INQUIETAÇÕES OU INGERÊNCIAS?
Nesta última semana, afora a decisão sobre a primeira fase da futura união bancária europeia, o tema que mais espaço mereceu nos meios de informação – e não somente italianos – foi o apoio incondicionado de toda a Europa a Mário Monti e o convite explícito a que se candidate a primeiro-ministro nas próximas eleições italianas. O “Partido Popular Europeu”, pública e oficialmente, consagrou-o líder político dos moderados e não poupou exortações nesse sentido; obviamente, com o agrado e beneplácito da Sra. Merkel.
Não esqueçamos que PPE é o partido da maioria da actual classe dirigente dos Estados-membros.
Compreendo a inquietação sobre a última investida de Berlusconi e o temor que, novamente, consiga obter votos que provoquem instabilidade na política italiana e, por consequência, na UE.
Compreendo, mas não me agrada a insistência nesta quase imposição de um candidato pré-estabelecido à frente de um próximo governo. Isto é uma clara ingerência nas eleições italianas, embora subjacente ao reconhecimento indiscutível da idoneidade e seriedade de Mário Monti.
Compreendo, mas tudo me parece uma grande falta de elegância no respeito que se deve à dignidade e soberania de todos e de qualquer país.
Penso que a Itália ainda é capaz de efectuar eleições decentes e com pessoas decentes.
Nunca vi a Europa, todavia, muito incomodada durante o reinado histriónico e demagógico do palhaço Berlusconi. Presentemente, para que lado olham as instituições europeias, quando ignoram o regime declaradamente fascista que impera na Hungria?
Mas analistas competentes, com quem não é difícil estar de acordo, já bem salientaram que a Europa apenas vibra com as questões económicas e financeiras; tudo o mais são bagatelas.
Em Roma, movimentos cívicos moderados, embora em coalizão com partidos do centro e talvez com trânsfugas do partido de Berlusconi, deram avio à preparação da “lista Monti”, esperando que este dê o seu aval.
Sinceramente, espero que Monti se mantenha fora de todas estas iniciativas e não se misture com grupos de qualquer tendência política. A Itália necessita desta figura honesta, prestigiada internacionalmente e, internamente, respeitada por todos os partidos e pessoas sérias.
O mandato do Presidente da República caducará em Maio próximo. É neste cargo que eu espero ver eleito Mário Monti, pois será um digníssimo sucessor de Giorgio Napolitano.
Mas não é somente esta razão que me faz ver com desagrado Mário Monti a bater-se para ser eleito primeiro-ministro. Sempre o vi super partes; continue nesse papel.
O “Povo da Liberdade” (PDL), partido berlusconiano, anda à deriva e o que se observa é uma espécie de debandada à procura do que mais convém. Os ratos tentam abandonar o navio. Alguns elementos deste “povo” já se preparam a entrar na tal “lista Monti”.
Sempre aceitei que, dentro do PDL, militem pessoas de bem e respeitáveis. No entanto, o que sempre me perguntava e nunca me cansarei de o manifestar, era a razão por que estas figuras políticas continuavam dentro do um partido onde as favoritas de Berlusconi eram elevadas a cargos políticos e onde prosperavam personalidades moralmente muito, mas muito discutíveis.
Pior ainda, todavia, no Parlamento nunca hesitaram em votar compactamente as tais leis ad personam, leis arquitectadas com a única finalidade de libertar Berlusconi de prestar contas à Justiça nos vários processos em que se via envolvido; libertá-lo ou subtraí-lo, sobretudo mercê de uma dessas leis que diminuía os prazos de prescrição: os seus advogados, entretanto, encarregar-se-iam dos entraves legais necessários até que chegasse a hora da prescrição libertadora.
Sensibilidades que se embotaram, perante a arremetida de tantas anomalias num Estado de direito?
Para finalizar, quero transcrever o que Bruno Tinti, magistrado e escritor, num artigo de 14/12/2012, escreveu sobre Berlusconi: “é um delinquente, pois foi prescrito sete vezes (culpado, mas prescrição do crime)”.
Acrescento a recente condenação a 4 anos de prisão, em primeira instância, por fraude fiscal… e o que adiante se verá. Há outro processo em curso.
Esperemos que, desta vez, a potência dos seus milhões, canais televisivos e jornais de sua propriedade sirvam para provocar um efeito totalmente oposto ao que tentarão obter: saturação, irritação, repúdio. Sobretudo, repúdio absoluto.
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