segunda-feira, julho 09, 2012

GLOBALIZAÇÃO:
QUANTAS PERPLEXIDADES!

Certamente que a Globalização foi benéfica para todos aqueles países pobres, não desenvolvidos e para quem o mundo estava fechado. Originou oportunidades a tantos outros, a fim de melhor explorar as suas capacidades técnicas e produtivas. Todavia, o modo como a globalização explodiu – penso seja este o verbo mais adequado – pode classificar-se como imparável e sem quaisquer estacadas, onde necessárias, que lhe atenuem o ímpeto de potro selvagem?
A crise em que nos debatemos não será também uma consequência da super ou subavaliação deste fenómeno e a forma irruptiva como se expandiu?

A estas minhas perplexidades encontrei algumas respostas no artigo de Giovanni Sartori - Professor emérito, “um dos máximos conhecedores da Ciência Política a nível internacional”. Lê-lo ou ouvi-lo, capta sempre o interesse. Sobretudo, pelo estilo directo e claro como se exprime.
Neste artigo – transcrito integralmente - o que escreve sobre a Itália adapta-se perfeitamente a Portugal.

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"A DEFESA DA EUROPA
GLOBALISTAS SIM, MAS NÃO DEMASIADO"

"Não foi ontem, mas há dezanove anos (em 1993), escrevi que a globalização económica – não a financeira, que é uma coisa diversa – parecia-me um erro e por esta simples razão (em condensadíssima síntese): dentro da igualdade tecnológica, os países com baixo custo do trabalho criariam desemprego nos países ricos, pois que a manufactura transferir-se-ia para os países pobres e, deste modo, repito, os trabalhadores dos países ricos ficariam sem emprego.

Fiz esta observação em várias outras ocasiões, mas falei sempre com surdos. No entanto, o argumento era simples e óbvio. Actualmente, o elevado desemprego no Ocidente e a transferência da mão-de-obra para países onde o custo é dez vezes menor estão à vista de todos.
Mas os economistas não o tinham previsto; hoje, fingem que nada aconteceu. A receita deles para o Ocidente é que se torne sempre mais inventivo e na vanguarda. É um álibi sem consistência. Eles sabem, como todos, que de há longo tempo o Japão, sucessivamente a China e Índia, são tecnicamente tão desenvolvidos como nós. Resta o facto, agora, que a trapalhada está feita.

Nesta trapalhada, os italianos colocam-se entre os que reúnem piores condições. Estamos claramente em recessão. Para ultrapassá-la e reconquistar o cimo, a palavra de ordem é: investir/crescer; investir/crescer. Muito obrigado. Mas onde está o dinheiro? O Estado está sobrecarregado de dívidas e nem sequer tem meios para pagar os seus fornecedores. Se prescindirmos da caça aos que evadem o fisco (sacrossanta, mas que apanha, sobretudo, os peixes pequenos, porque os grandes estão tranquilamente aparcados nos paraísos fiscais), o presidente Monti deve, ele também, recorrer a novos impostos e cada vez mais altos. Mas a este ponto, estamos a espremer sangue de um nabo. Admitamos que o nabo sobreviva. Mesmo assim, o círculo é perverso: reactivamos produções que, a fim de sobreviver, dever-se-ão, pelo menos em parte, deslocalizar. Tornamos ao ponto de partida e cada vez mais jovens sem trabalho.

Regressar à lira, regressar à dracma? Temo que seria uma ulterior loucura. Entretanto, ninguém pensou numa união alfandegária na zona euro. Dentro da Eurolândia, nenhum imposto, nenhuma alfândega. Mas, ocorrendo, taxas e protecções para salvar, na Europa, o que não podemos permitir-nos de perder.

Vale a pena recordar que o primeiro país industrial foi a Inglaterra. Todos os outros protegeram as criações do próprio sistema industrial. Ninguém disse, na altura, que esta protecção fosse uma coisa horrenda. Era necessária e foi benéfica. Pergunto-me: por que é que ninguém (ou quase) propõe uma união alfandegária europeia? Será seguramente uma construção complicada. Todavia, por que razão não possuí-la, quando Estados Unidos e Inglaterra são, hoje em dia, libérrimos de proteger-se e, caso seja necessário, erguer barreiras protectoras ou desvalorizando, sem pedir licença a ninguém, as próprias moedas?
É isto o que sucede em todo o mundo que conta (economicamente). Deve ser proibido somente a nós, europeus? Porquê?

Admiti que a nossa protecção alfandegária será uma construção difícil. Mas comecemos, pelo menos, a pensar nisso."
Giovanni Sartori - Corriere Della Sera, 26 Junho 2012.