UMBERTO ECO, O ASSOMBROSO INTELECTUAL
Morreu às 23,30 do
passado dia 19 deste mês de Fevereiro. A notícia ecoou por todo o mundo, tão
elevada é a sua fama de académico de intensa cultura – poder-se-á dizer que é uma
cultura sem limites.
Os títulos dos
jornais italianos demonstravam o afecto e admiração por este “filósofo, pai da
Semiótica, escritor, docente universitário, articulista feliz, especialista em
livros antigos, crítico literário”.
Paralelamente, não
omitem de sublinhar a sua bondade de carácter.
“Gentil, generoso,
afável. Eco recusou a cátedra que a América lhe oferecia, brincando: «Não posso
viver num país onde não se fuma nem se bebe um café» - “Adeus a Umberto Eco,
com ele a cultura tornou-se Best-seller” - Gianni Riotta; jornal La Stampa.
Sempre segui com
interesse e grande simpatia as suas entrevistas ou participações televisivas. O
que facilmente se notava eram atitudes e comportamentos simples. Jamais adoptava
tons de arrogância ou do intelectual pomposo de vastos saberes. Pelo contrário,
esses vastos saberes impeliam-no para a simplicidade e uma espontaneidade que
se aliava à naturalidade da sua ironia e bom humor.
O semanário
L’Espresso intitulou a notícia da sua morte: “Caro Umberto, deixaste-nos órfãos”. Efectivamente!
De há
vários anos, Umberto Eco exprimia as suas opiniões neste semanário, na célebre
rubrica “Bustina di Minerva”.
O nosso crítico
literário, António Guerreiro, traduziu Bustina di Minerva em (“A coruja de Minerva", como sabemos, é a ave
da filosofia, aquela que Hegel dizia que só levantava voo ao crepúsculo).
Alguns anos atrás,
falei desta célebre coluna do Espresso, “Bustina di Minerva”, escrevendo sobre a explicação que
Umberto Eco dera sobre a escolha deste título. Repito-a: “O título da rubrica
deriva do nome da carteirinha (bustina) de fósforos, Minerva,
que traz sempre no bolso para acender o cachimbo. Quando lhe surgem ideias para
os seus artigos, anota-as no que tem à mão: normalmente, a carteira de fósforos
Minerva. Daqui nasceu “A Bustina di Minerva”.
É possível que
Umberto Eco tivesse aludido à ave da filosofia, porém, quando se decidia a
escrever, não levantava voo ao crepúsculo: confessou que escrevia nos fins-de-semana.
Os livros, a leitura,
o amor pela leitura, a defesa dos livros em papel, enfim, a atmosfera que
circunda publicações literárias ou menos literárias, pode dizer-se que foram uma
das grandes paixões de Umberto Eco.
Mais uma razão por
que cultivo um grande interesse e simpatia por este assombroso intelectual.
Possuo seis ou sete
obras deste escritor. Sempre me despertaram grande curiosidade as suas frases
célebres. E são tantas! Transcrevo algumas, precisamente sobre livros:
O
bem de um livro
está em ser lido.
Uma
biblioteca não se
limita a recolher os teus livros; lê-os também por tua conta.
A
biblioteca é o
testemunho da verdade e do erro
Um
livro bem escolhido
salva-te de qualquer coisa, até de ti mesmo.
Quando
escreves um livro,
não tens o controlo sobre o que os outros compreenderão.
Pode-se
ser culto, quer tendo
lido 10 livros, quer 10 vezes o mesmo livro. Deveriam preocupar-se aqueles que
de livros nunca leram nenhum.
Quem
não lê aos 70 anos
terá vivido uma só vida. Quem lê terá vivido 5.000 anos: existia quando Caim
matou Abel, quando Renzo casou com Lúcia, quando Leopardi admirava o infinito. Porque
a leitura é uma imortalidade para trás.
Termino com um conselho de Umberto Eco, fora do tema livros:
"Deixa falar o teu coração, interroga as caras, não escutar as línguas..."
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