segunda-feira, outubro 29, 2012

DUAS SENTENÇAS EXPLOSIVAS

Segunda-feira, 22 de Outubro 2012, um tribunal italiano - Tribunal de L’Aquila – aplicou penas severíssimas aos cientistas da “Comissão de Altos Riscos”, órgão de consulta do Departamento da Protecção Civil. A motivação alicerça-se na falta de uma informação atenta e completa, da parte destes responsáveis, sobre os perigos dos 200 tremores de terra registados e que de há quatro meses assolavam a cidade de L’Aquila e zonas limítrofes - região de intensa actividade sísmica.
Ninguém ofereceu instruções calmas, tranquilizadoras, civis, informantes”. (Massimo Gallucci, médico que conseguiu salvar-se, juntamente com a esposa e filha, através de mil perigos).

Esta sentença, como todos os meios de comunicação amplamente informaram, teve grande ressonância a nível global, sobretudo no mundo da ciência que, na sua generalidade, a classifica como inconcebível, inadmissível, absurda, perigosa, estúpida. “Os terramotos não se podem prever”: este é e foi o leitmotiv de todas as críticas, e com razão, segundo dizem os entendidos. 

Seis anos de prisão, interdição perpétua no exercício de cargos públicos, indemnizações elevadas: efectivamente, é uma sentença dura e de difícil compreensão. Porém, antes de bradar ao absurdo, estúpido, etc., etc., seria aconselhável adquirir informações completas sobre os pontos de acusação deste processo, visto que o alarido em defesa da ciência ultrajada não os analisou. Se o tivesse feito, evitar-se-iam conclusões precipitadas e análises excessivamente retóricas e superficiais.
Na cidade de L’Aquila não foi emitido um juízo contra a ciência, mas contra o colapso da comunicação da ciência (Scientific American).

Houve um imperdoável comportamento do presidente do Departamento da Protecção Civil, Guido Bertolaso, em esconder os perigos ínsitos na persistência dos tremores sísmicos. Embora os cientistas da “Comissão de Altos Riscos” advertissem da gravidade da situação, o Sr. Bertolaso – já sob investigação por irregularidades na protecção civil - levou-os a dizer o contrário, por meras conveniências administrativas. Serviu-se da Comissão, ficando ele na sombra.
A pena máxima deveria ser aplicada a este indivíduo; aos cientistas, um pesado voto de censura por tanta ligeireza. Mas, são nomeados pelo Governo e não quiseram contrariar ordens superiores. É lamentável que tivessem sido tão cordatos.

Telefonema, muito esclarecedor, do presidente Guido Bertolaso, a Daniela Stati, assessor regional, em 30/03/2009, após um enésimo tremor, mas desta vez de magnitude mais intensa (4,1 graus). Este telefonema veio a lume nestes últimos dias:
Chamar-te-á De Bernardinis, o meu vice-director, a quem disse para efectuar uma reunião amanhã em L’Aquila, sobre este caso do “enxame sísmico” (série de tremores sísmicos de pequena intensidade) que continua, a fim de calar imediatamente qualquer imbecil, aplacar ilações, preocupações… Eu não irei, mas irá Zamberletti, Barberi, Boschi, as sumidades do terramoto na Itália. Disporei para que se reúnam em L’Aquila, aí na tua secção ou na Prefeitura - decidi vós, pois a mim não interessa nada - de maneira que seja mais uma operação mediática, compreendeste? Assim, eles que são os máximos especialistas de terramotos dirão: é uma situação normal, são fenómenos que se verificam… É melhor que sejam 100 tremores de 4 graus da escala de Richter que o silêncio, porque cem tremores servem para libertar energia e nunca se verificará um forte tremor, aquele que dói… Fala com De Bernardinis, decidi onde efectuar esta reunião amanhã, e que não é porque estamos assustados, mas porque queremos tranquilizar a gente”. (o sublinhado é meu)

No dia 06 de Abril 2009, às três da manhã, na cidade de L’Aquila, um terramoto de magnitude 5,8 graus: 309 vítimas, 67.179 desalojados, 23.000 edifícios lesados. (fonte, La Repubblica)

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Poucas linhas para a segunda sentença explosiva (por inesperada), pois a comédia ainda não atingiu o clímax certo e os actos sucedem-se. Aguardemos. Oxalá permaneça no cómico.

Depois de pôr um Parlamento a inventar e aprovar leis (não menos de 18) ad personam, mas nefastas para uma justiça célere, justa e equilibrada; depois de os seus advogados de defesa – um deles eleito senador – terem recorrido a todos os artifícios e manhas consentidas por lei; depois de recorrer a todas as desculpas ou leis aprovadas ad hoc para não se apresentar diante dos juízes, enfim, depois de tantas porcarias destas, o rato espertalhão - o inefável e ex-Primeiro-ministro Sílvio Berlusconi - foi caçado.

Fraude Fiscal; “normal tendência para delinquir”. Logo: quatro anos de prisão, mas três indultados; cinco anos de interdição de funções públicas (pubblici uffici) e três da gestão de empresas; indemnização de 10 milhões de euros ao Fisco.
Mas a infindável telenovela berlusconiana continua.

O homem clamou contra o encarniçamento judiciário, fingindo ignorar que quem não quer ser lobo não lhe veste a pele e porta-se como pessoa decente. Novamente se porá em campo, a fim de “salvar a Itália da magistratocracia, pois isto só acontece num país bárbaro e onde não há democracia”. Por quem Deus nos manda avisar!
Numa conferência de imprensa, acusou Mário Monti, Merkel e que retirará a confiança ao Governo. Se mais não fosse necessário ou mais não houvesse, bastaria esta irresponsabilidade e indignidade do indivíduo para procurar todos os meios legais de, politicamente, o neutralizar, sobretudo neste período tão difícil. Quanto dano tem causado à Itália!