domingo, março 02, 2008

ORDEM DOS ADVOGADOS
CONSELHO DE DEONTOLOGIA

A Ordem dos Advogados, sobretudo no que concerne o Conselho de Deontologia, existe como entidade que deveria ter uma função “super partes” ou, pelo contrário, é uma corporação, como tantas outras, que existe para curar, exclusivamente, os interesses dos seus filiados?
Esta perplexidade é estribada num caso muito concreto.

Num condomínio – espaço por excelência para atritos “civilizacionais”! – um proprietário decide construir um terraço, numa parte comum, sem o mínimo respeito pela privacidade do condómino que vive ao lado e sem a permissão exigida para a realização de tais obras.
Com igual arrogância, colocou uma câmara de vídeo no patamar, também comum, violando, novamente, a privacidade do mesmo condómino.
Para evitar conflitos, o vizinho prejudicado, em vez de embargar as obras, limitou-se a solicitar um painel divisório, de vidro fosco.
Solicitou uma, duas, várias vezes, mas sem obter qualquer resultado. Passado largo tempo, perdeu a paciência e pôs-lhe uma acção no tribunal, exigindo a demolição do terraço, assim como a eliminação da câmara de vídeo.

Quando o prevaricador viu os casos mal parados, pediu um acordo. Aceitou-se o acordo, mas com algumas condições.
Quando o acordo judicial transitou em julgado, o advogado do indivíduo deu o dito por não dito e, teatralmente, renegou o acordo.

Partiu uma denúncia para o Conselho de Deontologia da zona mais próxima.
Depois de vários meses, chegou o acórdão: “o comportamento do participado não violou qualquer norma de carácter deontológico”
O que fez foi para proteger os interesses do seu cliente!...

O Relator não somente decidiu o arquivamento, como se permitiu exprimir conceitos e apreciações não muito dignas de um documento deste género.
Lendo com atenção o texto do Sr. Advogado relator, a impressão que se obtém sintetiza-se facilmente: como te atreves, tu, simples cidadão, a incomodar a Ordem, denunciando um colega!?

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Nos processos do Conselho Deontológico dos Advogados, não deve existir contraditório?

Há uma circunstância muito estranha, e que me parece anómala, em toda esta história: ao requerente, como seria de esperar, não foi dado conhecer a argumentação do participado.
“Foi notificado o participado para, querendo, se defender, o que fez”.
Assim, o participado apresentou as suas razões (que o Advogado relator resumiu em poucas linhas) e, pelos vistos, acrescentando factos novos que deviam ser conhecidos e contestados pelo requerente.
Assim não sucedeu. O Conselho Deontológico, acto contínuo, emitiu o acórdão. Logo, as razões ou argumentação do participado sobrepõem-se às do requerente e, consequentemente, são as únicas que merecem credibilidade, dispensando um qualquer contraditório.

É isto lícito ou, pelo menos, correcto? É decente?
Muito estranho um tal comportamento, precisamente no santuário onde se deveria estar sempre atento a todas, sublinho todas, as formalidades de um processo límpido! Não é essa a regra máxima observada por um advogado?

Passemos adiante.
Transcrevo o recurso enviado para o Conselho Superior da Ordem dos Advogados, cuja cópia tenho em meu poder, e que foi motivado, exclusivamente, pela indignação causada pela forma, verdadeiramente singular, como o Sr. Advogado relator apresentou as suas deduções. Prefiro não classificá-las.

As frases que estão sublinhadas no original são transcritas em cor diferente.

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CONSELHO SUPERIOR
ORDEM DOS ADVOGADOS
LISBOA

Dado que me é concedido recorrer, devo precisar quanto segue:

1 - A DECISÃO proferida não me convence nem a julgo apropriada.

2 - REITERO que apenas aceitei um acordo judicial, ao qual ficou ligado um outro acordo extrajudicial – acordo este violado pelo advogado (…) - porque confiei plenamente, repito: confiei plenamente nos advogados mandatários.

ESCLAREÇO, e repare-se bem nesta circunstância, que a violação do acordo extrajudicial processou-se em data posterior à data de trânsito em julgado do acordo judicial; precisamente, quando o cliente do Advogado (…) já estava ao resguardo de consequências judiciais!

Data de trânsito em julgado do acordo Judicial: Julho 2005
Data da violação do acordo extrajudicial: Janeiro 2006

Observo que o Adv. (…), acompanhado pelo seu cliente, em Janeiro 2006, foi o primeiro a intervir na Assembleia, e, sem mais, violou de imediato o acordo.

MAIS ESCLAREÇO que nenhuns factos novos sobrevieram, contrariamente ao que alega o Adv. (…): os factos continuam exactamente iguais aos que documentei. Ademais, urge acrescentar que o acordo violado não lesava os interesses do seu cliente: pelo contrário, só o beneficiava. A atitude do Adv. (…), portanto, não frui de qualquer justificação que possa classificar-se correcta, compreensível ou legítima: outras justificações estão fora, completamente, de tais parâmetros.

3 – SENDO ASSIM, entendo, como cidadão, que um advogado, nestas condições e respeitador de todas e quaisquer regras de deontologia, teria renunciado ao mandato do seu cliente, se este mandato violasse qualquer um dos acordos:
a - por respeito à palavra dada;
b - por respeito à própria dignidade de advogado;
cporque qualquer escamoteação que se intentasse usar e apresentar como legítima e justificativa da violação de um acordo, a dignidade profissional de um advogado ficaria irremediavelmente ultrajada.

4 – VERIFICA-SE que a OA - Conselho Deontológico do (…) – interpretou o caso de maneira diversa, o que sinceramente lamento.

5 – É ESTE o meu modo de entender e que levo ao conhecimento do mais alto nível da Ordem dos Advogados.

POR ÚLTIMO, penso ter o direito de chamar a atenção para o modo atípico de escrever um parecer técnico, qual foi o do Advogado relator, Dr. (…)
NÃO ACEITO,
porque profundamente lesivos da minha dignidade, os comentários: superficiais, desviantes e muito infelizes, expressos pelo Sr. Advogado relator.
É também por esta mesma dignidade ofendida que envio recurso contra o acórdão.

CONCLUSÕES

1 – O Advogado (…) violou um acordo extrajudicial, ligado a um acordo judicial, quando este passara já em julgado.

2 – Com o seu comportamento, violou as normas mais elementares de deontologia profissional, traindo toda a confiança de um comum cidadão que crê na dignidade profissional de um advogado e, na qual, deposita inteira confiança.
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O requerente
(…)

****

Após alguns meses, a Ordem dos Advogados enviou uma carta registada. É presumível que tivessem emitido o relativo acórdão. Essa carta não foi retirada.
Já não interessavam acórdãos, visto que a confiança na Ordem dos Advogadas, Conselho Deontológico, esvaíra-se totalmente.
Alda M. Maia

2 Comments:

At 3:21 da tarde, Blogger a d´almeida nunes said...

Só para deixar aqui uma reflexão.
Este seu blogue, Alda, merecia uma maior divulgação e comentários adequados aos temas e à forma como os apresenta.
Mas das duas uma. Ou o seu "marketing" não tem como objectivo essa divulgação (como julgo ser o caso) ou então e também os potenciais comentadores com capacidade para tal não estão interessados em se mostrar por estes lados.
É que a Alda toca em cada assunto!
Louvo-a pela sua frontalidade e disponibilidade para escrever estes textos com tanto empenho e capacidade de serviço público.
Um abraço
António

 
At 10:40 da tarde, Blogger Alda M. Maia said...

Boa noite, António
Mas que belo comentário! Olhe que eu sou capaz de o tomar a sério, encher-me de vaidade e tornar-me insuportável!
Muito grata pela sua gentileza.

Sabe, pela primeira vez lamento não ver aqui muitos, mas muitos comentários: o que escrevi foi mais um acto de denúncia que uma habitual conversa com o meu computador.

Quanto ao resto – o marketing, como lhe chama – corresponde exactamente à sua primeira hipótese. E está bem assim.
Um abraço e um beijinho à Zaida.
Alda

 

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