OS PREDADORES
Crise, a palavra dominante neste princípio de ano e fins de 2008. Sê-lo-á ainda por muito tempo: não sabemos se este tempo deve ser calculado em meses ou anos.
Existe uma grande crise económica e financeira, porque a avidez, o cinismo e falta de escrúpulos dos “predadores” da finança manifestaram-se em todo o seu grande esplendor.
Enriqueçamo-nos e deitemos às ortigas a ética, a decência, a contenção da ganância, a honestidade, as regras. Foi assim que se concretizou a interpretação do liberalismo, desalfandegado dos empecilhos de uma política responsável.
Milton Friedman e colegas da Escola de Chicago, embora prémios Nobel de Economia, demonstraram um irrealismo desconcertante. Poder-se-ia mesmo dizer que foram estupidamente ingénuos, quanto à sofreguidão humana em relação ao dinheiro ou aos ganhos fáceis.
O mercado livre jamais seria auto-regularizador. Tornar-se-ia numa selva de “predadores” vorazes; e foi o que aconteceu. Qualquer pessoa de bom senso o teria previsto. Aqueles génios não o previram.
Teixeira dos Santos, o nosso Ministro das Finanças, asseriu que se trata de uma “crise sem precedentes”.
Sem precedentes no que concerne a mundialização (globalização é vocábulo que começo a detestar); não, certamente, quanto a causas e efeitos. Neste aspecto, não se desvia muito da crise de 1929.
No número dos culpados, não podemos incluir somente os corsários da finança, mas também a Política. Esta ajoelhou aos pés da economia de mercado, abdicando da sua função de vigiar e regularizar.
Muitos políticos, agora, não se cansam de proclamar a sacralidade destas funções, destes princípios: mas não deveriam ter pensado antes? Por onde andava a grande política ou os grandes políticos?
A primeira já de há muito que brilha por demorada ausência; os segundos extinguiram-se. Aguardemos uma nova geração e contentemo-nos, por agora, com a mediocridade reinante.
****
“Palacetes prestigiosos amovidos de bancos e sociedades cotadas na Bolsa; operações com testas-de-ferro; mais-valias milionárias. (…) Um vorticoso rodopio de negócios com desenvoltos conflitos de interesses.
(…) Como protagonistas, temos: managers, banqueiros, grandes empresários, políticos, homens das instituições. Todos empenhados a trocar edifícios, palacetes - aos melhores preços, obviamente - subtraídos do património de sociedades cotadas na Bolsa com milhares de pequenos accionistas ou da carteira de fundos imobiliários.
Fácil quando se joga em casa. Fácil quando o especulador de turno se encontra na encruzilhada de grandes negócios e não resiste à tentação de aproveitar qualquer coisa em proveito próprio.
Quanto ao dinheiro? Nenhum problema: há sempre alguém pronto a conceder crédito aos espertalhões de Itália. Para eles, os bancos estão sempre abertos.
(…) Imóveis que saltam de um proprietário a outro com valores sempre crescentes. Em cada passagem, o vendedor mete ao bolso uma aliciante mais-valia”.
Crise, a palavra dominante neste princípio de ano e fins de 2008. Sê-lo-á ainda por muito tempo: não sabemos se este tempo deve ser calculado em meses ou anos.
Existe uma grande crise económica e financeira, porque a avidez, o cinismo e falta de escrúpulos dos “predadores” da finança manifestaram-se em todo o seu grande esplendor.
Enriqueçamo-nos e deitemos às ortigas a ética, a decência, a contenção da ganância, a honestidade, as regras. Foi assim que se concretizou a interpretação do liberalismo, desalfandegado dos empecilhos de uma política responsável.
Milton Friedman e colegas da Escola de Chicago, embora prémios Nobel de Economia, demonstraram um irrealismo desconcertante. Poder-se-ia mesmo dizer que foram estupidamente ingénuos, quanto à sofreguidão humana em relação ao dinheiro ou aos ganhos fáceis.
O mercado livre jamais seria auto-regularizador. Tornar-se-ia numa selva de “predadores” vorazes; e foi o que aconteceu. Qualquer pessoa de bom senso o teria previsto. Aqueles génios não o previram.
Teixeira dos Santos, o nosso Ministro das Finanças, asseriu que se trata de uma “crise sem precedentes”.
Sem precedentes no que concerne a mundialização (globalização é vocábulo que começo a detestar); não, certamente, quanto a causas e efeitos. Neste aspecto, não se desvia muito da crise de 1929.
No número dos culpados, não podemos incluir somente os corsários da finança, mas também a Política. Esta ajoelhou aos pés da economia de mercado, abdicando da sua função de vigiar e regularizar.
Muitos políticos, agora, não se cansam de proclamar a sacralidade destas funções, destes princípios: mas não deveriam ter pensado antes? Por onde andava a grande política ou os grandes políticos?
A primeira já de há muito que brilha por demorada ausência; os segundos extinguiram-se. Aguardemos uma nova geração e contentemo-nos, por agora, com a mediocridade reinante.
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“Palacetes prestigiosos amovidos de bancos e sociedades cotadas na Bolsa; operações com testas-de-ferro; mais-valias milionárias. (…) Um vorticoso rodopio de negócios com desenvoltos conflitos de interesses.
(…) Como protagonistas, temos: managers, banqueiros, grandes empresários, políticos, homens das instituições. Todos empenhados a trocar edifícios, palacetes - aos melhores preços, obviamente - subtraídos do património de sociedades cotadas na Bolsa com milhares de pequenos accionistas ou da carteira de fundos imobiliários.
Fácil quando se joga em casa. Fácil quando o especulador de turno se encontra na encruzilhada de grandes negócios e não resiste à tentação de aproveitar qualquer coisa em proveito próprio.
Quanto ao dinheiro? Nenhum problema: há sempre alguém pronto a conceder crédito aos espertalhões de Itália. Para eles, os bancos estão sempre abertos.
(…) Imóveis que saltam de um proprietário a outro com valores sempre crescentes. Em cada passagem, o vendedor mete ao bolso uma aliciante mais-valia”.
"Exemplo da sarabanda de compra e venda do mesmo edifício, em Roma, Via del Corso, n.º 287: em Setembro 2005, Gilberto Benetton compra-o por 42,4 milhões €; Em Fevereiro 2007, revende-o por 57,2 milhões.
Noutros exemplos apresentados, houve um ganho de 5 milhões, no espaço de um ano!"
Estes são extractos de um serviço investigativo jornalístico da revista italiana L’Espresso, descrevendo realidades “predatórias” da finança italiana.
Lendo-o com atenção, é impossível não inferir que os casos pormenorizadamente descritos não são um exclusivo italiano.
Não tenho dificuldade em acreditar que factos idênticos se verificaram no nosso País, assim como em qualquer outro, onde as correrias da finança, sem brida nem regras, produziram o actual desastre que a todos angustia.
Quero respigar um episódio, bem iluminante, do que é a especulação selvagem.
(…) Feitas as contas, Stefanel (empresário) comprou o património do banco de que era sócio - Banco Antonveneta, controlado por um grupo de empresários - com uma dívida: 96 milhões emprestados, em grande parte, por Areal Bank; 16 milhões do seu bolso. Deu como garantia os imóveis e rendas pagas pelo banco, do qual era sócio, que mantinha naqueles edifícios as próprias sedes.
Giuseppe Stefanel representa muitos papéis na comédia.
Em 27 de Julho 2005, entra no Conselho de Administração do banco Antonveneta. Quando em 12 de Agosto compra à General Electric um edifício, em Génova, por 9,1 milhões (vendeu-o em Março 2008 por 14!) pagou-o com um empréstimo garantido pelas rendas do banco do qual era sócio, senhorio e grande devedor. Um tripúdio de conflito de interesses!”.
Procurei traduzir o mais claramente possível, a fim de que os não iniciados nestas matérias, como eu, pudessem compreender e apreender o quão nauseabundas são estas traficâncias.
Os dirigentes bancários e afins prestaram-se a esta orgia de lucros que eu, pobre ignorante, classifico absurdos, incríveis e, hoje, prejudiciais para o financiamento de empresas necessitadas de crédito.
Esperar-se-ia que os obrigassem a prestar contas e os submetessem a consequências óbvias: prisão ou indemnização dos danos que provocaram.
Mas dadas as conivências, não passa de utopia.
Sobreveio a derrocada, e continuará. Só me entristece que a sofrer as consequências, e apenas estes, serão os milhares (se não milhões) de pessoas que perdem e perderão o emprego.
Alda M. Maia
Noutros exemplos apresentados, houve um ganho de 5 milhões, no espaço de um ano!"
Estes são extractos de um serviço investigativo jornalístico da revista italiana L’Espresso, descrevendo realidades “predatórias” da finança italiana.
Lendo-o com atenção, é impossível não inferir que os casos pormenorizadamente descritos não são um exclusivo italiano.
Não tenho dificuldade em acreditar que factos idênticos se verificaram no nosso País, assim como em qualquer outro, onde as correrias da finança, sem brida nem regras, produziram o actual desastre que a todos angustia.
Quero respigar um episódio, bem iluminante, do que é a especulação selvagem.
(…) Feitas as contas, Stefanel (empresário) comprou o património do banco de que era sócio - Banco Antonveneta, controlado por um grupo de empresários - com uma dívida: 96 milhões emprestados, em grande parte, por Areal Bank; 16 milhões do seu bolso. Deu como garantia os imóveis e rendas pagas pelo banco, do qual era sócio, que mantinha naqueles edifícios as próprias sedes.
Giuseppe Stefanel representa muitos papéis na comédia.
Em 27 de Julho 2005, entra no Conselho de Administração do banco Antonveneta. Quando em 12 de Agosto compra à General Electric um edifício, em Génova, por 9,1 milhões (vendeu-o em Março 2008 por 14!) pagou-o com um empréstimo garantido pelas rendas do banco do qual era sócio, senhorio e grande devedor. Um tripúdio de conflito de interesses!”.
Procurei traduzir o mais claramente possível, a fim de que os não iniciados nestas matérias, como eu, pudessem compreender e apreender o quão nauseabundas são estas traficâncias.
Os dirigentes bancários e afins prestaram-se a esta orgia de lucros que eu, pobre ignorante, classifico absurdos, incríveis e, hoje, prejudiciais para o financiamento de empresas necessitadas de crédito.
Esperar-se-ia que os obrigassem a prestar contas e os submetessem a consequências óbvias: prisão ou indemnização dos danos que provocaram.
Mas dadas as conivências, não passa de utopia.
Sobreveio a derrocada, e continuará. Só me entristece que a sofrer as consequências, e apenas estes, serão os milhares (se não milhões) de pessoas que perdem e perderão o emprego.
Alda M. Maia
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