segunda-feira, agosto 04, 2014

A VERTICALIZAÇÃO DO PODER POLÍTICO

Como verticalização, ou efeito de verticalizar o poder, não entendo referir-me àquela verticalidade que, em sentido próprio e figurado, seria reveladora das qualidades que todos esperamos e exigimos dos vértices do poder político, ou seja: rectidão, integridade, honestidade e, acrescentemos, transparência. Mas talvez esta última qualidade deveria ser colocada em primeiro lugar, porque precisamente neste caso, a rectidão e honestidade constituem a sua essência natural.

Refiro-me, pelo contrário, a uma verticalização autoritária e bem manifesta nas decisões e reformas postas em acto sem a atenção e o devido respeito que devem merecer quaisquer outras opiniões e esquemas, provindos da oposição ou de quem, sincera e competentemente, deseja o bem do país.

Refiro-me, muito simplesmente, ao que vamos observando na gerência e modo de comportar-se do actual Governo português.
 
Não sei aonde querem conduzir este mal-aventurado Portugal cada vez mais pobre; cada vez mais desmantelado nas suas actividades educativas e científicas, o que é absolutamente intolerável; cada vez mais desprestigiado e ferido nos valores que o simbolizam e dignificam; cada vez mais defraudado nos seus bens, sobretudo bens que dão lucros ao Estado, mas privatizados em série e sem que nos seja explicada a verdadeira razão de tais alienações e, acima de tudo, onde a transparência não brilha.

Cite-se a última sobre o Arsenal do Alfeite, “ única empresa capaz de realizar em Portugal as reparações e construções necessárias aos navios da Marinha portuguesa”. Todavia, aventa-se a hipótese de privatização desta empresa, exactamente como fizeram com os Estaleiros Navais de Viana do Castelo.
Como é possível que o Ministro da Defesa apenas se manifeste, no seu pior, precisamente em casos que suscitam revolta e mal-estar em vários sectores? Não seria uma boa altura para demonstrar o contrário?

Tudo isto, e tantos outros aspectos da questão, mortificam quem ama a sua terra e só anseia que ela se erga com o sacrifício de todos – repito, de todos – e, mercê da competência de dirigentes sérios possa, finalmente, elevar-se dos últimos graus das classificações internacionais.

Contudo, a minha indignação é maior perante a apatia, a insensibilidade, o desencanto que sufoca reacções, o acomodamento do povo português  
Escrevem-se e publicam-se artigos eloquentes, mas nada se faz de concreto para além de belos textos críticos ou condenatórios, ficando-se na contemplação do que se escreveu.

Sinto-me desiludida com as nossas elites académicas. O seu papel na sociedade é de primária importância, quer no campo humanístico, científico e tecnológico, quer no campo administrativo e político. Por que razão não as vejo mais interventivas com acções que nenhum português pudesse ignorar, opondo-se aos descalabros de tanta ignorância e incompetência da classe política que nos administra?

Não pretendo actos revolucionários que uma democracia não pode nem deve aceitar. Tão-somente, desejaria que levantassem a voz e que, representando uma grande maioria da intelectualidade portuguesa, forjassem manifestos ou qualquer outro meio forte e eficaz, explícitos e objectivos na denúncia de factos e determinações lesivas do interesse geral do país: denúncia que obrigasse os partidos que nos governam a dar explicações credíveis, a fim de que qualquer pessoa menos informado as pudesse entender e assimilar.
  
Mas, ai de nós, apenas se escreve excelentes editoriais, lidos por um limitado número de pessoas e, relativamente aos seus alvos, ou são ignorados ou ineficazes para trespassar a carapaça da aliança ignorância/incompetência reforçada pela sofreguidão do poder!

Li inúmeros textos – críticos na sua quase totalidade - sobre a recente cimeira da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa em Timor (CPLP).
Se a maioria estava em desacordo com a adesão da Guiné Equatorial, por que nada fez de concreto, nomeadamente em relação à presença em Timor do Presidente da República, dizendo-lhe basta a actos que só humilham o país do qual é o mais alto magistrado?

Embora respeitando as decisões da maioria da Comunidade, que imperiosa necessidade exigia a presença do Primeiro-ministro e do Presidente da República, em lugar de um representante, idóneo, de Portugal, exactamente como fez o Brasil e Angola?
Se estes dois Senhores são escassos de compreensão sobre o que significa a dignidade de um país, por que motivo não lha gritaram alto e bom som?
Digo claramente que senti vergonha.

Muitos alvitram que se deve abandonar a CPLP. Não concordo. Não somos o dono da língua portuguesa que se fala nos outros países, mas somos a matriz. Que não o esqueçam, logo, o nosso lugar dentro da CPLP é importante, além de esta Comunidade constituir um esplêndido elo de convivência de amizade e cooperação entre os países que a compõem.