segunda-feira, outubro 31, 2011

ESTA NOSSA LÍNGUA

Esta nossa língua materna a que chamam o português europeu e que alguns compatriotas entenderam reduzi-la a língua de secundária importância, apenas por uma conveniência política, subalternizando-a a um outro português falado num país, o Brasil, de 192 milhões de habitantes e que, segundo o Prof. Vital Moreira, são eles os patrões da língua.
Só me pergunto de qual versão: a que se fala neste recanto da Europa ou a que se fala no seu território?

Apenas concebo um princípio, isto, é, cada um é patrão do próprio idioma nacional. Não existem outras interpretações, pois seriam absurdas e inconsistentes, além de estúpidas.

Mas relativamente ao nosso português, há dias folheei a edição recente de uma das várias gramáticas de língua portuguesa que possuo:
Gramática Prática de Português”. Autores: M. Olga Azeredo; M. Isabel Freitas M. Pinto; M. Carmo Azeredo Lopes. Consultor: João M. Marques da Costa. Editor, “Lisboa Editora”; edição de 2006.
É uma gramática muito completa e bem integrada nos novos termos linguísticos do ensino básico e secundário. Todavia…

Acerca dos pronomes pessoais, na página 213, lê-se o seguinte: […] “;no plural praticamente não se usa a segunda pessoa do plural vós, que é substituída por vocês, que corresponde a uma terceira pessoa (do plural) gramatical”.
O mesmo conceito fora expresso na página 192: “Nota que o pronome pessoal vós praticamente não se usa na língua padrão e é substituído por outras formas, em geral vocês”.
A língua padrão em Portugal, difundida pela escola e pelos meios de comunicação, é actualmente a variedade falada em Lisboa”. – pag.17

Exclamação minha, muito espontânea: mas que raio de língua é esta? Que género de português ensinam aos nossos estudantes? Em quais escolas se difunde esta barbaridade?
In illo tempore, aprendi que a língua padrão era a variedade da região de Coimbra, e muitíssimo bem. A que propósito baniram Coimbra e se viraram para Lisboa? Onde estão as excelências linguísticas da variedade lisboeta?
Em caxa ou baxa, em vez de caixa e baixa? Chòriço em vez de chouriço? Lôres por Loures? Periúdo em vez de período? Comere, falare, fazere, etc., etc. e, agora, esta pérola “vocês” como substituição do imprescindível vós?

Já não me surpreendem os grandes defensores do improvisado Acordo Ortográfico. Se é isto o que entendem como “bom português”, certamente que não lhes foi difícil sacrificar o que caracteriza o português europeu.

Não sou drástica na condenação de todos ou quaisquer acordos ortográficos. Podem ser aconselháveis e não seria difícil encontrar certos vocábulos onde pudesse haver uma certa uniformidade ortográfica do português europeu e português brasileiro sem afectar a integridade da língua que falamos. O que não aceito, nem jamais aceitarei, foi este Acordo, onde apenas contemplaram, servilmente, a versão brasileira, imolando a ortofonia do português europeu; abolindo certezas ortográficas para dar lugar a arbitrariedades e abertura de espaços ao avanço da ignorância. E isto é incontestável. 

Não culpemos o Brasil por este estado de coisas, pois estaríamos errados e seríamos injustos.
Foi um Acordo político, o que é um absurdo, feito à revelia da maioria dos portugueses. Bases linguísticas sérias não têm nenhumas. Se assim não fosse, seriam consultados e ouvidos os verdadeiros especialistas desta matéria. Mas foram deliberadamente ignorados.

Analiso as razões de dois entusiastas desta nova “tortografia” (Miguel Esteves Cardoso). O desconcerto é inevitável.

Primeiro - o Professor Carlos Reis: […] Trata-se não só de reconhecer que escrever “ótimo” em nada altera o sentido do vocábulo, a sua dignidade etimológica ou a sua pronúncia – até porque é assim mesmo que pronunciamos (a bela língua italiana há muito que escreve “ottimo”) - Público, 22 / 03 / 2008 - o negrito é meu.

Efectivamente, é assim que pronunciamos, mas a pronúncia das consoantes duplas, na língua italiana, é longa, bem distinta da consoante única.
Do étimo optimus, o português manteve o grafema p; na evolução da língua italiana, houve uma assimilação, como em tantos outros vocábulos, determinando o alongamento da pronúncia de consoantes duplas. Logo, não cortou o p; assimilou-o.
O exemplo não foi feliz, Senhor Prof. Carlos Reis.

Raciocinando sobre este específico fenómeno e comparando-o com a evolução da nossa língua, concluí que, onde mantivemos o c e o p ou os vocalizámos, o italiano assimilou-os. E foi assim que consegui ultrapassar, em parte, a minha dificuldade em escrever um italiano correcto. Com o novo acordo, ser-me-ia muito, mas muito mais difícil.

Segundo - o escritor José Eduardo Agualusa: “Acorda, Acordo, ou dorme para sempre” - […] cheguei à conclusão que as opiniões contrárias ao Acordo ortográfico resultam:
[…] 2 – no caso de Portugal, de um enraizado sentimento imperial em relação à língua. No referido debate, na Casa Fernando Pessoa, este sentimento foi explícito quando um espectador se levantou aos gritos: “A língua é nossa”! A História desmente-o. A língua portuguesa formou-se fora do espaço geográfico onde se situa Portugal – na Galiza … (também aqui, o negrito é meu).

Abstenho-me de transcrever as restantes calinadas deste conceituado escritor que estudou Silvicultura e Agronomia em Lisboa.
Mas demos ainda atenção ao final do artigo, publicado no semanário angolano “A Capital”, em 9 /02 /2008:
No futuro, Portugal pode sempre unir-se à Galiza. Isto supondo que a Galiza não tenha entretanto começado a aplicar o Acordo Ortográfico, ou, no caso de o acordo não vencer, começado a utilizar a ortografia brasileira.

Comentários? Inúteis. Apenas algumas perguntas: ninguém ensinou a este ignorante o que foi o galaico-português, em que território e era despontou e floresceu?
Este senhor não sabe que a língua oficial da Galiza é o espanhol, embora o galego também seja falado e tenha foros de língua literária?
Ninguém lhe ensinou que o português é uma língua novilatina tão digna como as co-irmãs francesa, espanhola e italiana, por exemplo, e não a manta de farrapos que descreveu?
Se retirarmos as palavras de origem árabe e o banto à língua portuguesa, deixaremos de a poder utilizar”: assim nos esclarece o grande filólogo Agualusa!...

Se quis interpretar o papel de insolente, ignorante e patarata, foi perfeito.