolve críticas acérrimas ao
comunismo, de caminho também condena socialistas e afins.
Muito estranho, quando afirma que “a esquerda socialista e não alinhada não renega as suas remotas
origens, como um filho não renega um pai alcoólico ou ladrão; e, mais decisivo,
partilha com os comunistas, embora mais discretamente, a aversão pela
Liberdade, tal como os Liberais a entendem, e abominam o regime capitalista em
que ela nasceu, germinou e se expandiu”.
Em que mundo vive Fátima Bonifácio ou para onde costuma
dirigir a sua atenção? Devota daquele neoliberalismo, hoje em voga, sem alma e
com o coração centrado, dir-se-ia exclusivamente, no capitalismo financeiro?
A que Liberdade - entendida pelos Liberais - se refere?
Quando penso nos socialistas, vejo, acima de tudo, a
social-democracia que reagiu contra os regimes colectivistas e de terror, qual
eram leninistas, estalinistas e quejandos, e pôs em movimento o que deve ser o
Estado social, dentro de uma economia de mercado. Pode negar esta realidade?
Pode também negar a defesa da verdadeira Liberdade em que sistematicamente se
empenharam?
No dia seguinte, sempre no Público, Francisco Assis, na
sua nota final, respondeu adequadamente às generalizações da ilustre Historiadora.
Mas o principal motivo por que escrevo sobre o artigo
de Fátima Bonifácio situa-se na banalização como associa os crimes do regime
soviético ao holocausto.
Aludiu aos múltiplos crimes cometidos na União
Soviética e demais países seguidores do chamado “socialismo real”, embuste ideológico
das ditaduras comunistas que, em nome da ideologia marxista – assim o faziam
crer – aplicaram os piores métodos na eliminação de pessoas e classes incómodas
ou de situações contrárias às imposições e conveniências dos déspotas que se
iam sucedendo.
Lendo com atenção o seu artigo, é inevitável a ligação
com as teses da extensa obra de vários autores, editada na década de 1990, mas
bastante controversa: “O Livro Negro do
Comunismo” – a edição que possuo, em versão italiana, é de 1998.
É uma análise profunda de toda a gama de atrocidades
comunistas, porém, chega-se à conclusão que se pretendeu diminuir o holocausto
em relação à profundidade dos crimes comunistas. Daí provieram as grandes
controvérsias que essa teoria provocou e com as quais concordo plenamente.
A essência dos crimes nazis assume um aspecto medonho e
incomparável: única, absolutamente única na forma e na aplicação.
Estes crimes foram projectados, estudados cientificamente
em nome de uma imaginária pureza da raça. Decretou-se, portanto, que certas
categorias de pessoas eram inaceitáveis, segundo os conceitos nazis, logo, não
tinham direito á existência e deveriam ser taxativamente eliminadas.
Falando com pessoas que se viram acossadas como animais
que devem ser abatidos, o que sempre me escandalizou ou me deixou desorientada
é que tudo isto aconteceu ante a indiferença daquela população de “raça
superior”, isto é, de outros seres humanos normais. Ou então de italianos
fascistas que sabiam o que os ocupantes nazis faziam e lhes davam toda a
colaboração.
Se Fátima Bonifácio quer escrever sobre os comunistas, crimes
por eles perpetrados e ignorados pelos vários militantes, não faça banais comparações
ou, pelo menos, evite pô-los no mesmo plano das infâmias do nazismo. O holocausto
é caso único na História. Como historiadora, deveria saber isso.
Ah! Entre a esquerda europeia, tão detestada pela
historiadora, não me parece que o PCP fuja da retórica que lhe é inerente. Todavia,
esta retórica é apresentada como arrogância pela autora do artigo em questão.
Além do respeito que merece qualquer ideologia dentro
de um regime democrático, acaso não lhe recorda “O Último dos Moicanos”?
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