segunda-feira, junho 23, 2014

“O ITALIANO É A QUARTA LÍNGUA
MAIS ESTUDADA NO MUNDO”

No Corriere Della Sera de segunda-feira passada, dia 16, esta notícia surpreendeu muitos italianos.

ICON (Italian Culture on the Net), um consórcio de 19 universidades italianas com sede em Pisa. Nasceu em 1999, com o patrocínio de altas autoridades institucionais – Ministério dos Negócios Estrangeiros, Presidência da Câmara de Deputados, etc., etc.

O consórcio ICON associa 19 universidades italianas para promover e difundir, via telemática, a língua, a cultura e a imagem da Itália no mundo. Através do site www.italicon.it, estudantes estrangeiros e italianos residentes fora do país podem escolher dentro de uma oferta didáctica que compreende uma licenciatura trienal em Língua e cultura italiana, quatro master e uma ampla série de cursos de língua italiana”

Obteve adesões e consensos que ultrapassaram todas as expectativas e eis, portanto, a comprovação de que a língua italiana está em quarto lugar como língua mais estudada, depois do inglês, francês e espanhol.

Interessante a justificação do motivo deste sucesso dada pelo director de ICON, o professor Mirko Tavosanis:
“Creio a popularidade e a difusão da nossa língua, por vezes, maior do que idiomas de importantes potências económicas.
Certamente que o primeiro motivo é a cultura italiana. Todavia, não somente Dante, mas também os escritores contemporâneos, pois de igual modo é apreciada a narrativa, a poesia, a ensaística. Em seguida, influi muito a musicalidade do falar italiano e, obviamente, a lírica, na qual triunfa”.

Li este artigo de Marco Gasperetti com muito interesse e satisfação. E como não podia deixar de ser, uma profusão de associação de ideias, de comparações, de análises e contraposições invadiu o meu pensamento. Um sorriso divertido, todavia, suavizou essa invasão.

Não consegui averiguar, nesta classificação, qual a posição da língua portuguesa como idioma mais estudado, apesar do estrondo que o tem envolvido. Certamente que se afasta muito do terceiro lugar da língua de Cervantes.

Em Portugal, iniciativas culturais semelhantes ao consórcio das 19 universidades italianas não se conhecem. Nada de surpreendente, quando existe uma grande maioria de professores universitários que tão facilmente adoptaram e quiseram impor o novo acordo ortográfico. Quem assim procede, conhece em profundidade a própria língua? Qual a capacidade de respeito pela cultura portuguesa?   

Nestes últimos tempos, porém, a importância da nossa língua é mercadoria de grande projecção, de grandes contratos, de grande exibicionismo.
Atribuo a pressão inicial a uma certa elite brasileira. Pressão que não censuro, bem pelo contrário, pois defende e luta pela valorização da sua variedade da língua portuguesa. O que me desagrada é ver tanta actividade concentrada mais em motivos económicos que culturais e haver portugueses, subservientes, a engrossar a fileira.

Se são elites, culturalmente falando, não desconhecem que a cultura, uma boa preparação humanística abrem os cérebros para horizontes mais amplos e equilibrados. E sendo assim, o dinheiro, por exemplo, deixaria de ser o deus asfixiante do século XXI e tornar-se-ia no motor de uma economia socialmente eficiente e de grande progresso para um país: em todos os sentidos e em todos os campos da vida em comum.

Defendamos a língua, sim, mas sempre por razões nobres e identitárias; jamais por mercantilismos odiosos. E em uníssono com esse património, demos a conhecer a cultura, tradições, belezas de Portugal.
O “Italian Culture on the Net” seria um esplêndido exemplo para um idêntico consórcio de universidades portuguesas.

No dia 27 de Junho 2014 celebrar-se-ão os 800 anos de língua portuguesa. Rufarão os tambores, empolgar-se-á o número de falantes em todos os Continentes, e com justiça. Gostaria de os ver rufar pela suspensão do ultrajante acordo ortográfico, logo, pelo fim do abastardamento da língua mãe que deu origem às demais variantes.

E na esteira desse abastardamento, também que rufasse pelo fim do vocês que assassinou o pronome vós, regressando à sua posição de termo popular e, frequentemente, arrieiral. Não destruam as nossas formas verbais.
Paralelamente, acabar com a “variedade de Lisboa” como língua padrão.
Padrão de quê? Do vocês a torto e a direito e dos ditongos ultrajados?
Para mim nunca constituiu modelo e, como natural da “província”… quanta superioridade e pedantice nesta qualificação do Portugal que não é lisboeta! Pois como natural do Norte, ofende-me essa pretensão.

Termino com a opinião de Miguel Torga:
(…) “Como acontece com a área de qualquer embaixada, também Lisboa goza de não sei que sagrada extra-territorialidade dentro da pátria. Imunidades de toda a ordem permitem-lhe ser ao mesmo tempo a nação e a contra-nação. A nação, na triste medida em que só ela conta, só ela come, só ela sabe, só ela se diverte, só ela manda; a contra-nação, por todas essas razões. Empanturrada de poder e prazer, em vez de unificar a diversidade do país, cresta-os dos seus valores e degrada-os.” (…) – Lisboa, 17 de Julho de 1958 - Miguel Torga em: “Diário VIII”
Os sublinhados são meus. 

2 Comments:

At 12:59 da manhã, Blogger nointeressa said...

Gostei muito do seu texto. Pensamentos Vagabundos serão também os meus pensamentos, pois não deixarei de a visitar sempre que for oportuno. Parabéns.
Maria Coelho

 
At 10:46 da manhã, Blogger a d´almeida nunes said...

Alda, muito bom dia

Pois é assim, atravesso uma fase da minha vida, na reta final (mais curta que comprida?), algo surpreendente, para mim próprio.
Esta questão do Novo Acordo Ortográfico é o paradigma de como uma ação tão importante na vida de um comunidade planetária está a ser tratada. É-me muito difícil argumentar com a justificação da origem etimológica das palavras para justificar que as que foram alteradas pelo tal acordo não o devessem ter sido.

Lamento profundamente que não se tenha chegado a um consenso mais amplo. O problema que se está a levantar, muito sério, é que nas Escolas já se ensina o português segundo as Nonas regras ortográficas.

Por mim, que não sou filólogo de formação académica, já me habituei à ideia de escrever segundo o NAO.
A discussão pública das alterações subsequentes ao acordo terá sido feito com o rigor necessário? Parece-me bem que não.
De quem foi a culpa?
Para mim foi dos académicos na área da Linguística que não se esforçaram o suficiente para esclarecer a população e não deixar que um assunto tão candente como este tivesse sido resolvido pela Assembleia da República, simplesmente...

Um abraço

 

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