IMPOSSÍVEL SOFRER DE TÉDIO NA ITÁLIA
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É impossível sofrer de tédio, sobretudo quando acompanhamos as peripécias da política italiana.
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O Senhor Ministro da Justiça, Clemente Mastella, líder de um minúsculo partido, juntamente com a mulher e outros membros desse partido-família, foram incriminados – a esposa em prisão domiciliária – por concussão, ou melhor, alegre desenvoltura na atribuição de cargos, nos serviços locais de saúde, a parentes, amigos e correligionários.
Devo dizer que as acusações não parecem muito consistentes. Mas se irrelevantes penalmente, politica e eticamente são execráveis.
O Onorevole Mastella sempre se distinguiu pela exuberância das suas exteriorizações verbais. Sabendo que os três votos de que dispunha no Senado eram importantes para a segurança do governo, não perdia ocasião de, praticamente, fazer chantagem com ameaças de demissão ou de não votar leis que lhe não agradavam.
Ora, desta vez, não pôde prolongar a comédia: o caso era grave e teve mesmo de se demitir.
Dada a personagem, essa saída do executivo, feita no Parlamento, revestiu-se de grande teatralidade. Atacou a Magistratura, nomeadamente aqueles magistrados que incriminam “uma pessoa honesta e séria. A Magistratura, na sua grande maioria, é correcta e competente; refiro-me àqueles magistrados que fazem um uso inaceitável da justiça”.
Conceito já muito conhecido, entre os políticos com problemas de justiça! Berlusconi era mais drástico: “Só exerce a profissão de juiz quem tem uma tara”.
Demitiu-se então o Sr. Ministro da Justiça, mas assegurou o seu apoio externo ao Governo.
Repentinamente, o volte-face! Dá o dito por não dito, retira o apoio e pretende eleições. Apresentou este anúncio solene numa conferência de imprensa e, mais tarde, num programa televisivo.
Que grande homem de Estado!!
A crise de governo foi inevitável.
O Primeiro-Ministro entendeu, e muitíssimo bem, que seria o parlamento a decretar o fim do seu Governo. Apresentou uma moção de confiança nas duas câmaras, bem sabendo que, no Senado, não teria os votos necessários.
Efectivamente, cinco ou seis “amigos-inimigos”, Mastella incluído, traíram-no. O Governo demitiu-se.
Vem agora o grande final!
O espectáculo (não inédito) que os senhores senadores ofereceram ao público foi digno de um genuíno ambiente das piores tabernas. E quanto a cenas ordinárias, nada falhou no repertório típico de quem não tem vergonha nem respeito pelo lugar que ocupa.
E é aquela gentinha que decide os destinos de um país!... Arrepiante!
Um dos três senadores de Mastella, Nuccio Cusumano, decidiu desobedecer ao partido e, na declaração de voto, anunciou um sim.
Como um touro enfurecido, um colega de partido, Tommaso Barbato, atira-se ao desobediente com inesperada violência e uma apreciável dose de insultos, sem esquecer um gesto significativo: “cornuto, frocio (invertido) pezzo di merda, traditore”, lançando uma valente cuspidela à cara do infeliz senador que, isoladamente, quis dar o voto ao governo que até então defendia.
A dar mão forte ao agressor - talvez por atavismo - com mais insultos e gritaria, fizeram-se notar elementos do ex-partido fascista, Aliança Nacional, interessadíssimos que o governo caísse. Aliás, toda a oposição, como é óbvio.
O pobre homem não resistiu a tantas emoções e ofensas: desmaiou e foi parar à enfermaria.
Moral da história, acabou o governo de centro-esquerda que votei e que esperei durasse uma inteira legislatura. Mas dada a coligação de partidos que o formavam, a heterogeneidade desses nove partidos e quase sempre em conflito uns com os outros, é de aplaudir a tenacidade e paciência de Romano Prodi, durante todos estes meses.
Muitas vezes pensei que, no lugar dele, já de há muito teria abandonado o cargo.
Alda M. Maia
O Senhor Ministro da Justiça, Clemente Mastella, líder de um minúsculo partido, juntamente com a mulher e outros membros desse partido-família, foram incriminados – a esposa em prisão domiciliária – por concussão, ou melhor, alegre desenvoltura na atribuição de cargos, nos serviços locais de saúde, a parentes, amigos e correligionários.
Devo dizer que as acusações não parecem muito consistentes. Mas se irrelevantes penalmente, politica e eticamente são execráveis.
O Onorevole Mastella sempre se distinguiu pela exuberância das suas exteriorizações verbais. Sabendo que os três votos de que dispunha no Senado eram importantes para a segurança do governo, não perdia ocasião de, praticamente, fazer chantagem com ameaças de demissão ou de não votar leis que lhe não agradavam.
Ora, desta vez, não pôde prolongar a comédia: o caso era grave e teve mesmo de se demitir.
Dada a personagem, essa saída do executivo, feita no Parlamento, revestiu-se de grande teatralidade. Atacou a Magistratura, nomeadamente aqueles magistrados que incriminam “uma pessoa honesta e séria. A Magistratura, na sua grande maioria, é correcta e competente; refiro-me àqueles magistrados que fazem um uso inaceitável da justiça”.
Conceito já muito conhecido, entre os políticos com problemas de justiça! Berlusconi era mais drástico: “Só exerce a profissão de juiz quem tem uma tara”.
Demitiu-se então o Sr. Ministro da Justiça, mas assegurou o seu apoio externo ao Governo.
Repentinamente, o volte-face! Dá o dito por não dito, retira o apoio e pretende eleições. Apresentou este anúncio solene numa conferência de imprensa e, mais tarde, num programa televisivo.
Que grande homem de Estado!!
A crise de governo foi inevitável.
O Primeiro-Ministro entendeu, e muitíssimo bem, que seria o parlamento a decretar o fim do seu Governo. Apresentou uma moção de confiança nas duas câmaras, bem sabendo que, no Senado, não teria os votos necessários.
Efectivamente, cinco ou seis “amigos-inimigos”, Mastella incluído, traíram-no. O Governo demitiu-se.
Vem agora o grande final!
O espectáculo (não inédito) que os senhores senadores ofereceram ao público foi digno de um genuíno ambiente das piores tabernas. E quanto a cenas ordinárias, nada falhou no repertório típico de quem não tem vergonha nem respeito pelo lugar que ocupa.
E é aquela gentinha que decide os destinos de um país!... Arrepiante!
Um dos três senadores de Mastella, Nuccio Cusumano, decidiu desobedecer ao partido e, na declaração de voto, anunciou um sim.
Como um touro enfurecido, um colega de partido, Tommaso Barbato, atira-se ao desobediente com inesperada violência e uma apreciável dose de insultos, sem esquecer um gesto significativo: “cornuto, frocio (invertido) pezzo di merda, traditore”, lançando uma valente cuspidela à cara do infeliz senador que, isoladamente, quis dar o voto ao governo que até então defendia.
A dar mão forte ao agressor - talvez por atavismo - com mais insultos e gritaria, fizeram-se notar elementos do ex-partido fascista, Aliança Nacional, interessadíssimos que o governo caísse. Aliás, toda a oposição, como é óbvio.
O pobre homem não resistiu a tantas emoções e ofensas: desmaiou e foi parar à enfermaria.
Moral da história, acabou o governo de centro-esquerda que votei e que esperei durasse uma inteira legislatura. Mas dada a coligação de partidos que o formavam, a heterogeneidade desses nove partidos e quase sempre em conflito uns com os outros, é de aplaudir a tenacidade e paciência de Romano Prodi, durante todos estes meses.
Muitas vezes pensei que, no lugar dele, já de há muito teria abandonado o cargo.
Alda M. Maia
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