segunda-feira, agosto 18, 2008

PAPA SEM ARMINHO”

Este é o nome da petição on line, lançada no dia 21 de Julho-2008, pela “Associação Italiana Defesa Animais e Ambiente”, solicitando respeito e amor pelos animais.

Todos juntos, pedimos ao Papa Bento XVI para renunciar à estola (a) de arminho, a qual nada tem que ver com os paramentos sacros.
No respeito pela vida, em todas as suas formas, e para recordar que também os animais são criaturas de Deus ou, para quem não crê, criaturas sencientes que têm o direito de viver como todas as outras; que sofrem, sentem a dor e o medo, quando se lhes provoca a morte com o fim de satisfazer as vaidades humanas em todas os seus aspectos”.

(a) Não estola, mas o gorro com bordo de arminho).

Como é óbvio, esta iniciativa serve de pretexto, digamos barulhento, a fim de melhor, e eficazmente, chamar a atenção.
Correu mundo e de todos os Continentes já chegaram mais de 4.500 adesões - até final de Setembro, querem recolher dez mil assinaturas.

Em colóquio com um jornalista do "Corriere della Sera" (Luigi Accattoli) e a propósito desta campanha, o arcipreste da Basílica de S. Paulo e “cultor da heráldica eclesiástica”, cardeal Andrea Cordero Lanza de Montezemolo, comentou: “Não há batalhas mais importantes para fazer? Está bem defender os arminhos, mas há criaturas humanas que mereceriam uma defesa prioritária e ninguém se ocupa”.
Se ninguém se ocupa, que faz a Igreja?

Quando lhe observaram que é uma batalha simbólica, tendo em vista uma aproximação do mundo animal e que se trata de animais que são mortos com extrema crueldade e com o exclusivo fim de produzir ornamentações ou peles que se podem dispensar, a “sensibilíssima Eminência" respondeu deste modo:
Nisso vejo o sonho de uma relação com os animais que ainda não está ao nosso alcance. Estes senhores sentir-se-iam capazes de renunciar a comer carne ou peixe? Se comemos os animais, então também podemos usá-los no vestuário, não lhe parece?”

Que míseros considerandos! Talvez mais próprios de um açougueiro que de um cardeal de quem se espera uma superior fineza de raciocínio.

Certamente que há seres humanos desventurados e cuja defesa é prioritária. Todavia, e dou um exemplo, não tenho visto, nas altas esferas eclesiásticas, aquela fortíssima e natural indignação - que seria de esperar - condenando as atitudes vexatórias, por vezes desumanas, do actual governo italiano contra imigrantes e ciganos. Refiro-me aos homens do Vaticano, não àquela parte do clero, louvável, que vive no meio das gentes, conhece perfeitamente os seus problemas existenciais e age em conformidade com a missão que escolheu.

Manifestaram, sim, uma espécie de censura, mas muito formal, a fim de não perturbar a excelente convivência com um governo de quem esperam amplas concessões e com quem estão em perfeita sintonia.
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E tal sintonia manifestou-se nesta última semana.

O semanário “Família Cristã” tem publicado uma série de artigos, onde as críticas ao governo de Berlusconi são bem explícitas. Aliás, já antes o fizera com o governo de centro-esquerda, e justamente, pois são estas equidistâncias que enobrecem um bom jornalismo.

Sem ambages e com uma ironia pungente, os editoriais mais recentes fustigam várias acções de governo, muito discutíveis ou mesmo ridículas, e nenhuma atenuante lhes é concedida. Avançam mesmo a incerteza se não estará para renascer o fascismo sob novas formas.
No remate do último editorial, o director de Família Cristã escreve:
É excessivo pedir ao Governo que afugente a suspeita que, quando governa a direita, a tesoura se alarga e, deste modo, os ricos engordam e as famílias empobrecem?

Caiu o Carmo e a Trindade! As reacções dos alvejados explodiram, não somente com arrogância, intolerância e insultos, mas também com uma total falta de respeito pelo direito de opinião.
De novo, repito: em tantos anos, nunca conheci uma classe política italiana de tão baixo nível como a que constitui esta maioria. E neste conceito, em nada entram as minhas simpatias políticas. Tenho instrução e bom senso suficientes para saber julgar com equidade.

Pois bem, o Vaticano desceu a terreiro e padre Federico Lombardi, director da sala de imprensa do Vaticano, comunicou, urbi et orbi, que "Família Cristã" é uma publicação católica importante, “mas nenhum título possui para exprimir, quer a linha do Vaticano, quer a da Conferência Episcopal Italiana. As suas posições são responsabilidade exclusiva da sua direcção”.

O paralelismo surgiu-me de imediato: quando a mesma revista criticou duramente Prodi, assim como o seu governo de centro-esquerda, não houve igual tomada de posição da parte dos órgãos do Vaticano. Mudos!

Sendo assim, torna-se lícito perguntar: por que razão o Vaticano não manteve, agora, o mesmo silêncio? Naquelas salas e corredores vaticanos, não podem coabitar o bom senso, o sentido de oportunidade e igual respeito por qualquer facção política que suba ao governo do País? Ou será que as políticas conservadoras, próximas de um não muito velado autoritarismo, são as preferidas?

Não teria sido mais elegante, mais digno, se tivessem ficado calados?
Alda M. Maia