A REVOLUÇÃO DE PAPA FRANCISCO
O título “Revolução
copernicana de Papa Francisco” imperou em muitos artigos dos mais diversos
autores.
Exagerado ou não, creio que não se afaste do que, efectivamente,
observamos dia após dia.
Constituiu facto inédito e de grande ressonância a
entrevista que Papa Francisco concedeu a padre António Spadaro, director da
revista dos jesuítas, “Civiltà Cattolica”,
no seu estúdio privado e no decurso de três períodos: em 19, 23 e 29 de
Agosto.
Foi publicada contemporaneamente em 16 revistas da
Companhia de Jesus, editadas no mesmo número de países.
Precedentemente, Papa Francisco já surpreendera com uma
carta aberta ao jornal La Repubblica – publicada em 11 de Setembro -
respondendo às perguntas sobre a fé e outros quesitos, formulados em dois
artigos de Eugénio Scalfari, fundador e editorialista do mesmo jornal.
“Prezadíssimo
Doutor Scalfari, é com viva cordialidade que, embora a traços largos, com esta
minha desejaria procurar responder à carta que, nas páginas de La Repubblica,
quis endereçar-me em 7 de Julho com uma série das suas pessoais reflexões e que
depois enriqueceu, nas páginas do mesmo quotidiano, em 7 de Agosto.
Antes de mais,
agradeço-lhe a atenção que dedicou à leitura da Encíclica Lumen Fidei (…)
(…) Portanto,
parece-me que seja sem dúvida positivo, não somente para nós singularmente, mas
também para a sociedade na qual vivemos, determo-nos a dialogar sobre uma
realidade assim tão importante como a fé, que se refere à predicação e à figura
de Jesus. Em particular, penso que haja duas circunstâncias que tornam hoje
este diálogo necessário e precioso. (…)
No que concerne a entrevista a “Civiltà Cattolica,
padre Spadaro descreve o ambiente, o modo simples e cordial como foi recebido,
o diálogo natural, espontâneo e profundo com o Papa.
“Falar com Papa
Francisco é, na realidade, uma espécie de fluxo vulcânico de ideias que se
entrelaçam umas com as outras. Mesmo tomar apontamentos dá-me a desagradável
impressão de interromper um diálogo fresco de nascente. É claro que Papa
Francisco está mais habituado à conversação que à lição.
Acerca da escolha dos seus aposentos, eis a
explicação do Papa:
“Uma coisa
verdadeiramente fundamental para mim é a comunidade. E compreende-se isso pelo
facto que estou aqui em Santa Marta. Quando fui eleito, habitava, por sorteio,
no quarto 207. Este onde nos encontramos agora era um quarto para os hóspedes.
Escolhi habitar
aqui, no quarto 201, porque quando tomei posse do apartamento pontifício,
dentro de mim ouvi distintamente um “não”.
O apartamento
pontifício no Palácio Apostólico não é luxuoso. É antigo, grande e feito com
bom gosto. Porém, é como um funil virado ao contrário. É grande e espaçoso, mas
o ingresso é verdadeiramente estreito. Entra-se com o conta-gotas, e eu não,
sem gente não posso viver. Tenho necessidade de viver a minha vida junto com os
outros”.
Chamou-me a atenção a insistência de Papa Francisco no
uso da palavra “discernimento”, ou melhor, no profundo significado que esta
exprime.
“O discernimento é uma das coisas em que
mais trabalhou interiormente Santo Inácio. Para ele é um instrumento de luta
para conhecer melhor Deus e segui-lo mais de perto.
Pode-se usar meios
débeis que resultam mais eficazes do que os fortes…
Este discernimento
requer tempo.
Muitos, por
exemplo, pensam que as mudanças e as reformas podem suceder em breve tempo. Eu
creio que haja sempre necessidade de tempo para colocar as bases de uma mudança
verdadeira, eficaz. E este é o tempo do discernimento. E por vezes, o
discernimento empurra para fazer imediatamente o que, de início, se pensa fazer
depois. Foi o que também me aconteceu nestes meses.
Muitos analistas acentuam que Papa Francisco se mantém vago
sobre os tais valores não negociáveis.
“Não podemos
insistir somente sobre questões ligadas ao aborto, matrimónio homossexual e uso
dos métodos contraceptivos. Isto não é possível. Não falei muito destas coisas,
e este facto foi-me censurado. Mas quando se fala, é necessário fazê-lo num
contexto. De resto, o parecer da Igreja é conhecido e eu sou filho da Igreja.
Todavia, não é preciso falar disso continuamente.”
“Vejo com clareza
que o que a Igreja tem mais necessidade hoje é a capacidade de curar as feridas
e de aquecer os corações dos fiéis, a vizinhança, a proximidade. Vejo a Igreja
como um hospital de campo depois de uma batalha. É inútil perguntar a um ferido
grave se tem colesterol e os açúcares altos. Deve-se curar as feridas. Depois,
poderemos falar de tudo o resto”
E fiquemo-nos por aqui nas transcrições das palavras de
Papa Francisco e no modo revolucionário como se apresenta e age como Sumo
Pontífice, dando avio ao que nos parece uma reforma do papado, logo, a uma
reforma da Igreja: “Uma Igreja que
recomeça, não do poder, mas do serviço; não da sobrecarga da Instituição, mas
da ligeireza da profecia” – Raniero La Valle
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