domingo, junho 08, 2008

UM PARAÍSO QUE AFUNDA
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Kiribati ainda com indicativo de colónia inglesa


Kiribati - 1984 -já independente (cartões que confirmam o contacto efectuado)
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Pensa-se vir para aqui com o fim de conversar sobre um determinado assunto; entretanto, lê-se algo que nos desperta recordações; o interesse da conversa, ou o interesse da escrita, fogem noutra direcção.

República de Kiribati, 33 ilhas no Oceano Pacífico. Ex-colónia inglesa e país independente desde 1979.
Devido ao aquecimento terrestre, o mar avança e receia-se que as ilhas sejam submersas.

Contactar essas ilhas, perdidas no grande Oceano, foi sempre um dos maiores desejos de qualquer radioamador.
Assim, fruto de tantas horas de paciência e à espera que chegasse a feliz ocasião, por vezes – e digo por vezes, porque nem sempre a sorte batia à porta das antenas – conseguíamos ser lá escutados.
Quando do outro lado do planeta, ouvíamos o nosso indicativo de chamada a ser captado, a emoção era irreprimível, por muita frieza que se desejasse ostentar.
Chamava-se, e chama-se, DX a estes contactos a longa distância.

Seja-me permitida um pouquinho de presunção: contactei, praticamente, quase todos os países e recantos da terra - tenho aqui as paredes atapetadas de diplomas, os meus troféus, e quanta persistência e horas perdidas para os obter! Aquele “quase” refere-se a algumas pequenas ilhas, precisamente do Pacífico, com quem não comuniquei, mas são poucas.
Estou a lembrar-me de Kingman Reef, por exemplo: um recife, um atol desabitado – área, um quilómetro quadrado – aonde colegas americanos fizeram uma expedição.
Embora a minha voz tivesse lá chegado, o contacto (QSO) gorou-se, porque um colega dos arrabaldes de Turim, com os seus quilowatts ilegais, e muito mais ilegais no péssimo comportamento, atropelou a minha emissão e passou ele à frente, espezinhando todas as boas normas, próprias de um radioamador oficialmente reconhecido.
A minha indignação explodiu e não a refreei: sei un villano e un gran maleducato.
Fechei a estação. Por aquele dia, virei as costas à rádio. E assim perdi Kingman Reef.
Nunca me arrependi de lhe ter chamado vilão e malcriado: e a opinião continua igual.
A classificação de radioamador sempre apelou para as boas maneiras, nas várias frequências onde somos autorizados a transmitir. Acima de tudo, o respeito pelas regras e pelos colegas: «o radioamador é um gentleman».
No meio dos gentlemen, porém, há sempre os espertinhos grosseiros. Felizmente, não são a regra.

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Ponhamos termo às divagações e falemos de um artigo que li sobre o grito de alarme do presidente da República do Kiribati, Anote Tong.
Visto que se celebrava o Dia do Ambiente, lançou um apelo internacional a fim de que a população seja evacuada, antes que suceda o inevitável.

“A elevação do nível dos mares, devido às mutações climáticas, já provocou danos irreparáveis: os lençóis aquíferos estão contaminados, os campos estão cobertos de sal e a população é constrangida a retirar-se para o interior. Mas não há esperança que as 33 ilhas coralinas, que se estendem por 3,5 milhões de quilómetros quadrados e se encontram no arquipélago Gilbert, possam continuar a oferecer refúgio a quem quer que seja.” – La Stampa, 07/06/2008.

O presidente da República do Kiribati, assim como tantos outros presidentes das línguas de terra, países independentes espalhados pelo Oceano Pacífico, começam, entretanto, a aperceber-se da indiferença ou egoísmo de quem os poderia ajudar.

A Nova Zelândia e Austrália temem que, acolhendo os i-Kiribati, devam absorver outras populações das demais ilhas em iguais circunstâncias – “um aluvião de refugiados da área do Pacífico”.

Em fim de contas, a pagar os erros dos países desenvolvidos e bem anafados, isto é, os que mais contribuíram para as alterações climáticas, são os povos inocentes que nada fizeram para merecer as condições dramáticas em que vivem.

Convocam-se vértices, proferem-se belíssimos discursos, manifestam-se intenções de ajuda humanitária, proclamam-se princípios sacrossantos: tudo isto será levado a efeito, sim, senhor, mas que os meus campinhos sejam sempre verdejantes e as desgraças dos outros não interfiram com o meu bem-estar económico - esta é a moral da história.

Mas poderia haver uma outra: líderes políticos tacanhos, medíocres, hipócritas, pretensiosos, ávidos de poder e pobres de horizontes abertos; por vezes desumanos. Há excepções, obviamente, mas são poucas.
Alda M. Maia