SÉCULO XXI: BASTOU UMA DÉCADA
PARA O RETROCESSO AO SÉC. XIX
No dia três de Maio, no jornal italiano
Corriere Della Sera – jornal mais na área do conservadorismo que esquerdista - líamos
o seguinte:
“Os
10 homens mais ricos de Itália dispõem de um capital cerca de 75 mil milhões de
euros, igual ao conjunto de quase 500 mil famílias operárias. Releva-o uma
análise do CENSIS (instituto italiano de investigação socioeconómica).
Pouco
menos de 2 mil italianos riquíssimos, membros do clube mundial dos ultra-ricos,
dispõem de um património global superior a 169 mil milhões de euros (sem contar
o valor dos bens imóveis).
As
distâncias na riqueza cresceram no tempo e hoje, em plena crise, o património
de um dirigente é igual a 5,6 vezes o de um operário – três vezes mais do que
há vinte anos… -
seguem-se as diferenças de várias
categorias em relação a um operário
No jornal La Repubblica, sempre no mesmo
dias e sobre o mesmo assunto, mas citando a OCDE:
O 1%
dos italianos encaixa quase 10% dos rendimentos totais.
Aumenta
a concentração da riqueza: segundo a OCDE, nos últimos trinta anos, quem
encaixa os cheques mais pesados conseguiu interceptar uma fatia
desproporcionada de incremento dos salários. Nos Estados Unidos regista-se a concentração
maior. (…)
Nos
últimos trinta anos os rendimentos concentraram-se cada vez mais nas mãos de
poucos.
Esta análise do CENSIS e o relatório da
OCDE já não constituem novidade para ninguém. Os mais diversos comentadores e
analistas, idóneos e menos idóneos, não se têm cansado de apontar o desnível
que se instalou entre os rendimentos das elites dirigentes e o resto da
sociedade.
O que mais enoja em tudo isto é a
desfaçatez como justificam os altíssimos salários de um qualquer top manager.
Poder-se-á perguntar: porque possuem maior
nível académico? Não faltam pessoas inteligentes que atingem normalmente esse
nível e que, portanto, estariam aptos para desenvolver eficientemente a mesma
actividade.
Porque são tecnicamente mais capazes? Não
consta que devam ser génios reconhecidos os dirigentes de bancos, grandes
empresas, multinacionais e quejandos. São seres normais com capacidades
apreciáveis (quando as possuem!), mas não avis
rara.
Após a Segunda Guerra Mundial construiu-se
uma sociedade mais justa e um grande progresso económico, mas durou poucas
décadas.
E durou poucas décadas, porque piorou a
qualidade da política; logo, piorou tudo. Se reflectirmos sobre a perduração da
crise, sobretudo na Europa, e sobre as numerosas análises que nos informam, é
inevitável chegarmos a essa conclusão. Tudo parte da política, esta “arte
ou ciência” de organizar a administração jurídica, social e económica da coisa
pública: precisamente, com arte e ciência.
Ora, nesta crise, onde podemos encontrar a
arte, ciência, engenho e coragem na política que nos governa, quer europeia,
quer nacional? Certamente que, para isso, deveria haver grandes e respeitáveis políticos,
mas onde estão? É um deserto!
A política reduziu-se a joguinhos de poder
e de blandícias para os potenciais eleitores; não sobra lugar para decisões
sérias e corajosas.
Consequentemente, eis por que não foi capaz
de prever e avaliar certos aspectos negativos da globalização.
Não foi capaz de regulamentar o nascimento
de um capitalismo sem alma.
Não foi capaz, e permanece nessa incapacidade (ou
táctica de conivências), de impor regras à voracidade do capitalismo
financeiro.
Não foi capaz de criar leis que
estabelecessem uma menor desigualdade de rendimentos, não omitindo a justeza do
mérito, obviamente.
Finalmente, não é capaz de se regenerar e
de saber reconstruir o sistema de partidos que apodreceu e se tornou intolerável.
Transfigurou-se em ninhos de oportunistas, carreiristas, facções em vez de
homogeneidade ideológica, incompetência, agentes encapotados dos poderes
fortes. As consequências estão à vista.
O profundo sentido de democracia caiu em
sonolência; esperemos que não se transforme em coma. Esperemos também que não
surja uma Europa de totalitarismos camuflados. Parece-me que o vocábulo
democracia começa a ser o passe introdutor de ideias e procedimentos que nada
tem que ver com o seu valor intrínseco e real.
Os denunciadores do crescimento de populismos
perigosos para a democracia não inventam nem exageram. Estes populismos são
reais e confesso que me assustam. Como exemplo adequado, vejo o “Movimento 5
Estrelas” de Beppe Grillo. Nota-se neste indivíduo tiques acentuadamente fascistas
– e sem banalização da palavra - que não prenunciam o que quer que seja de
construtivo.
Dado o alto seguimento dos que o vêem como
castigador dos execrados partidos, estes seguidores em boa-fé não se apercebem
que dão aval a uma pura e simples propaganda demolidora; nada mais.
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