A PROPÓSITO DOS
ENDINHEIRADOS
E destes
endinheirados da actualidade, ocupou-se o prestigiado economista Paul Krugman:
prémio Nobel da Economia em 2008; professor de Economia e Relações
Internacionais na Universidade de Princeton, editorialista do quotidiano New
York Times; também prestigiado editorialista na imprensa europeia.
Recordo que aconselhou
Portugal a dizer não às regras imperiosas de uma austeridade sem alma: “Just say NÃO”. Mas não pudemos nem podemos dizê-lo com os governantes tacanhos que infestam os países da zona euro,
pois quase todos demonstram uma mediocridade confrangedora.
Nenhum dos que
administram os países do Sul da Europa tem a dignidade de propor alianças,
pretendendo da União novas regras que enfrentem com mais lucidez e equilíbrio a
situação de crise económica infinita.
Paralelamente,
explicar à Alemanha que a sua hegemonia não foi pensada nem institucionalizada pelos
fundadores e prossecutores da União Europeia.
Que cumpra os seus
deveres como os demais países da União e ponha cobro aos excedentes da sua
balança orçamental, por exemplo, evitando prejudicar outrem.
Em fim de contas,
todos têm “trabalhos de casa” para efectuar, Senhora Merkel!
Mas vamos ao que
escreve Paul Krugman, no quotidiano económico italiano “Il Sole 24 Ore”, em
03/10/2014.
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“Endinheirado raramente é
sinónimo de modesto (e os ricos são sempre cada vez mais ricos”
De várias partes,
David Brooks foi chacoteado por ter dito, num editorial recentemente publicado
no New York Times, que os ricos deveriam “observar um código de decoro”,
evitando adoptar um estilo de vida faustoso, embora o possam manter.
Não quero unir-me a
essas zombarias: pelo contrário, quero dizer qualquer coisa sobre os aspectos
económicos da exibição da riqueza.
Em primeiro lugar, esperar
que os ricos não ostentem o seu património é irreal. Se tendes a impressão que
os ricos foram mais comedidos nos anos 50 e 60, é simplesmente porque não eram,
nem de longe, assim tão ricos, quer em sentido absoluto, quer em sentido
relativo. O último período em que a nossa sociedade foi tão desigual como é hoje,
grandes vivendas e iates tão sumptuosos e pretensiosos como agora: estou a
falar do fim do século XIX, época que, não por acaso, Mark Twain definiu “Era Dourada”.
Além disto, deve-se
dizer que, para muitos ricos, a ostentação é tudo. Viver numa casa de 3.000m2
quadrados não é pois muito mais agradável que viver numa casa de 50m2.
Certamente há pessoas
capazes de apreciar uma garrafa de vinho de 350 dólares, mas a maior parte da
gente que compra coisas desse género, se lha substituísseis por uma garrafa de
20 dólares ou até mesmo por vinho misturado em casa, nem sequer se
aperceberiam. Também para as toilettes
superelegantes, boa parte da utilidade de quem as usa é dada pelo facto de que
não estão ao alcance das outras pessoas.
Em suma, é,
sobretudo, uma questão de exibicionismo, como poderia dizer-vos, há já um
século, o economista Thorstein Veblen.
Mas então, por que ralar-se
com a ostentação da riqueza em vez de taxar um pouco daquele rendimento?
Poderíeis responder que os impostos reduzem o incentivo para se enriquecer. Aliás,
o mesmo sucederia, introduzindo leis sumptuárias que privariam o rico do
objectivo de se tornar rico, assim como com um “código de decoro”, que
limitaria o divertimento de evidenciar a própria riqueza (a razão mais
importante pela qual a gente quer enriquecer).
Mas há mais. Se
pensais que seja um mal para a sociedade que haja pessoas que alardeiam a
própria riqueza relativa, na prática aceitastes a visão de quem sustenta que a
riqueza impõe exterioridades negativas para o resto da população (que é um dos
argumentos para introduzir uma tributação progressiva que ultrapasse a maximização
dos intróitos).”
Ah! e uma coisa
ainda: pensai no que nos diz tudo isto sobre o crescimento económico. Temos uma
economia que, desde 1980 até aos nossos dias, se tornou sensivelmente mais rica,
porém, com uma quota significativa dos ganhos que vai para pessoas com
rendimentos muito altos, pessoas para as quais a utilidade marginal de um dólar
de despesa a mais ou a menos não é somente baixa, como também está ligada, em boa
parte, a uma competição para o status,
que é um jogo a soma zero.
Por outras palavras,
grande parte do nosso crescimento económico foi, simplesmente, desperdiçada. Serviu
para tornar ainda mais frenética a corrida do topo dos rendimentos altos.
Agora devo
deixar-vos: encaminhar-me-ei para o meu escritório com decoro, a pé e usando os
meios de transporte públicos, onde rejubilarei pela minha superioridade moral e
olharei com escárnio as pessoas que não receberam todas as condecorações que eu
recebi. Oh! Deus! Esperai um momento!... - Paul Krugman; "Il Sole 24 Ore" – 03 /
10 / 2014
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